"No Paraguai, todos os dias duas meninas com idades entre os 10 e os 14 anos dão à luz. Estes casos resultam de abuso sexual e, na maioria das situações, de abuso sexual repetido pelo qual as vítimas não receberam a devida proteção", afirmou à AFP Andrea Cid, da Unicef.

A oficial da agência das Nações Unidas questionou o nível de recursos destinados à educação no Paraguai, um dos fatores que aumentam a vulnerabilidade das meninas.

"Enquanto outros países da região investem 7% e 8% do seu orçamento em educação, no Paraguai esse número não ultrapassa os 4%. É uma sequela da vulnerabilidade das crianças que estão em perigo constante", lamentou.

A menina de 10 anos, grávida após violação, está atualmente sob a proteção do hospital da Cruz Vermelha em Assunção e sob a supervisão de médicos, psicólogos e psiquiatras.

O padrasto, Gilberto Zarate Benitez, 42 anos, presumível agressor, foi declarado foragido pela justiça daquele país e a mãe está detida por alegada cumplicidade nos crimes.

A situação de abandono familiar tem gerado um intenso debate na sociedade paraguaia entre os partidários do aborto "por violação" e os contrários à interrupção da gravidez - num país cuja Constituição proíbe o procedimento, salvo em casos de risco de vida para a mãe.

O ministro da Saúde, Antonio Barrios, manifestou-se contra o aborto, primeiro pela proibição estabelecida pela Constituição e porque, na sua opinião, o procedimento seria "tecnicamente contraproducente, já que a gestação já ultrapassou as 23 semanas".

A oficial da Unicef disse que o caso da menina grávida é o primeiro em muito tempo a levantar o debate sobre o aborto num país onde a descriminalização da interrupção voluntária da gravidez é apenas um vislumbre de políticos de esquerda, profissionais e feministas.

A especialista revelou que cerca de 650 meninas com idades entre 10 e 14 deram à luz em 2014 e outras 20.000 jovens com idades entre 15 e 19 anos enfrentaram gravidezes no mesmo período.

Pelo episódio da menina grávida, o escritório local da Anistia Internacional lançou a campanha "#NiñaEnPeligro" ("#MeninaEmPerigo", em tradução livre) para advertir que não se pode forçar a criança a levar uma gravidez que não desejou adiante.