Na evolução do Homem, como povo nómada e caçador-coletor, a capacidade de locomoção foi decisiva para a nossa sobrevivência. Desta forma poderíamos deslocar-nos para outras regiões em buscas de alimento e/ou escapar às diferenças climatéricas adversas. Apesar do padrão de corrida permitir caçar ou fugir a perigos repentinos eminentes de forma eficaz as grandes viagens eram feitas maioritariamente a andar, dada a sua eficiência energética. Na atualidade os desafios da vida na nossa sociedade são bastante distintos mas compreender esta perspetiva evolutiva revela o nosso verdadeiro ADN, que está intrinsecamente ligado à nossa estrutura e fisiologia.

Viver mais tempo implica manter necessariamente uma boa vitalidade. Assim, talvez a melhor palavra que expresse a vida seja movimento. Como ser vivo pluricelular, todos os milhões de células do nosso organismo dependem umas das outras para manter uma boa saúde geral. Neste conceito holístico o sistema nervoso (central e periférico), o sistema circulatório (vascular e linfático) e até os tecidos faciais e musculares servem de meio de comunicação entre todas as células/estruturas do corpo.

Num exemplo simples, podemos fazer uma relação entre duas estruturas de grande importância e consideradas centros de vitalidade: o coração e os pulmões. As artérias coronárias que irrigam o coração precisam do oxigénio, vindo dos pulmões, assim como estes necessitam do sangue proveniente do coração. Por outro lado, ambos precisam de uma boa integração da atividade do sistema nervoso (controlo do ritmo respiratório e cardíaco) que, por sua vez, precisa do sangue oxigenado pelos pulmões e bombeado pelo coração. Certamente que para o normal funcionamento destas estruturas a qualidade do sangue também é decisiva. Desta forma teríamos de incluir nesta análise toda a fisiologia do sistema gastrointestinal e órgãos associados que possibilitam uma boa digestão, absorção e eliminação de nutrientes dos quais o sangue depende para a manutenção de uma boa qualidade.

Uma boa mobilidade do sistema musculoesquelético auxilia os processos anteriores descritos e o exercício físico torna-se um estímulo fulcral ao movimento e vitalidade. Infelizmente, a variável mais importante desta análise deverá ser a qualidade do movimento dos vários tecidos e, em muitos casos, as pessoas focam-se sobretudo em variáveis quantitativas como a amplitude de movimentos ou o volume do treino (intensidade, tempo, séries, repetições,…), já que se torna mais fácil mensurar a sua evolução.

Sendo a marcha (andar) um padrão primitivo básico torna-se numa das melhores formas de avaliar a postura dinâmica na maioria das pessoas pela sua aparente simplicidade mas também pela quantidade de informação que se pode recolher através da coordenação e fluidez dos movimentos. Na abordagem do treino funcional a locomoção é um dos 4 pilares que devem ser estimulados e andar é talvez a sua forma mais natural e utilizada ao longo da vida.

São muitos os benefícios de andar para a nossa saúde e longevidade, que dependem obviamente do estado e necessidades de cada pessoa:

  • Melhora a circulação (como qualquer treino do sistema cardiovascular fortalece o coração e potencia a sua eficiência, auxilia o retorno venoso e diminui o risco de problemas cardíacos como hipertensão, aterosclerose ou arteriosclerose);
  • Melhora a respiração (o aumento da frequência respiratória pode melhorar a eficiência das trocas gasosas bem como a expulsar algumas impurezas para limpar os pulmões);
  • Potencia o bem-estar geral (são muitos os estudos a associar caminhadas à melhoria do estado de humor, autoestima e saúde mental assim como a indicar o exercício físico como o melhor antidepressivo para o nosso organismo);
  • Alivia o stress (ao contrário das caminhadas do dia a dia em marcha rápida que se traduzem num stress excessivo, andar com calma na natureza pode servir de terapia para baixar a atividade do sistema nervoso simpático);
  • Ajuda a regular o metabolismo (o movimento de grandes grupos musculares como na marcha é possivelmente o maior aliado ao combate da síndrome metabólica que, com o decorrer do tempo pode levar a obesidade, diabetes,…)
  • Melhora o sono (uma vez que não representa na sua maioria uma atividade de grande intensidade pode ser a solução para pessoas que tenham dificuldades em dormir, desde que as caminhadas não se realizem nas 2-3 horas que antecedem o sono);
  • Oxigenação geral do organismo (o aumento do metabolismo, circulação e respiração permite aumentar os níveis de vitalidade e melhorar inclusive funções cerebrais);
  • Pode auxiliar na perda de peso saudável (embora deva ser sempre associado a outros tipos de treino, nutrição e descanso adequado);
  • Melhoria do sistema imunitário (como qualquer atividade física feita de forma regular e intensidade moderada permite preparar o organismo para se defender de organismos invasores);
  • Combate a osteoporose (o impacto, associado a uma boa nutrição, é essencial à regeneração óssea e respetivo aumento da densidade mineral óssea das zonas de carga);

Independentemente dos benefícios gerais de caminhar, quando o fazemos, devemos ter alguns pontos em consideração. É importante saber escolher um calçado que permita ao pé receber alguma informação do terreno, assim como evitar solos como o alcatrão e cimento já que não são naturais e não emitem qualquer vibração. Se possível deveremos privilegiar caminhadas na natureza para potenciar muitos dos benefícios uma vez que a oxigenação aumenta e a poluição do ar será menor. Andar numa passadeira em ginásios pode ser uma opção, se não for a única ou utilizada de forma abusiva já que o padrão de locomoção pode sofrer ligeiras alterações e, salvo raras exceções, nunca segurando com as mãos nas máquinas devido à desintegração do padrão cruzado e excesso de tensão nos membros superiores. Em todo o caso pode ser vantajoso em dias que o clima não permita a sua prática no exterior ou em treinos com protocolos específicos para controlar variáveis como a velocidade e/ou inclinação.

Boas caminhadas,

José Pereira – Master Trainer Holmes Place