A primeira década em que se espera que seja a primeira de muitas. O Mula Velha, assinalou 10 anos com um cocktail no bar Loucos de Lisboa, na Graça, num ambiente intimista, mas de celebração.
Engarrafado em Alcobaça, este vinho é um dos de maior volume da região de Lisboa, representando 12% do portfólio da Parras Wines, num casamento feliz entre a empresa e a Sonae, uma vez que se trata de um vinho exclusivo desta cadeia de distribuição.
Mas este vinho já extrapolou as fronteiras portuguesas, estando presente em 17 países, com o Brasil à cabeça no lote de países que mais consome a marca fora de Portugal. Em 2021, a exportação representou 10% do volume de negócio da marca, num ano em que se venderam mais de dois milhões de garrafas de Mula Velha.
Já arrecadou o galardão de ouro no Berliner Wine Trophy e fez parte das páginas da revista de referência norte-americana Wine Enthusiast com uma distinção de 90 pontos + Best Buy. Há vários motivos para celebrar e os responsáveis já têm o próximo passo definido: alcançar faixas etárias mais jovens.
O grupo Parras Wines surgiu oficialmente em 2010, e o Mula Velha nasceu dois anos depois. Estamos a falar de um produto novo, mas que já carregava alguma experiência. Como foi feito esse trabalho?
Sim, nós como grupo já trabalhávamos a região de Lisboa há muitos anos, desde 1999, quando comprámos a Quinta do Gradil. Depois fomos comprando algumas uvas, começámos a tratar a vinha, e a certa altura começámos a ter algum volume disponível para poder fazer marcas de maior dimensão.
E como surge o Mula Velha?
A Sonae desafiou-nos para criar este vinho de Lisboa. E achámos que a região tinha de aparecer de forma disruptiva, porque o Douro tem aquele peso e tradição que conhecemos, o Alentejo também já tinha feito um trabalho nos últimos 20 anos. Há 10 anos, Lisboa era muito jovem. Aliás, a própria designação de Lisboa era muito recente, antes tinha outro nome, era Estremadura. Mas havia o estigma de que Lisboa não tinha bons vinhos. Como não tinha volume, não tinha bom vinho. Nós optámos por trazer primeiro a força de uma marca e de uma distribuição com qualidade, começámos a trabalhar a marca, e só depois é que fomos associando Lisboa. Porque perguntava-se, "mas afinal, isto é de onde?" Então acabámos por crescer, e hoje a Mula Velha é a marca que de facto representa tanto em termos de volume como todos os vinhos que se vendem da região, em Portugal.
A Quinta do Gradil também tem feito um trabalho importante pelo posicionamento da região.
Na Quinta do Gradil é onde temos os nossos topos de gama, os nossos vinhos de autor, uma enologia diferenciada. Temos a quinta com uma história extraordinária, com 500 anos, e fizemos as alterações necessárias para a tornar numa referência nos vinhos de Lisboa. Com a Quinta do Gradil não conseguimos ter volumes, aliás, o Mula Velha acaba por ficar com as uvas que não cabem na categoria que definimos para esse vinho. Fizemos esse trabalho e deu frutos. Foi empresa do ano, alguns anos. É um trabalho que é feito todos os dias, que tem sido contruído e não podemos parar de o fazer.
O vinho Mula Velha foi lançado em 2012, num ano e numa altura que não era propriamente favorável. Como recorda esse tempo?
Foi um ano em que queríamos desistir. Mas, aí fomos mulas velhas, fomos teimosos e acabámos por insistir. São ciclos e se calhar estamos a entrar noutro ciclo extremamente difícil. É lógico que quando se tem 30 ou 40 anos, a pré-disposição para a luta é um bocadinho diferente dos 40. Mas por isso é que vamos trazendo pessoas jovens à empresa e tentamos rejuvenescer as equipas para conseguirmos estar atuais e vencer os desafios. Foram anos muito duros, mas na minha perspetiva, os próximos vão ser bem mais.
Considera que o Mula Velha ajudou a trazer a região de Lisboa para as nossas casas?
Acho que as pessoas perceberam que Lisboa consegue fazer acima de tudo, vinhos de uma relação qualidade-preço quase imbatível. Por ser uma região mais nova, conseguiu não ter aqueles preconceitos que as outras regiões tinham. Em Lisboa, plantou-se muitas castas estrangeiras, há uma série de blends. Os nossos blends são misturas de castas estrangeiras com nacionais. Essa diversidade permitiu-nos conseguir ter perfis de vinhos muito mais consistentes, porque pode haver um ano em que Touriga Nacional, Aragonês, Tinta Roriz, não tem o perfil que tinha no ano anterior, mas podemos misturar com Alicante Bouchet ou com outra casta estrangeira, de maneira que aquele perfil se mantenha. Essa juventude que a região de Lisboa tem permitiu-nos chegar aqui e começar a fazer de Lisboa o que é hoje. E depois quando a denominação passou a ser Lisboa, conseguiu ter uma visibilidade diferente, mesmo no exterior. Eu acho que a fama de Lisboa vem de fora para dentro. Porque há muita gente que conhece Lisboa e depois quando chega quer provar um vinho daqui. Isso acaba por ser uma vantagem com os vinhos de Lisboa. Essa autenticidade da ligação à terra, faltava na região e acabámos por dar, também com o Mula Velha. E acho que Lisboa está a ganhar muito também com esta crescente de interesse no país.
Sente esta mudança? Por exemplo, os próprios restaurantes já começam a querer mostrar coisas da própria região e não só os clássicos?
Eu acho que o canal horeca já quer vinhos de autor e de nicho da região. E como região de Lisboa acaba por não ser uma região tão badalada, acaba por atrair essa curiosidade. E vai-se criando uma dinâmica ganhadora de pequenos projetos que aparecem no mundo dos vinhos. Estamos muito próximos do Atlântico, temos uma frescura nos vinhos. As pessoas provam e gostam, principalmente os brancos. Vai-se vendo uma dinâmica e a restauração acaba por ser o motor, e ao mesmo tempo, a consequência desta dinâmica. Os vinhos de Lisboa têm muito a ganhar, e muito à conta da distribuição.
Fizeram 10 anos. Quais os desafios do Mula Velha para os próximos anos?
O próximo desafio é chegar aos 20 anos e continuar com esta frescura e juventude. Queremos continuar a inovar nesse sentido e manter esta consistência no vinho. Podemos eventualmente, fazer alguns vinhos diferenciados, arrojados, como já vivemos. E essa vai a dinâmica de Mula Velha. Provavelmente, daqui a algum tempo, vamos ter que mudar alguma coisa. Quando se muda algo nesta marca temos sempre muito medo, porque tem impacto, é uma marca forte. Mas há que mexer para que não fique ultrapassada. Para não se tornar uma "mula velha".
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