Bruno Ramalho, 41 anos, analista de crédito. Foi pai de Olívia em junho de 2020 e usufruiu da licença parental inicial e da alargada

"Nós decidimos pré-covid que a Olívia iria apenas para a cheche  em setembro de 2021. Restava saber quem tirava a licença alargada. Apesar de ser um direito que nos assiste, não conheço muitos homens que o façam. Acho que hoje em dia ainda existe a ideia de que a licença de parentalidade é algo da mãe. A minha namorada disse que achava que deveria ser eu a tirar e eu concordei. Por um lado, consegui acompanhar esta fase da Olívia mais de perto. Por outro, isso fez com que a mãe não ficasse afastada da sua atividade profissional muito tempo. Se tivesse sido ao contrário ela ia estar praticamente um ano fora da empresa, o que não é bom para nenhuma carreira, e acabou por ser uma escolha lógica ser eu a ficar com a bebé em casa.

Devo dizer que eu já sabia que, muito provavelmente, do lado da minha empresa, não teria qualquer problema em tirar a licença alargada e estar fora quatro meses. E em relação a isso estava tranquilo. Sobre o histórico que existe em relação à paternidade acho que existem cada vez mais homens a tirar a licença parental e acho que o pai começou a ser visto como alguém que deve estar presente desde o primeiro momento num projeto que, à partida, é a dois. Por exemplo, com a COVID-19 deixei de poder assistir às consultas com a mãe - deixei de ver as ecografias e de falar com a obstetra - e depois do nascimento da Olívia também não pude assistir às consultas de pediatria. É natural que a mãe tenha de estar presente, mas isto são dois pequenos exemplos em que o pai é afastado de momentos em que é importante estar presente e que eu, como pai, queria estar lá.

O mês que tirei da licença inicial coincidiu com o período de férias da mãe e os três meses da licença alargada também coincidiram com ela estar em teletrabalho. Ou seja, nunca estive sozinho a 100% com a Olívia apesar de estar o dia todo a cuidar dela. Foram três meses que passaram a voar e em que o bom supera largamente o mau. Costumo dizer que estou a acompanhar o desenvolvimento da minha filha em direto. É uma fase muito divertida porque todos os dias ela vai descobrindo coisas novas, e ver esse crescimento é muito gratificante para mim enquanto pai.

Em relação à duração da licença parental acho que esta poderia ser maior e que estes momentos iniciais com o bebé devem poder ser vividos a dois

O facto de ter tirado a licença alargada mudou um bocadinho a minha forma de pensar sobre o tema da maternidade. Antes de mais, tudo o que envolve ter um filho é diferente para o homem e para a mulher, o que faz com que a relação que o bebé cria com a mãe ser diferente daquela que é criada com o pai. Mas eu sabia que, para as mulheres, todo o processo de gravidez e pós-parto não é um mar de rosas, que tem fases difíceis, desgastantes e momentos em que nós, enquanto homens, temos de estar ali para o que der e vier.

Em relação à duração da licença parental acho que esta poderia ser maior e que estes momentos iniciais com o bebé devem poder ser vividos a dois. E eu tenho a certeza de que, futuramente, a relação com a minha filha vai ser diferente - e para melhor - do que se não tivesse tirado esta licença."

Gonçalo Santos, 36 anos, funcionário numa ONG. Foi pai de Gabriel em janeiro de 2014 e usufruiu da licença parental partilhada, da alargada e de licença sem vencimento durante três meses

"Nos dois filhos gozei sempre a licença parental partilhada com a mãe e fizemos sempre o período máximo que a lei nos permitia. No caso do meu filho mais velho, o Gabriel, optámos, por diversas circunstâncias, em fazer ambos a licença parental alargada e quando a minha mulher regressou ao trabalho eu fiz a licença parental alargada e pus mais três meses de licença sem vencimento até ele fazer um ano. Por estar num período de mudança profissional e porque não tínhamos com quem deixar o Gabriel, fomos sempre aproveitando estas benesses que a lei nos foi dando para passar o máximo de tempo com os nossos filhos. Eles são muito pequenos e ter de os pôr numa escola ao fim de seis meses de vida é muito duro para todos.

Na altura, felizmente, tive alguma flexibilidade laboral e compreensão por parte da minha entidade empregadora e acho que isso é determinante para mais homens poderem usufruir daquilo que são os seus direitos. No entanto é preciso fazer algum planeamento e pé de meia. Os 25% [ de remuneração] não é mau, mas acho que se o apoio estatal fosse um bocadinho superior, as pessoas iriam optar mais facilmente por prolongarem a licença.

Ficar com uma criança pequena – ainda para mais um primeiro filho – é sempre desafiante e é uma aprendizagem para todos os pais, sem exceção. Para o homem é mais desafiante porque não tem a ajuda hormonal que as mães têm e que ajuda à ligação com os miúdos. Nesse aspeto, esta licença acaba por ser uma boa forma de reforçar o vínculo com a criança e é uma oportunidade que todos os homens deviam abraçar e onde o papel de cuidador sai reforçado. Não é comum os pais aproveitarem estas licenças parentais e no meu entender há dois fatores determinantes para que haja uma maior partilha da parentalidade entre o pai e a mãe: a segurança profissional e a questão financeira. Desde que eu tive o Gabriel creio que já aumentaram cinco dias os prazos de licença obrigatória e isso é um estímulo para que essa partilha aconteça.

