Atualmente, as massas apresentam centenas, senão mesmo milhares de variedades, frescas ou secas, com ou sem ovo, com diferentes tonalidades e diversas nos formatos. Chegam às mesas mais humildes e aos banquetes mais abastados. Isto, um pouco por todas as latitudes. Associação imediata à mesa é a da massas a Itália. De facto, este país mediterrânico, criou uma verdadeira relação emocional com as massas, aprimorando como nenhum outro, a verdadeira arte de produzir e confecionar uma boa pasta al dente.
Uma história com barbas
Se é tido como certo o alto valor energético das massas, mais incerta é a certeza no que toca à sua origem. Há muito que se assume que o berço das massas será a China, chegando estas à Europa na “bagagem” de Marco Pólo. O incansável viajante veneziano, do século XIII, consagrou mais de duas décadas da sua vida a descobrir os mistérios do país governado pelo Grande Khan.
Hoje, levantam-se outras hipóteses sobre a provável origem das massas. Não se questionando a sua criação e utilização milenar na China, com provável importação pelo Ocidente de algumas técnicas, não se descuram outras origens, inclusivamente a própria Europa. Sendo o ingrediente base, o trigo (Trigo Durum), alimento de grande disseminação, não se exclui a hipótese da massa ter sido criada paralelamente em diversas civilizações. Diferentes povos da antiguidade conheciam a técnica da moagem do grão de cereal, acrescentando-lhe água, deixando-o a secar. O resultado era um alimento que poderia ser cozinhado em pouco tempo e preservado por períodos substancialmente mais longos do que o grão por si só.
Alguns estudiosos referem que as massas alimentícias já seriam consumidas na antiga Roma e mesmo antes, entre a civilização Etrusca. Foram encontradas num túmulo Etrusco decorações no estuque que se supõe representam utensílios domésticos, caso do martelo, rolo e roda dentada utilizados com a massa.
Há, porém, quem atribua a origem da massa aos povos árabes, referindo que era alimento consumido regularmente a bordo das embarcações e das grandes caravanas desde o ano 1000 a.C.
Séculos mais tarde, o geógrafo árabe Al Idrisi, escreveu que este alimento, baseado na farinha, com a forma de cordas enlaçadas, era produzido em Palermo, no então território sob domínio árabe da Trabia, hoje denominado Sicília. Os nomes árabes de itrya e fad (isto é, massa seca e fiozinhos) ainda se encontra em duas regiões que estiveram sob domínio árabe, nomeadamente a Sicília e Espanha. Na Sicília itrya deu tria e, em Espanha, fad originou fidear.
Os romanos gostavam de massa
Entre as origens para o termo massa, crê-se que este provenha de uma palavra grega significando “farinha mista em líquido”. Mais tarde, surge designando um alimento consumido pelos romanos, o Lagano (palavra ainda hoje utilizada nalgumas regiões do sul de Itália para indicar a massa em meadas: Laganella, Laganaca). O imperador Cícero (106 a.C – 43 a.C.) não escondia a sua paixão por estas tiras de massa largas. Há quem afirme, contudo, que o processo que permitia cozinhar o lagano, entre os romanos, se aproximava mais ao da pizza, em fornos ou com pedras aquecidas, do que ao da massa, isto é, mergulhada em água fervente.
Horácio nas suas “Sátiras” descreve o prazer que sentia sempre que voltava a casa e consumia a sopa de porros, grão-de-bico e lagano. Entre os autores romanos mais consagrados, Apício, mentor de um manual gastronómico, refere que em partes do Império se elaboravam receitas com folhas de massa partidas, tornando desta forma os pratos mais compactos.
O tomate, um grande amigo da massa
Pela Idade Média, cerca de 1280, no então estado de Génova, um inventário patrimonial levantado por um notário, refere uma cesta cheia de macarrão. O testemunho tem a sua importância pelo facto de só em 1295, alguns anos mais tarde, Marco Pólo ter regressado da sua memorável viagem por terras do Oriente.
