Ontem, no intervalo de uma reunião, uma mulher falou-me dos seus filhos. E partilhou que, até há poucos meses, trabalhava como freelancer, o que lhe permitia ter mais tempo para si e para os miúdos. Mas que agora, com um emprego certo e diário, tem de fazer uma grande ginástica para conseguir conciliar todas as responsabilidades pessoais e profissionais. Concordei, mas perguntei-lhe se não lhe sabia bem ter aquelas horas fora de casa, focada em temas que não roçam fraldas e roupa por passar a ferro. Fixou-me, sorriu num jeito de cumplicidade parental e segredou:

- Nem imagina o bem que me sabe! Passei a semana do Carnaval em casa com os miúdos e ia dando em maluca!

A maternidade tem também muito disto, desta bipolaridade emocional que tanto nos faz querer passar todo o tempo do mundo com as crianças como, de repente, nos leva a ansiar por umas horas sem contacto com pessoas cuja idade tenha menos de dois dígitos.

Gosto cada vez mais da companhia dos meus filhos. Talvez seja por estarmos a viver uma fase especialmente boa em termos familiares; talvez seja por eles estarem mais crescidos e, logo, a logística diária ser menos “massacrante”; talvez seja por sentir que encontro neles um porto de abrigo que, muito provavelmente, nunca encontrarei em mais ninguém. Mas, apesar desta dependência que me é quase orgânica, continuo a ter momentos em que preciso de uma pausa. Como quando um cliente me telefona fora de horas e a voz do interlocutor se mistura com os gritos que denunciam mais uma “saudável briga de irmãos”. Ou como quando eu só quero tomar calmamente o meu banho matinal e eles resolvem puxar o autoclismo, transformando a água quente em verdadeiras pedras de gelo que torturam a minha pele.

Ou, então, como aquele momento em que, depois de passar horas a trabalhar numa proposta, a dou por finalizada, e, no preciso segundo em que me preparo para carregar no botão de “gravar”, um deles tropeça no carregador do portátil e o dito se desliga instantaneamente. Fazendo-me perder o documento, a paciência e o tal bom senso maternal que (diz a mãe do Ruca) nos devia acompanhar de manhã à noite.

Hoje tive esse momento.

Alda Benamor