Esta licença acaba por ser uma boa forma de reforçar o vínculo com a criança e é uma oportunidade que todos os homens deviam abraçar

Eu acho que nos primeiros seis meses em que a mãe está de licença era importante o pai ter mais tempo disponível – como é o caso da redução de horário – para poder estar mais presente em casa numa altura com grandes alterações na dinâmica familiar. Cuidar de um filho pequeno é muito difícil para quem fica sozinho 24 horas com noites mal dormidas, com choros e com birras.

No meu caso, eu já não tinha a barreira da mulher que cuida e do homem que trabalha. Apesar de isso ainda ser um preconceito para muita gente, eu parti logo para esta fase com uma mente diferente. O tratar dos miúdos e estar mais tempo com eles também nos põe na pele do outro e percebemos que é um trabalho que não é facilmente conciliável com outras atividades, principalmente com miúdos muito pequenos. É importante os homens passarem por essa experiência para darem valor ao papel da mãe que, durante aquele tempo, é minimizado. A experiência que eu tenho é que muitas vezes os pais partilham a licença, mas na prática não é uma licença partilhada. O que acontece é que a licença do pai acaba por ser umas férias com a mãe.

Muitas vezes a maternidade é romanceada: é fantástico termos um filho e gerarmos uma vida, mas os tempos que se seguem são tempos difíceis, de mudança. E isto numa altura em que vivemos muito da imagem e das redes sociais, em que tudo é bonito e perfeito, a verdade é que, muitas vezes, a maternidade é muito imperfeita e muito dura. Este é, sem dúvida, o maior desafio por que passamos: criar pequenos seres."

Mauro Pereira, 28 anos, analista de crédito. Foi pai de Alícia em maio de 2019 e usufruiu da licença parental inicial e da dispensa para aleitação que acontece no primeiro ano de vida do bebé

"No meu caso isto foi quase uma imposição porque a minha esposa estava a recibos verdes há menos de um ano e mesmo que gozasse a licença não teria qualquer rendimento. Na altura custou-lhe muito ir trabalhar ao fim de um mês, mas passado pouco tempo percebeu que teria de ser assim. Eu gostei muito de usufruir da licença e hoje em dia tenha uma ligação com a mais nova que nunca pensei ter. Neste momento quer o pai para tudo: para dar banho, para vestir, para comer.

Eu nunca tive medo de usufruir da licença e de estar com as crianças porque sempre me senti muito à vontade com as minhas filhas. Elas sempre dormiram a noite toda, sempre comeram bem e acho que as rotinas ajudaram muito no desenvolvimento delas. Tenho a noção de que sou um pai muito calmo, que não entro em desespero facilmente e nem sou de gritar. Sou mais liberal e tento fazer as coisas de outra forma. Logo no início só houve uma situação que me deixou em pânico: a minha esposa deixava o leite para eu amamentar a Alícia e houve um dia em que eu lhe dava o leite e passado 10 min ela não parava de chorar. Aconselhei-me com a minha mulher que me disse para ir ao posto médico e chegamos à conclusão de que o leite já estava fraco e tivemos de optar pelo suplemento.

Acho que existe um desconhecimento muito grande em relação às licenças parentais e não sei até que ponto as entidades patronais estão recetivas a que seja o homem a tirá-las, apesar de no meu caso, a minha empresa ter aceitado muito bem. Quando soubemos que a minha esposa estava grávida tentámos procurar ajuda porque na altura ela estava a recibos verdes e a Segurança Social disse-nos que, apesar de não ser muito normal, o pai poderia usufruir desta licença e que era um direito. Colocámos a questão em cima da mesa e a minha esposa perguntou-me se estava à vontade em ser eu a tirar porque já tínhamos a filha mais velha. Em termos de pai, sei que tem muito pouco a apontar-me.

Acho que existe um desconhecimento muito grande em relação às licenças parentais e não sei até que ponto as entidades patronais estão recetivas a que seja o homem a tirá-las

Apesar de ser apologista de eles irem para a creche, interagirem com outras crianças e começarem a ter rotinas de dia a dia, acho que deveria ser possível usufruir da licença de parentalidade sem a quebra de rendimentos. O ideal seria três ou quatro meses para cada progenitor de forma a poderem ter uma ligação muito mais forte com as crianças. Por exemplo, a minha primeira filha era muito agarrada à mãe e apesar de sempre ter sido um bom pai, a minha responsabilidade de família na altura era diferente. Com a segunda filha comecei a dar muito mais valor aquilo que as mulheres passavam porque apesar de ser gratificante é cansativo. Ou seja, a minha forma de pensar e valorizar o papel da mãe nos primeiros meses de vida da criança mudou completamente. Fiquei com uma visão muito macro do que é ser mãe e ser pai."