A ditadura das horas certas e recomendadas para dormir está a irritar uma das maiores especialistas do mundo em cronobiologia infantil, Claire Leconte. Esta perita em ritmos biológicos e professora de psicologia educacional pergunta-se: se nem todas as crianças têm a mesma sensibilidade ao frio, as mesmas preferências na comida ou as mesmas características de personalidade, porque é que todas devem dormir um certo número de horas e ir para a cama naquele horário quase religioso? Para Claire Leconte, que desaconselha o uso de luzes de presença por enganarem o ritmo natural, o sono é um “problema de saúde pública”.

A especialista sublinha que, na maior parte dos casos, os miúdos não dormem o suficiente durante os períodos escolares nem descansam o que deviam. “Ouvimos por todo o lado: ‘coma cinco peças de fruta por dia’, mas nunca ‘durma bem e regularmente’”, protesta Leconte.

A investigadora defende uma semana de escola de seis dias, com manhãs mais longas, porque essa é a hora do dia em que as crianças estão mais disponíveis para aprender.

Em entrevista ao jornal Nouvelle Observateur, Claire Leconte tenta desmistificar algumas situações e ajudar a resolver outras.

Todas as crianças têm as mesmas necessidades de sono?

Não. O ritmo biológico da criança é genético e revela-se a par do ritmo cardíaco. Logo após o nascimento, apresenta uma primeira fase polifásica, durante a qual o bebé acorda de três em três ou de quatro em quatro horas. Semanas, ou meses mais tarde, passa para o ciclo circadiano, de 24 horas.

Ao fim de um ou dois anos, surgem três tipologias diferentes: o pequeno, o médio e o grande “dormidor”. Esse perfil persiste ao longo da vida.

Como saber se uma criança é pequena, média ou grande “dormidora”?

Quando tem entre 1 e 3 anos, o pequeno dorminhoco precisa de 11 a 12 horas de sono; o grande de 14 a 15 horas e o médio cerca de 13. O pequeno dorminhoco pode ser facilmente identificado. É uma criança que irá naturalmente reduzir o tempo de sono diurno, sendo capaz de passar sem ele muito rapidamente. Essa criança dorme bem, é geralmente feliz, bem-humorada e come bem. É preciso ter cuidado para não confundir o pequeno dorminhoco com uma criança com dificuldade em ir para a cama, muitas vezes por questões de ansiedade.

As crianças precisam ou não de fazer a sesta?

Precisam. E o erro das escolas é não respeitar essa diversidade. Aqueles que precisam de fazer uma sesta imediatamente após o almoço, devem poder fazê-lo e os que não querem, não devem ser forçados a isso.

Forçar uma criança a dormir é tão prejudicial quanto acordá-la a meio do sono. É provável que isso fomente uma fobia ao sono ou provoque insónia, e a qualidade de sono também pode ser afetada. Visitei muitas escolas e vi muitas crianças a serem repreendidas por não adormecerem. Elas não têm culpa – é necessário dar-lhes outra ocupação. Por outro lado, os grandes dorminhocos, que são privados da sesta, devem ocupar-se do menor número de tarefas possível depois do almoço. Isso provoca-lhes uma fadiga adicional e cumulativa.

É possível influenciar o ritmo natural da criança, alterá-lo?

O ambiente externo pode ajudá-la a encontrar o seu ritmo natural de forma mais rápida, mas isso não afetará a sua natureza, que foi determinada biologicamente. A melhor maneira de ajudar um bebé a encontrar o seu ritmo é praticar uma rotina: dar um passeio pela manhã para aproveitar a luz do dia e, assim, promover a secreção de melatonina – a chamada hormona do sono; promover um momento de brincadeira e um banho ao final do dia para ajudá-lo a relaxar. Os pais também podem criar um cenário de escuridão completa durante a noite, mas não aplicar a mesma receita no sono da tarde para que a criança aprenda os conceitos de dia e noite.

Como os adultos, as crianças também podem ser mais matinais ou notívagas?

