Mas aquilo que eu mais sabia era que, não os querendo proteger em demasia, iria querer defendê-los das dores agudas. Daquelas que parecem escusadas. Daquelas que o amparo de uma mão pode prevenir. Mais um erro crasso. As minhas mãos de mãe não chegam para travar muitos incidentes. Mesmo aqueles que, como o que sucedeu há menos de uma semana, estão à distância de um passo.

No início da noite, ao descer a escada rolante de um centro comercial, o meu filho Tomás enfiou o pé na lateral do equipamento. E eu só dei pela situação quando ouvi o seu choro agudo, a que se seguiu a paragem radical da escada. O pé preso, ele a soluçar num choro dorido, os irmãos e os desconhecidos num olhar de impotência, e eu a procurar soltar-lhe o pé que, minutos depois, viria a revelar-se mais que dorido. Um rasgão aberto, os paramédicos connosco, ele a ameaçar perder os sentidos, uma corrida relâmpago para as urgências hospitalares mais próximas.

Foi um susto. Graças a qualquer energia divina, foi apenas um susto que se solucionou com meia dúzia de pontos. Mas foi um daqueles sustos que me fez questionar-me enquanto mãe. Ele estava ao meu lado, de mão dada comigo, a pedir-me gomas da loja que já se adivinhava no fundo da escada rolante. E eu, atenta aos meus outros três filhos e presa ao cumprimento das rotinas que se seguiam, permiti que o susto se desse. ‘Permiti’, como se tivesse as tais mãos mágicas que poderiam evitar tais maleitas.

Não podem. Não conseguem. E esta impotência da maternidade, nos momentos que doem mais que qualquer mero joelho esfolado, é uma das partes que mais me dói. Porque expõe a fragilidade e a fraqueza que nos torna humanos.

Deste susto, vou reter o momento em que o meu filho foi suturado e eu procurei, a custo, entretê-lo para o distrair da dor. Aquele momento em que, enquanto o médico sem mantinha em concentração absoluta, o Tomás me fitou os olhos, agarrou o meu rosto com ambas as mãos e me disse “não te preocupes. És tão querida...”. Porque, para ele, eu estive sempre lá. Mesmo sentindo eu que não tinha estado.

A maternidade é feita destas coisas. De um amor gigante e de uma necessidade utópica de os proteger dos incidentes da vida. De uma vontade atroz de trocar as dores por sorrisos. E por uma aprendizagem dorida de que ser mãe é, também, ser humana

Alda Benamor