Mergulhar no século XIX numa tentativa de encontrar respostas para os problemas do teatro no século XXI é um dos propósitos do último livro da teatróloga Eugénia Vasques, que chegou há poucos dias ao mercado. “A escola de teatro do Conservatório (1839-1901) Contributo para uma História do Conservatório de Lisboa”, assim se chama a nova obra da professora e crítica de teatro que a própria define, “em termos exploratórios, como uma panorâmica da vida daquela escola que, neste primeiro volume, se baliza, metodologicamente em dois acontecimentos charneira: o falhado Plano da Reforma Geral dos Estudos, de 1834, redigido por Almeida Garrett, e o plano de reorganização do Conservatório Real de Lisboa e da sua Escola de Teatro de 1901”. Integrado no projeto “História da Escola de Teatro do Conservatório”, do Centro de Investigação em Artes e Comunicação (CIAC)/Universidade do Algarve e Escola Superior de teatro e Cinema, trata-se de um volume que Eugénia Vasques pretende prosseguir noutro, a publicar no próximo ano, sobre o período 1901-1971, disse a crítica à agência Lusa. O próximo volume irá até 1971 por ter sido uma data que ficou marcada pelo fim do “consulado de Ivo Cruz [reitor do Conservatório de 1938 a 1971] e pela emergência do Plano de Reforma do Ensino, coordenado por Maria Madalena Perdigão, a pedido do então ministro da Educação José da Veiga Simão”, esclareceu a autora. Nesta segunda obra, a editar também pela Gradiva, Eugénia Vasques irá mostrar como a história do ensino das artes em Portugal no século XX, pelo menos até 1971, se fez pela “ação subtil da maçonaria e dos monárquicos”. Os dois volumes da história do Conservatório abarcam, segundo as contas da autora, “cerca de 110 anos de um percurso pedagógico carregado de vicissitudes e interrupções, que se estende por cerca de 40 anos intermitentes no decurso do século XIX – já que a instituição só funcionará, mas sem continuidade, entre 1839-1848, 1861-1885 e 1885-1892, e por cerca de 70 anos no decurso do século XX”. Eugénia Vasques insiste, porém, que estes trabalhos de “respiga” – como o foi a anterior obra “Mulheres que escreveram teatro no século XX em Portugal” – fazem parte do trabalho académico que tem vindo a desenvolver com o objetivo de encontrar respostas para problemas do teatro na atualidade. “Os problemas do teatro no século XXI continuam a ser quase os mesmos do início, e como foi no século XIX que começou a escola de teatro, o ensino formal, é aí que devo encontrar respostas para as minhas questões”, argumentou. “O amadorismo permanente, a falta de convicção de que a técnica é uma necessidade e a falta de um sentimento de corpo coletivo no seio do teatro são problemas que existiam no início do ensino formal e se mantêm até hoje”, acrescentou. Eugénia Vasques, no entanto, não procura fazer uma história do teatro em Portugal, entendendo estas obras como “'trabalho de sapa' e contributos para que outros possam vir a fazê-la”. A autora pretende ainda mostrar que, “tal como no início, a escola de teatro do Conservatório continua em risco de desaparecer. Como acontece com outras escolas dão-lhe a seguinte ordem: se querem sobreviver, aumentem o número de alunos e diminuam o de funcionários”. “Ora, as escolas artísticas vivem um momento de terror que avassalou o mundo ocidental, porque são escolas que não rendem”, frisou Eugénia Vasques. "O teatro é um lugar onde as sociedades se retratam. Mas ainda que fique menos caro do que os estádios de futebol, não tem os mesmos espetadores de um jogo. Daí que seja um ensino não prioritário. E se não é prioritário é facilmente descartável”, alertou Eugénia Vasques, sublinhando que uma inversão desta tendência depende apenas de “vontade política”. “Só uma educação que não olhe para os tostões e corte o supérfluo pode melhorar o ensino em Portugal, mas é necessário uma equipa que vá para o terreno e estude as necessidades dos portugueses”, observou. "A educação e cultura nunca serviram para dar dinheiro", mas sim "para criar uma identidade”, concluiu a investigadora. Foto: Dr
7 de fevereiro de 2012