“Uma supercomida do futuro”, foi como o chef angolano Nário Tala descreveu o catato, numa apresentação à imprensa do menu da Mostra Gastronómica Lusófona, que vai decorrer na Doca dos Pescadores de Macau, até 22 de outubro.
A surpresa fica reservada para a chegada do prato à mesa do Restaurante Vic’s, com o catato — um tipo de lagarta, típico da cozinha angolana — salteado com beringela, azeite, cebola e alho.
“É um alimento muito proteico, tem vitamina C, ferro, zinco, e podes encontrar com facilidade. Não engorda, é anticancerígeno, e pode ser feito de várias maneiras”, explicou Tala à Lusa.
As sementes de linhaça, cânhamo e chia, a maca, a espirulina, o açaí e as bagas goji são alguns dos chamados superalimentos, caracterizados por uma elevada concentração de nutrientes como vitaminas, ómega 3 e proteínas.
O catato “é um alimento comum, faz parte da cultura, principalmente na parte do norte de Angola”, mas Nala admitiu que ainda “há uma resistência” a comer esta lagarta da palmeira-de-dendé.
“Como tudo na vida, há de se ter um princípio”, defendeu o ‘chef’. “Em Angola há boas equipas a fazerem estudos do que são os nossos alimentos”, acrescentou.
Em fevereiro de 2023, o chef angolano Hel Araújo lançou o projeto Ovina Yetu (‘o nosso produto/a minha coisa’, na língua Umbundu), para recolher de forma exaustiva informações sobre mais de mil produtos nativos, incluindo o catato.
Depois de demonstrar “quais são os benefícios que tem para o corpo humano”, Nário Tala acredita que o catato vai encontrar um público entre as pessoas que procuram na alimentação “sustentabilidade e prevenção de saúde”.
O chef sublinhou que a lagarta “não precisa de ser cultivada” e que o seu consumo até pode encorajar a população a plantar mais palmeiras.
“Acabamos por consumir o que a palmeira nos oferece, mas sem destruí-la”, explicou Tala.
A importância da sustentabilidade foi também sublinhada por Maria das Dores, que saiu pela primeira vez da ilha de Príncipe para apresentar em Macau um ‘abobó’, com feijão, farinha de mandioca e peixe grelhado.
“Nós usamos aquilo que é nosso. Por isso, o que é nosso é bom e também fica mais barato”, disse à Lusa a chef santomense.
Para a timorense Delfina Maria Baptista Guterres, usar ingredientes autóctones como o milho e a batata doce é também uma forma de preservar tradições de Timor-Leste.
“O milho em pó, por exemplo, depois de frito, dura meses e essa era a comida que a gente levava quando vivíamos no mato, por vezes até anos, durante a ocupação, quando o inimigo vinha atacar”, recordou a chef timorense.
A Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin) levou a cabo uma resistência armada nas matas timorenses durante décadas, após a invasão por parte da Indonésia, em 7 de dezembro de 1975.
“Mas essa malta nova já não faz muito disso, querem coisas mais instantâneas”, lamentou Guterres.
A Mostra Gastronómica Lusófona inclui ainda Martinho Moniz, um ‘chef’ português radicado em Macau, e a macaense Ana Manhão.
Manhão disse que, mais do uma chef, se identifica como uma defensora das “tradições culinárias” dos macaenses, uma comunidade euro-asiática, composta sobretudo por lusodescendentes, com raízes no território.
Os cinco chefs irão também dar workshops de culinária, no âmbito da 16.ª Semana Cultural da China e dos Países de Língua Portuguesa.
VQ (MSE/DZC/PMC/DYAS/RCR) // CAD
Lusa/Fim
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