Neste artigo a pediatra Joana Martins explica em cinco pontos todos os cuidados essenciais na prevenção das picadas de insetos.
De moscas a mosquitos, passando por aranhas, formigas, vespas e abelhas, a verdade é que quanto maior fôr a superfície da pele exposta, quanto maior for o tempo de exposição, maior o risco de ocorrência de uma picada. E é por isso que vamos pôr os miúdos numa redoma? Claro que não! Exceção feita para os miúdos que têm uma conhecida alergia à picada de himenópteros (vespas e abelhas). Os restantes terão que fazer a sua vida normal. Desde quando é que não se brinca por medo das picadas de insectos? E nós, como pais, teremos que aprender a lidar com o assunto sem dramas!
Quando sofremos uma picada, temos à partida uma lesão pequena, puntiforme, que corresponde ao local de picada e, em torno desta lesão, um halo vermelho, mais ou menos intenso, mais ou menos inchado, mais ou menos doloroso. E qual é o sinal cardinal, número 1, mais importante e comum a todas as picadas? A comichão! Por vezes a comichão é tão intensa, gera tanto inchaço na pele, que já nem é percecionada como comichão, passando antes a ser um ardor contínuo.
Cuidados iniciais
Lavar cuidadosamente o local da picada com água e sabão. No caso de picada por abelha ou vespa, verificar se, no local da picada, consta ou não o ferrão (mais frequente na picada de abelha). Nesse caso, deverá ser retirado com movimentos de raspagem da pele, ou com recurso a uma pinça bem limpa, já que a extração por expressão (como se fossemos rebentar uma borbulha) pode ser bastante dolorosa.
Controlo de sintomas
No local podemos sempre aplicar gelo, que ajuda a controlar os sintomas inflamatórios. Adicionalmente, há uma cultura de aplicação de gel anti-histamínico no local da picada. No entanto, esta prática não é tão eficaz como tomar efetivamente um anti-histamínico, versão comprimido ou xarope para os mais pequenos.
Atenção que algumas práticas, como colocar uma moeda de cobre sobre o local de picada – tendo em conta que as moedas são dos objetos mais sujos que temos o privilégio de manusear - ou a aplicação de álcool não só não trazem vantagem nenhuma, como podem aumentar a sensação de irritação local.
Em caso de dor no local da picada, não hesitem em fazer uma toma isolada de paracetamol ou ibuprofeno.
Avaliar o risco de infeção
Precisamente porque as picadas dão comichão, o mais natural são as crianças (e adultos) coçarem. Para evitar acidentes de maior, com lesões de coceira e infeção bacteriana secundária, nada como manter uma boa higiene das mãos e assegurarem-se que os miúdos têm as unhas cortadas rentes e bem limadas.
No caso do halo vermelho em torno da picada se tornar maior, mais duro, mais doloroso, mais vermelho e de se associar ao desencadear de febre, a possibilidade da lesão de picada ter infetado é real. Nesses casos, é recomendável a observação médica.
A anafilaxia
Este sim é o aspeto mais temível de toda e qualquer picada, mas sobretudo das picadas de abelha/vespa. Mas vamos por partes: todos nós fazemos algum nível de reação local à picada. Para as reações ditas comuns, o gelo e o anti-histamínico são medidas perfeitamente aceitáveis e controlam grande parte dos sintomas iniciais. No entanto, alguns de nós fazemos uma reação inflamatória intensa no local da picada, com a velha e vulgar “baba” gigante (>10 cm), com duração superior a 48h. Para estes casos, o anti-histamínico e o gelo podem não ser suficientes e claro que se motiva uma visita ao médico. Aqui pode ser importante fazer antibiótico (caso não se perceba se há infeção subjacente ou não) e corticoides tópicos, eventualmente sistémicos de curta duração.
Outra coisa completamente distinta é quando, face à picada de um inseto, se desenvolve uma resposta sistémica grave de alergia, também conhecida por anafilaxia. Tem habitualmente um início súbito, cerca de 15 a 20 minutos depois da picada. Embora esta situação seja bastante rara, é bastante grave e implica medidas urgentes de estabilização da criança (ou adulto). Então, em caso de dificuldade respiratória súbita, náuseas, vómitos ou dor abdominal súbita após a picada, palidez cutânea com palpitações ou manchas vermelhas disseminadas pela superfície cutânea, não hesite em contactar os serviços de emergência.
Medidas de prevenção
Claro que uma das medidas mais óbvias é limitar a exposição, no entanto, em pleno verão, é difícil vestir os miúdos com camisas e camisolas de mangas compridas e calças. Assim sendo, há algum espaço para o uso de repelentes. Há alguns dispositivos de utilização dentro de casa para reduzir o risco de exposição nocturna. São muito vantajosos, no entanto, com uma ação limitada ao interior da casa.
Assim, vamos falar um pouco sobre 3 repelentes com uso pediátrico devidamente testado, seguro e recomendado. Os nomes que constam da lista seguinte são os princípios ativos e não os nomes comerciais. Existem à venda inúmeras outras substâncias com a designação de repelentes, mas a sua eficácia não está devidamente confirmada – é o caso de extratos botânicos que incluem o eucalipto. Adicionalmente, o uso de pulseiras repelentes ao invés de uma substância para colocar em toda a superfície cutânea exposta, não está recomendada, por falta de estudos confirmatórios da sua eficácia.
DEET - Pode ser usado a partir dos 2 meses de idade; Abaixo dos 2 anos de idade, a concentração recomendada é de 10%; Entre os 2 e os 12 anos de idade, recomendam-se concentrações de DEET 20%. Atenção que o uso concomitante de DEET e protetor solar, faz reduzir a eficácia da proteção. É fundamental, nestes casos, optar por proteção solar mineral.
Icaridina KBR3023 (10 a 20%) - Pode ser usada a partir dos 6 meses de idade; especialmente recomendado para crianças de pele mais sensível.
EBAAP IR 3535 (10 a 20%) - Pode ser usado a partir dos 6 meses de idade.
Existem diferentes marcas e formulações: em loção, em stick ou em spray. No entanto, quanto mais pequenina a criança, menos aconselhada será a aplicação em spray (pelo risco de aerossolização e contacto com as mucosas dos olhos e da boca). Os repelentes devem ser aplicados na mão do adulto e só depois na pele da criança.
Temos que ser cuidadosos para não aplicar nos olhos/mãos (as crianças estão sempre a mexer na cara) e nunca aplicar em feridas pré-existentes. Recomenda-se que a criança tome banho, para remover o repelente, sempre que sair do local de risco.
Os repelentes têm uma duração de ação muito variável, mas é consensual a sua reposição a cada 4 a 6 horas (nada como confirmar pelas recomendações de cada produto).
Tendo em conta que os insetos são muito mais numerosos do que os seres humanos no nosso planeta, vão continuar a ocorrer encontros imediatos em terceiro grau e com risco aleatório de picadas. Assim sendo, nada como desdramatizar e ter à mão os truques mais comuns de controlo de sintomas.
Um artigo da médica Joana Martins, pediatra na Unidade de Cuidados Intensivos de Pediatria no Hospital D. Estefânia, Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central.
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