A conversa. O dia em que tudo vai ser explicado antes que a criança entre no mundo dos adultos, antes que seja tarde. Este ritual, não tão antigo quanto isso, é o primeiro dos erros que se pode cometer ao comunicar com os filhos. "É muito fácil adiar este tema. Pensar que há um momento certo que, depois, nunca chega", comenta Ana Beato, psicóloga clínica, segundo a qual a grande conversa acaba por deixar os filhos (e os pais) constrangidos.
O problema é que muitos procuram concentrar numa só conversa tudo o que não lhes foram explicando ao longo da vida. "A partir do momento em que a criança começa a interagir com os pais, há muitas maneiras de abordar a sexualidade e a intimidade. E todos os momentos são bons para falar sobre isso", aconselha a especialista. Veja, de seguida, as respostas a dar aos tipos de comentários mais comuns.
Mãe, pai… O que é que estão a fazer?
Ser surpreendido em pleno ato sexual é o medo de muitos pais. Uma preocupação compreensível, mas que não deve ser excessiva, defende a psicóloga clínica. "O casal deve manter a sua intimidade e pode criar códigos com os filhos. Explicar que a mãe e o pai gostam de estar a sós sem serem interrompidos", refere. "Quando os pais estão sozinhos, se precisares de algo, bate à porta", devem dizer.
Quando, apesar disso, o flagrante se dá, mantenha a calma. "Se a criança é muito pequena, é preciso clarificar que o pai e a mãe estavam a dar miminhos um ao outro, uma coisa que os adultos fazem", afirma a especialista. "Não há problema em admitir que estavam a fazer amor, felizes um com o outro e que ficaram surpreendidos ao ver a criança", sublinha ainda Ana Beato.
De onde vêm os bebés?
A pergunta é simples e curta, tal como deve ser a resposta. "Pode dar uma ou outra informação mas não despejar toda a enciclopédia sobre a sexualidade, muito menos usar vocabulário muito técnico", refere a especialista.
Nas primeiras fases, pode recorrer à ideia da sementinha, mas à medida que a idade avança, sobretudo hoje em dia com o acesso às novas tecnologias, há necessidade de ser mais fidedigno, usando palavras como relação sexual, pénis ou vagina", diz Ana Beato.
O João chamou-me maricas!
Maricas, paneleiro… As expressões são várias. "É frequente o termo gay ser usado como insulto", comenta a psicóloga clínica. Após referir que o colega terá dito isso para ofender, porque pensa ser algo errado, explique o que é. "Tal como a mãe gosta do pai, há homens que gostam de homens e mulheres que gostam de mulheres e têm uma relação. São casais como os outros, mas em menor número", sugere a especialista.
"Infelizmente, algumas pessoas criticam esses casais por não ser habitual e acham que é uma coisa a má, mas é algo absolutamente natural", exemplifica ainda a psicóloga clínica. Além dessa explicação, deve fazer compreender o seu filho que este tipo de insultos é reprovável e não deve ser repetido publicamente.
Porque é que eu tenho pilinha e ela não?
Responder a este clássico das dúvidas infantis é uma boa oportunidade para ajudar a criança a perceber "que os géneros são diferentes e os corpos têm particularidades". Mas tenha atenção!
Ao apontar as diferenças anatómicas, não associe os estereótipos, como as meninas gostam de bonecas e os rapazes de futebol, "porque estará a condicionar, fazendo com que meninas que gostam de jogar à bola se sintam mal, por exemplo. São coisas distintas e é preciso ter cuidado", alerta Ana Beato.
Mãe, isso é sangue? Estás ferida?
O período menstrual pode ser algo assustador para uma criança. Se for confrontada com questões sobre o tema, evite esconder e tranquilize o seu filho, explicando que não tem um problema de saúde. Use uma linguagem simples, como sugere a psicóloga clínica.
"Todas as mulheres, a partir de uma determinada idade, todos os meses, deitam um bocadinho de sangue. Não é ferida nenhuma, é uma coisa normal, como fazer chichi ou cocó. A mãe usa estes pensos e proteções para não se sujar", aconselha.
Texto: Manuela Vasconcelos com Ana Beato (psicóloga clínica)
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