Vê na sopa, o seu prato preferido, a matriz de uma região, pois síntese dos produtos e saber-fazer locais. Elísio Bernardes, Chef Executivo do Meliá Braga desde janeiro de 2020, acaba de ver o seu empenho na valorização da cozinha regional, assim como o papel ativo em causas sociais e sustentabilidade ambiental, reconhecidos com o título honorário “The Ambassadors of Taste for the Global Gastronomy”, tendo recebido a medalha de prata este 2021.

Elísio Bernardes, natural de São João de Ver, aldeia do município nortenho de Santa Maria da Feira, traz formação na Escola de Hotelaria de Santa Maria da Feira. O também chefe de cozinha do departamento de alimentação de alto rendimento do S.C.Braga, teve a oportunidade de trabalhar com vários chefes de cozinha de renome, assim como em restaurantes de alta gastronomia em Portugal, Suíça, Hungria, Itália e Espanha.

Formador nas Escolas do Turismo de Portugal no Porto, Viana do Castelo e Algarve, Elísio Bernardes olha para a sua profissão como um caminho para mudar o mundo, inspirando a viver de forma sustentável. Sem radicalismos, mas consciente, definiu uma linha de pensamento ecológico, em sintonia com produtores locais, estudo do receituário e respeito pelo ciclo do produto.

No Meliá Braga Hotel & Spa, Elísio Bernardes apresenta uma gastronomia de assinatura contemporânea, com laivos de mediterraneidade, com destaque para os sabores nortenhos.

É raro encontrar um chefe de cozinha que não remonte a sua atividade às suas raízes e memórias. O Elísio Bernardes revê-se nestas palavras?

Tudo na nossa vida remonta a raízes e memórias, e na gastronomia, como noutros ramos, o lado humano e todo o conjunto de experiências que vivemos tornam-se sempre o lado mais forte e o mais característico de cada um de nós. Faz com que cada um de nós veja a cozinha de uma forma diferente e tão singular.

Portugal tem um novo embaixador gastronómico, o chefe de cozinha Elísio Bernardes
créditos: Meliá Braga Hotel & Spa

O Elísio Bernardes recebeu recentemente “The Ambassadors of Taste for the Global Gastronomy”. Quer explicar-nos a que se refere este galardão e o que compete a quem o recebe?

Este prémio vem reconhecer a minha contribuição para a valorização da gastronomia regional e das receitas tradicionais portuguesas, assim como o papel ativo em causas sociais e de sustentabilidade ambiental.

Acreditaram no meu trabalho e muito dele será divulgado num futuro próximo. Este reconhecimento será um estímulo extra para continuar o meu caminho, pois a vontade e a essência estará sempre cá.

Acredito que os chefes de cozinha  podem mudar o mundo, inspirando a humanidade a pensar e a viver de forma sustentável, reduzindo o desperdício de alimentos, respeitando os ingredientes e o valor dos recursos naturais e nunca esquecendo o bem-estar animal.

Dedico-me à pesquisa diária de produtores locais, estudo receitas ancestrais e respeito o ciclo normal do produto, desde a origem ao consumidor final.

Este título reconhece a dedicação à gastronomia local, sazonal e consciente. Através da sua cozinha como põe em prática cada um destes três termos?

Dedico-me à pesquisa diária de produtores locais, estudo receitas ancestrais e respeito o ciclo normal do produto, desde a origem ao consumidor final, tendo em mente sempre o mesmo mote de orgânico ou biológico.

Não é um trabalho “radical”, mas consciente, ou seja, não sou radical ao ponto de exigir toda uma matéria-prima local. Mas sou consciente ao ponto de definir uma linha de pensamento ecológico, com base em práticas éticas, biológicas e saber a origem do produto e como chegou até às minhas mãos.

Portugal tem um novo embaixador gastronómico, o chefe de cozinha Elísio Bernardes
créditos: Meliá Braga Hotel & Spa

Hoje, temos de juntar aos termos anteriores um outro, a sustentabilidade. De que forma combate o desperdício alimentar na sua cozinha?

Temos mantido um trabalho de gestão de stocks de forma a minimizar quebras. Apostamos num menu muito mais “ativo” e adaptado à realidade, ou seja, não temos as cartas tão longas ou fixas. Todos os dias são dias de aprendizagem e de melhoria. Toda a equipa sente que diariamente está a fazer melhor e está a ser mais consciente.

Outra questão premente é a do bem-estar animal. Como se concilia esta questão com uma cozinha tradicional portuguesa que não dispensa a proteína animal?

Com o desenvolver de uma consciência coletiva, cada vez mais temos acesso a proteína animal consciente e sustentável, desde a organização MSC [Marine Stewardship Council] com o pescado até à Carne D’Erva, com bovinos, em Vila Franca de Xira.

Temos excelentes pessoas a respeitar e dignificar cada vez mais o nosso produto que por si também é de excelência.

Contactou de perto com diferentes cozinhas internacionais. No que toca à cozinha portuguesa, podemo-la colocar ao nível das grandes cozinhas ou temos, essencialmente, um bom produto?

Não sou defensor do termo “melhor” do que. Temos excelentes pessoas a respeitar e dignificar cada vez mais o nosso produto que por si também é de excelência.

Neste contexto, como classifica a cozinha minhota que tão bem conhece?

Trata-se de uma cozinha muito diversificada e com muita margem de desenvolvimento. No Minho encontramos muitas “técnicas” e receitas ancestrais, produtores locais com muito saber-saber e saber-fazer. Reflete a imagem de um povo muito distinto, real e genuíno.

Quer dar-nos alguns exemplos de como nos podemos “apropriar” criativamente da cozinha tradicional em termos de receituário?

Respeitando sempre a tradição: isto é o mais importante, e ao mesmo tempo temos de ser consciente ao ponto de definir a origem da matéria-prima e dignificar os produtores locais. No caso do Bacalhau à Moda de Braga, por exemplo, tentamos procurar produtores locais de batata e cebola e procurar um Bacalhau com selo MSC.

Portugal tem um novo embaixador gastronómico, o chefe de cozinha Elísio Bernardes
créditos: Meliá Braga Hotel & Spa

Extrapolando, como promove esta cozinha de carácter regional?

Todo este novo cenário de pandemia veio alterar alguns planos, mas iremos organizar alguns eventos em conjunto com outros cozinheiros bem como algumas surpresas que a seu tempo serão desvendadas, onde o Meliá Braga se assumirá como um palco muito interessante.

Prato de eleição? Sopa, pois diz tanto de uma região. Tenho como preferência a de feijão e couve-portuguesa.

Tem uma relação de proximidade com os produtores. De que forma pode o cozinheiro incentivar a autoestima e rentabilidade de quem produz?

Defendo que o cozinheiro tem sempre um papel importante nesta transação. O número crescente de cozinheiros a procurarem o produto de uma forma consciente fará com que o processo se torne natural.

Se me sentasse à mesa do restaurante do Meliá Braga Hotel & Spa que pratos me aconselharia?

Todos os dias lançamos um menu “Mercado” que assenta em tudo o que defendemos. É um menu diário, definido com o que encontramos na região, que seja sazonal, que seja consciente e que garanta a maior rentabilidade.

Por último, tendo de escolher um prato da sua preferência qual é o eleito e porquê?

Prato de eleição? Sopa, pois diz tanto de uma região. Tenho como preferência a de feijão e couve-portuguesa. Traz-me conforto acima de tudo, além do sabor e aromas fabulosos.