Entrar num mundo repleto de guloseimas, navegar num rio de chocolate, admirar as copas das árvores feitas de algodão doce ou degustar as paredes de uma casa construída em chocolate, ao jeito de Hansel e Gretel, são imagens inesquecíveis dos contos de fantasia.

Um deles já foi levado ao grande ecrã pelo ator Johnny Depp. «Charlie e a Fábrica de Chocolate» conta a história de Willie Wonka, dono de um império de doces que viveu uma dura infância (completamente proibido de comer chocolates) e oferece um passeio único pelo mundo das guloseimas a um punhado de meninos sortudos.

Fora das salas de cinema são inúmeras as crianças que gostariam de protagonizar uma aventura como esta. Sabemos que os doces são a tentação dos mais pequenos, assim como temos a certeza de que se preocupa com o futuro do sorriso dos seus filhos. Por isso, convidámos Débora Bonfante, odontopediatra, para nos guiar na primeira visita ao dentista. Uma viagem, repleta de sustos, bichos papões e outros medos infundados.

Um sólido património

São vários os especialistas que defendem que os cuidados dentários nos primeiros quinze anos de vida determinam a saúde futura do nosso sorriso. Por isso, com o aparecimento do primeiro dente aos seis meses de vida, surgem novas exigências.

Embora a dentição inicial não seja a definitiva (os chamados dentes de leite só marcam presença até aos sete anos de idade), a higiene dentária nunca deve ser descurada. Habituar desde cedo a criança de ter a boca limpa, usando uma compressa húmida para os primeiros dentes e, aos dois anos de idade, ensiná-la a lavá-los com dentífrico são medidas a adotar.

A escolha do material e o acompanhamento das operações são também importantes. De acordo com a American Academy of Pediatric Dentistry, a primeira visita ao dentista deve ocorrer quando surge o primeiro dente.

Nesta altura, como refere Débora Bonfante, a consulta «consiste principalmente em estabelecer com os pais um conceito educativo/preventivo. Quanto mais cedo perceberem a importância dos hábitos de higiene e forem motivados para isso, maior será a eficácia na prevenção e manutenção da saúde bucal da criança».

O dito e o não dito

A palavra dentista, a imagem da cadeira ou o som emitido pelos aparelhos são suficientes para dar calafrios a qualquer um.

Como será então possível convencer os mais pequenos a submeter-se a tamanha tortura? A chave está nos próprios pais.

Na opinião de Débora Bonfante, eles «são o modelo natural para o comportamento da criança».

 

«É sabido que crianças com múltiplos medos têm mães que igualmente relatam medos. Comentários como "Se doer diz" são completamente desnecessários», acrescenta.

As ideias negativas, a ansiedade e o nervoso miudinho transmitido, ainda que involuntariamente, pelos mais velhos podem assustar a criança. Este temor pode ter várias causas. Por um lado, existe o medo objetivo com base numa experiência dolorosa vivida numa consulta anterior.

Por outro, o chamado medo subjetivo, ou seja, aquele que tem como fundamento relatos ou comentários negativos de outras pessoas. Para que a visita ao dentista não se torne uma experiência digna das piores recordações, é aconselhável seguir as regras de etiqueta. «Os pais devem adotar uma postura positiva e de confiança. Palavras como dor, medo, pica ou agulha deverão ser evitadas», alerta a especialista.

A primeira vez

Escolher um especialista vocacionado no tratamento de crianças e preparar o seu filho para o primeiro encontro é essencial. A opção pode recair entre um médico dentista com experiência com crianças ou um odontopediatra, cuja formação é especializada no atendimento infantil.

Antes da consulta convém preparar a criança para o que se irá passar. Omitir o destino do passeio pode ter um efeito inesperado quando esta se depara com a bata do médico. «Não podemos subestimar a inteligência das crianças. Elas não gostam de ser enganadas» defende Débora Bonfante, salientando que os pais devem «agir com naturalidade, como se tratasse de uma consulta de rotina ao pediatra, e apenas acrescentar que o odontopediatra é um médico simpático que vai ensiná-la a manter os dentes saudáveis e bonitos.»

Uma vez no local, cabe ao médico explicar tudo, com uma «mensagem clara e terna, adequada à idade do paciente. Ouvimos as dúvidas e respondemos de maneira a reforçar a confiança», diz a odontopediatra. Assistir à consulta é permitido mas depende de cada caso.

«Nos bebés é fundamental a presença da mãe e nos mais pequenos também pode ajudar pois transmite segurança. Nos maiores já se pode tornar um incómodo, porque distrai a criança com perguntas e o dentista
vê-se obrigado a dividir a atenção com a família», afirma.

Sorrisos estratégicos

Os mitos sobre a ida ao dentista são muitos e inúmeras são também as técnicas que os odontopediatras têm para contornar a situação. Adotar uma linguagem positiva e à medida do paciente, em que a radiografia ganha o pseudónimo de fotografia, distraí-la com uma conversa ou explicar cada passo mostrando os aparelhos e exemplificando, ajudam a criança a familiarizar-se com o ambiente.

Embora vários consultórios disponham já de brinquedos para cativar os visitantes, este não é o fator mais relevante. O local deve ser agradável mas o que determina o êxito da primeira visita é a abordagem do médico, como explica Débora Bonfante.

«Nós usamos diferentes estratégias consoante a idade. Nos mais pequenos podemos utilizar jogos, fantasia. Costumo dizer que tratei a Branca de neve e por isso ela tem os dentes lindos. E, em casos mais difíceis posso pedir à criança para me ajudar no tratamento do irmão mais velho que se porta de maneira apropriada. Assim compreende o que esperamos dela quando estiver na mesma situação.»

De regresso a casa, já sabe. Dê o exemplo, siga à risca as regras de higiene bucal e, claro está, mantenha os doces à distância. O resultado ficará à vista... no sorriso do seu filho!

Texto: Manuela Vasconcelos