A vitamina D, uma pro-hormona com importante papel na saúde óssea mas também, pelo menos em idade adulta, na saúde cardiovascular, mental e imunológica entre outras, é quase na sua totalidade (90%) produzida na pele, por ação do sol.
A mudança do estilo de vida das sociedades modernas, traduzida por menor atividade física ao ar livre, está associada a maior risco de carência nesta vitamina, transversalmente à vida.
Sempre que se pensa na criança/adolescente, numa perspetiva de saúde, somos obrigados a pensar nos seus progenitores. Sabe-se actualmente que uma gestação que decorra em situação de défice materno em vitD está associada a maior risco de compromisso do crescimento do feto, bem como a maior risco de complicações obstétricas.
Por outro lado, a amamentação cursa com elevadíssimas exigências metabólicas, na dependência da necessidade em manter a saúde e a homeostasia materna e, em simultâneo, produzir um alimento o mais completo possível, aumentando as exigências nutricionais. Daqui se depreende que a adequação do status de vitamina D da mulher, antes, durante e após a gravidez, é o primeiro fator modificável com impacto no adequado crescimento e na saúde da criança, futuro adulto.
Após o nascimento e durante os primeiros três anos de vida, existe uma contra-indicação formal à exposição solar, principal fonte de vitamina D na espécie humana. Por outro lado, os primeiros anos (especialmente o primeiro) são a fase da vida em que mais se cresce, resultando em exigências elevadas em vitamina D para formação de massa óssea. Estas duas características desta fase particular da vida resultam numa dificuldade em atingir as recomendações da ingestão diária em vitamina D, mesmo que alguns alimentos infantis sejam fortificados (fórmulas lácteas, farinhas, etc).
Recomendações internacionais
Fácil se torna pois entender que os comités internacionais (European Society of Paediatric Gastroenteroly Hepathology and Nutrition, American Academy of Paediatrics e Endocrine Society) e os organismos governamentais (Direcção Geral da Saúde) recomendem a suplementação universal (de todos os lactentes) durante o primeiro ano de vida ou, caso completem o ano durante o outono/inverno, a manutenção da suplementação até à primavera ou mesmo durante os primeiros três anos de vida (Canadá).
Posto isto, todos os lactentes, independentemente da fonte láctea e de terem ou não diversificado a sua alimentação, deverão efectuar suplementação com Vitamina D, numa dose diária de 400 UI /dia. A sua não realização poderá comprometer não apenas a saúde óssea e o crescimento, mas também a saúde em geral, na trajectória da vida.
Quando da introdução na dieta familiar (após os 12 meses), deverá ser recomendada uma alimentação diversificada, equilibrada, onde conste a oferta regular de peixe gordo (salmão, sardinha, arenque, cavala ...), fígado de peixe, gema de ovo, cogumelos e lácteos, acompanhados de um estilo de vida activo e ao ar livre, com uma exposição solar regular mas regrada, respeitando as precauções recomendadas para a prevenção do envelhecimento e do cancro cutâneo.
Durante o outono e o inverno em crianças obesas, pele escura, com certas doenças (renais, do intestino, etc) ou em situações em que as doses recomendadas dificilmente são atingidas apenas com base em medidas comportamentais, poderá justificar-se, e sempre após confirmação laboratorial e por indicação médica, a suplementação farmacológica com vitamina D.
Importa termos em conta que, muito embora esta recomendação universal, em Portugal, e de acordo com os resultados do Estudo do Padrão Alimentar e de Crescimento Infantil (EPACI Portugal 2012), cerca de 31% dos lactentes portugueses não efectuam suplementação regular com esta vitamina.
A necessidade de haver uma rotina de administração diária nesta fase da vida e a falta de informação acerca da sua importância poderão estar na origem desta elevada percentagem de incumprimento.
Cabe aos pais conhecerem as consequências para a saúde dos seus filhos e cabe aos profissionais de saúde, em cada consulta de saúde infantil, confirmarem o cumprimento da terapêutica e reforçarem a importância do mesmo.
Como conclusão poderá dizer-se que a oferta diária de vitamina D durante o primeiro ano de vida deverá constituir uma rotina infalível dos cuidadores. As crianças/adolescentes deverão ter actividade física regular ao ar livre e uma alimentação variada e equilibrada. Em crianças saudáveis, a decisão de suplementar em vitD nos meses de outono/inverno dependerá da incapacidade de atingir as doses recomendadas e será da responsabilidade do médico assistente/pediatra.
Um artigo da médica Carla Rêgo, Pediatra do Hospital CUF Porto e Professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e da Universidade Católica Portuguesa.
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