Entre 1200 e 1400 a massa já alcançara enorme sucesso nos territórios que dariam origem, no século XIX, a Itália, inclusivamente entre as elites. O escritor Boccaccio, (1313-1375), nome grande da cultura da época, menciona as massas nas suas obras. Na época, o preço do produto era controlado pelas autoridades. Sempre que o preço da farinha excedia um determinado nível, por força de doenças, da guerra, ou outras calamidades, não era permitido produzir massas, exceção feita aquelas que se destinavam aos enfermos. Era comum neste período os livros de cozinha incluírem receitas com massa. Por esta altura os três principais centros de produção de massa, na Península Itálica, eram, Palermo, Génova e Nápoles.
No século XV a massa seca tornou-se popular a bordo dos navios que se faziam aos descobrimentos, pois podia ser facilmente armazenada e preservada, nos porões, por longos períodos. Seria, também com os descobrimentos e com os novos alimentos que começaram a surgir provenientes do novo mundo que se promoveria um feliz e longo casamento: O do tomate com a massa. Foi na cordilheira dos Andes, no atual Peru, que os conquistadores espanhóis do século XVI descobriram o tomate. Contudo, a primeira receita de massas com utilização de tomate só seria escrita em 1839. Até esta altura a massa comia-se à mão tendo o molho à base de tomate imposto a utilização de uma forquilha.
As massas ganham novas formas
Por volta de 1640, na Península Itálica, a massa era conhecida como Lasanha e os fabricantes de massa Lasanheiros. Em 1800 mudaram de nome passando a chamar-se Aletrieiros. Nos 400 anos que mediaram entre 1400 e 1800, às lasanhas e aletria foram acrescentados os fios de massa cilíndrica, conhecidos por Fiéis.
Aquele que viria a ser Presidente dos Estados Unidos, Thomas Jefferson (1743-1826), um dos pais da nação norte-americana, durante os seus anos como embaixador do seu país, em França, desenvolveu o interesse pelas massas. Regressado à sua pátria, em 1789, pouco antes da Revolução Francesa, Jefferson levou o primeiro fabricante de maccaroni. O próprio Thomas Jefferson empenhou-se na construção de uma máquina para cortar massa existindo ainda hoje desenhos saídos de sua mão. Entretanto seria um francês, instalado em Filadélfia, o primeiro impulsionador da produção de massas com fins comerciais nos Estados Unidos. Os grandes fluxos de emigrantes italianos propagaram a massa um pouco por todo o mundo, especialmente nos Estados Unidos, embora o esparguete e queijo fossem um prato já popular por terras do Tio Sam, desde a Guerra Civil.
Retornando ao Velho Continente, vamos encontrar, por volta de 1800, Nápoles e Génova como as duas capitais da massa, com a Rússia, a Sicília e o Norte de África a exportarem grande parte do trigo utilizado na confeção do produto.
Nápoles antecipou a era industrial na produção de massas, isto porque o rei deste pequeno Estado, Fernando II, (na época a Itália ainda não havia alcançada a unificação) não satisfeito com o método de produzir a pasta com os pés (a resistência do trigo duro obrigava a tal processo) introduziu um sistema composto por uma máquina que amassava os ingredientes para a massa e posteriormente a cortava. Entretanto Giuseppe Garibaldi, herói do Risorgimento italiano proclamava, em 1860, a Itália unida afirmando que “será o macarrão, juro-vos, que irá unir Itália”.
Com o advento da era industrial a massa ganha novo fôlego. Por volta de 1890 só em Génova existiam mais de 220 fábricas produzindo massas, embora ainda com níveis de produção relativamente baixos. Os avanços tecnológicos posteriores vieram permitir um aumento quer na quantidade, quer na qualidade do produto que se comercializava na altura.
Atualmente, Itália é o maior produtor de massas à escala global, com um consumo per capita anual de perto de 30 quilos por pessoa. Seguem-se, em produção, os Estados Unidos e o Brasil.
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