Por que idealizou uma digressão especial para Portugal?
Todas as vezes que venho sou tão bem recebido, que acho que o público merece concertos exclusivos. Os portugueses adoram quando canto os fados e as marchas à minha maneira, com ritmo de samba lento. Eles gostam de dançar com as minhas músicas.
O seu produtor contou que, em Portugal, é só o Martinho pôr o pé na rua, que há sempre alguém que o reconhece...
É verdade. É como no Brasil: ando pelas ruas e as pessoas sabem quem sou. O que gosto mais é quando vejo um português com aquele ar sério abrir um grande sorriso e pedir-me um autógrafo ou dizer que é fã do meu trabalho.
Tem 70 anos de idade e 40 anos de carreira. Qual é o segredo dessa longevidade profissional?
É um mistério que nem eu entendo (risos). O sucesso não tem fórmula.
É cantor, compositor, escritor, actor, líder de movimentos negros. Consegue fazer bem tanta coisa?
Faço as coisas devagarinho, sem pressas (risos). Estou sempre com o meu portátil, porque sempre que surge alguma ideia, escrevo.
Tem oito livros lançados. Eles fazem sucesso?
Não tenho nenhum best-seller. Nunca pensei ser um grande escritor. Escrevo como exercício da minha criatividade. Há muitos escritores que têm 30 livros lançados e ainda assim não são conhecidos. Não ligo a isso. Acabei de fazer outras duas obras.
Pensa em reformar-se?
Tenho muito que fazer. Quando uma pessoa se sente realizada, já pode morrer. Eu ainda não atingi essa meta (risos). Já pensei que como cantor deveria parar, mas de repente tenho ideia para mais uma música e lá começo tudo de novo.
O que faz como líder de movimentos negros?
Luto pela igualdade e pela inclusão social. No Brasil, há quotas para os negros entrarem nas universidades públicas. Acho que deveria haver quotas nas empresas e até governo. No governo Lula, foi a primeira vez que tivemos um ministro negro, que é o Gilberto Gil.
Seria candidato a presidente?
Nem pensar! Não quero misturar-me com política (risos).
Assumiria um cargo no governo, como fez Gilberto Gil?
Já fui sondado, mas eu não quero. É uma função que não me atrai, nem encanta.
Gosta de ver um cantor como ministro da Cultura do Brasil?
Acho óptimo. Os artistas são muito organizados.
Nasceu num sábado de Carnaval. Acredita que o seu destino era mesmo ser sambista?
Não gosto de acreditar nisso, mas só pode ser! Nasci numa cidadezinha no interior do Rio de Janeiro, filho de agricultores pobres. Cresci numa favela do Rio. Que futuro se poderia esperar para mim? Podia ter sido traficante ou um simples trabalhador, mas o destino fez-me artista. Agora estou aqui, a viajar pelo mundo, a ganhar a vida com arte. Só pode ser obra do destino...
O Carnaval do Rio deste ano ficou manchado com notícias de que as escolas de samba eram financiadas pelo tráfico de drogas. O que acha disso?
O tráfico está em todos os sectores, até na política. No Brasil está tudo misturado, é uma confusão só! Não se pode considerar o caso das escolas de samba isoladamente.
Vai ter um documentário sobre a sua vida...
É verdade e as últimas cenas vão ser gravadas nas próximas semanas em Portugal.
Do que sente saudades de Portugal?
Dos vinhos, que são óptimos. E da comida, que é uma delícia.