Não. Essa tipologia desenvolve-se na adolescência, com o aparecimento de certas hormonas. Mas antes da puberdade, muitas crianças são mais matinais.

As crianças herdam o ritmo de sono dos pais?

Os ritmos biológicos são programados geneticamente, mas não necessariamente hereditários. Os pais menos afortunados são os que têm sono pesado e filhos pequenos, o que os obriga a estar a pé de manhã mesmo quando se deitaram tarde. Nesses casos, vejo que algumas crianças aprendem a ficar calmamente no seu quarto, mesmo que acordadas, à espera que os pais acordem. Não tem mal nenhum: assim desenvolvem a imaginação e são mais sonhadores do que os que estão em constante atividade.

Devemos deixar os nossos filhos dormir livremente aos fins de semana e durante as férias?

Não, não é um sono de qualidade. Pode até ser uma fonte de dores de cabeça ou fadiga acrescida. Quando o relógio biológico da criança soa, é melhor levantar-se logo. E isso também se aplica ao adulto. Se há mesmo falta de sono, uma sesta é mais retemperadora do que uma manhã forçada na cama.

Existe um momento ideal para fazer uma sesta?

Entre 12h30 e as14h30. Este horário não tem nada a ver com a digestão, mas com o ritmo circadiano

Miúdos esquisitos com a comida podem ser intolerantes

Milhões de crianças rotuladas como “esquisitinhas” podem, afinal, ter alguma intolerância alimentar à comida que rejeitam. A conclusão é de

Gill Hart, bioquímica numa empresa de testes de intolerância alimentar, que afirmou ao Daily Mail que “os pais não devem presumir automaticamente que os filhos são esquisitos quando se negam a comer alguns alimentos”.

Gill defende que esta rejeição pode ser a forma de a criança expressar essa intolerância, sobretudo quando ainda não consegue explicar-se verbalmente.

Cerca de uma em cada cinco crianças é classificada como esquisita, por se recusar a experimentar alimentos considerados saudáveis, como vegetais e frutas. Hart diz que é importante que os pais percebam que esse comportamento pode, por vezes, ser uma reação biológica a intolerâncias alimentares não diagnosticadas.

“Uma criança pode perder o apetite porque não é capaz de explicar aos pais que está com dores de barriga. E se elas e queixar, é difícil para os pais perceberem se isso foi provocado pela comida”. Além disso, prossegue a especialista, “muitas vezes a criança apelida de dores de barriga problemas intestinais”.

As intolerâncias alimentares são diferentes das alergias, que afetam o sistema imunológico e causam reações quase instantâneas.

Por seu turno, as intolerâncias – nomeadamente contra a lactose - podem levar até 72 horas a manifestar-se, tornando muito difícil identificar o alimento causador.

Dados com uma década da Allergy UK estimavam que 45% dos britânicos poderiam ser afetados por pelo menos uma intolerância alimentar.

Os sintomas incluem dor de barriga, inchaço, vento, diarreia, erupções cutâneas e até comichão.

Gill Hart diz que as crianças podem tornar-se avessas à comida devido a uma intolerância alimentar. E explicou que uma vez identificado o alimento problemático, é preciso eliminá-lo de imediato. “Quando isso acontece, a criança 'exigente' pode desenvolver um apetite saudável”.

O site do NHS Choices diz que os pais podem resolver o problema assegurando que a família faça as refeições conjunto, dando pequenas porções de alimentos à criança e estuando o seu comportamento. É ainda aconselhável que não forcem as crianças a comer o que recusam e sejam capazes de a elogiar quando ela pelo menos tenta provar algo

diferente.

Uma nova pesquisa da Universidade de Bristol publicada em Julho passado veio atenuar as preocupações dos pais com este assunto, ao garantir que as crianças “esquisitas” com a comida não têm de se tornar jovens subnutridos ou com excesso de peso. Os investigadores concluíram que a maioria não só evolui bem, como, muitas vezes, é mais saudável do que os pais, que comiam tudo e abundantemente quando eram pequenos.

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