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A chef Marlene Vieira conquistou a sua primeira estrela Michelin para o restaurante Marlene, um feito que representa um marco na sua carreira e na gastronomia portuguesa. A gala do Guia Michelin Portugal 2025 aconteceu no Porto, no edifício da Alfândega. Durante o evento, a Chef expressou a sua alegria e refletiu sobre o caminho até este momento.
"Temos excelência, temos qualidade. Eu nunca duvidei de mim, é importante dizer-vos isso. Eu acreditei em mim mais do que qualquer outra pessoa”, afirmou a Chef em declarações aos jornalistas. Apesar de ser um momento especial na história do guia português, uma vez que enquanto guia moderno e no século XXI, a chef é perentória: “Acho que é importante para qualquer pessoa, não tem nada a ver com o facto de ser mulher ou ser homem. Antes de esperarmos validações dos outros, é nossa própria força acreditar. Muitas vezes nós sentimo-nos excluídos e foi por poucos minutos que eu senti essa insegurança. Eu sabia que poderia estar e que tinha capacidades para estar num nível de excelência, e foi isso que me alimentou até aqui."
Sobre a questão de se este reconhecimento poderia ter chegado mais cedo, Marlene Vieira acredita que "há um tempo certo para tudo. O meu percurso é um percurso de trabalho e de não abdicar de certas coisas na minha vida: da minha filha, do meu marido, de certos projetos que eu gosto de ter e que ajudam também a alimentar aqui. Nós temos uma empresa com quatro restaurantes, sem qualquer investimento exterior. O Marlene, foi sendo adiado durante muitos anos porque para termos um restaurante neste nível é preciso muito investimento financeiro e eu nunca tive esse investimento. Precisava primeiro ganhar dinheiro noutros restaurantes. Foi isso que aconteceu. Portanto, é merecido. Este, para mim, não é um prémio só para um restaurante. Este é um prémio de carreira. É assim que eu sinto."
Demonstrando a sua forte ligação às raízes, a chef, natural da Maia, falou da coincidência de ter conquistado este prémio praticamente na sua cidade berço. "Isto é uma raça do caraças! Parece que estava escrito nas estrelas, não é? Como é que as coisas dão voltas! É o tempo, nós temos que saber esperar, saber olhar para as coisas”, assegura, acrescentando que “há muita intuição nesta profissão. Eu nunca fui outra coisa na vida. Mas eu ouvi sempre a minha intuição. Sou uma pessoa competitiva por natureza, mas comigo mesma, não é com os outros. Trabalho muito de dentro para fora. Sabia e acreditei sempre que isto podia ser possível um dia. Isso só dependia de mim e, claro, de pessoas com muito talento ao meu lado."
A conquista foi também um momento especial para a sua família, especialmente para a filha, Isabel. “Gritou tanto! Uma filha com dois pais com estrelas Michelin (em referência a João Sá, do restaurante Sála) . Eu não sei como é que vou aguentar o ego desta criatura.”, contou, entre risos, demonstrando o orgulho e a alegria que viveu com a família.
Quando questionada sobre o impacto da estrela Michelin na dinâmica do restaurante, a chef garantiu que o compromisso com a evolução continua. "O nosso menu muda de três em três meses, mais ou menos. Esse conceito vai continuar. Mas nós temos de andar para a frente, não vamos andar com os caranguejos, para o lado”, assegura, ao mesmo tempo que garante que “estamos cheios de motivação, cheios de ideias. Nós somos criativos. E precisamos desta palmada nas costas para continuar. E eu já me conheço, vou querer mais."
Quanto ao futuro e à possibilidade de alcançar uma segunda estrela Michelin, Marlene Vieira respondeu com ambição: "Vejo sempre uma luz ao fundo do túnel. E foi isso que me salvou muitas vezes. Mas, obviamente, eu ambiciono mais. Não sei, segunda talvez. Mas é continuar a fazer aquilo que nós fazemos, sem estarmos demasiado obcecados. Não quero perder essa forma de estar."
Sobre a presença feminina na gastronomia e o reconhecimento de mulheres chefs, Marlene Vieira destacou a importância de maior equidade no setor: "Há uma esperança. É muito importante para Portugal que haja esta força, estes exemplos de foco, de trabalho e também de uma forma saudável de estar. Porque não é preciso estar 15, 18 horas no trabalho para se conquistar isto. Isso não é verdade. É preciso talento, dedicação, foco, envolver a equipa. Ser autêntico, ser único. É muito importante para darmos algum sentido à vida."
A chef aproveitou também para reforçar que o setor precisa de mais apoio às mulheres, destacando que, muitas vezes, elas têm de se esforçar mais para conseguir o mesmo reconhecimento. “A sociedade quer ver homens à frente no poder. Há mulheres extremamente talentosas que não têm oportunidades porque não lhes dão esse voto de confiança.”, frisou, sublinhando a necessidade de mudança e de um apoio mais ativo às mulheres no setor.
O sucesso de Marlene Vieira representa não apenas o reconhecimento do seu talento, mas também uma mudança significativa na valorização do papel das mulheres na alta gastronomia. Com esta estrela Michelin, a chef projeta um futuro promissor para o restaurante Marlene, e para a nova geração de chefs portugueses.
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