Rainhas, imperatrizes e atrizes, reis, sultões e conquistadores, profetas, artistas, cortesãs, psicopatas e exploradores. As suas vidas fizeram-se de dramas surpreendentes, de coragem e aventura, de libertinagem e matança, de virtude e crime, de heroísmo e traição.
Atravessando mais de três mil anos de história, Titãs da História (Planeta dos Livros) começa com Ramsés II, um dos maiores imperadores do Egito, e chega até aos nossos dias, com figuras como Saddam Hussein e Osama Bin Laden. Pelo meio, Sebag Montefiore, autor deste título, convida-nos a descobrir mais, sobre personalidades extraordinárias e intrigantes como Buda, Genghis Khan, Nero, Winston Churchill; Catarina, a Grande, Anne Frank, Martin Luther King; Mozart, Mao, Jesus Cristo, Shakespeare, Einstein, Elvis Presley, entre outros. Através das suas extraordinárias vidas, o historiador reconta os eventos mundiais mais importantes, desde os tempos antigos até às Cruzadas, passando pelo Holocausto e pela Guerra do Golfo.
De Titãs da História publicamos o presente excerto.
Vlad, o Empalador
1431-1476
O seu estilo de vida era tão diabólico como o seu nome.
Manuscrito russo do final do século XV
Vlad III, hospodar (príncipe) da Valáquia, afirmou que estava a salvar o seu povo cristão dos otomanos muçulmanos, mas mostrou-se mais interessado em exercer o seu poder pessoal através das intrigas traiçoeiras da política dinástica e imperial local. Foi um sádico degenerado e homicida de uma tal crueldade que inspirou a lenda de Drácula. No entanto, a história de Drácula é inofensiva quando comparada com a realidade. Ao assassinar dezenas de milhares de pessoas, desde camponeses e vagabundos aleijados até nobres e embaixadores estrangeiros, tornou-se conhecido por Príncipe Empalador: o seu método preferido de execução era empalar as vítimas em estacas de madeira afiadas, que eram oleadas e inseridas nos intestinos. Vlad deve ter nascido numa fortaleza, na cidadela de Sighisoara, na Transilvânia (parte da atual Roménia), em 1431. O apelido da família era Dracul, que significa dragão, herdado do pai, que tinha sido membro da Ordem do Dragão – para a qual Vlad também entrou quando tinha cinco anos –, uma organização secreta criada pelo imperador do Sacro Império Romano para defender a cristandade e resistir às incursões dos muçulmanos otomanos na Europa. A mãe era uma princesa moldava e o pai, Vlad II, um antigo príncipe da Valáquia exilado na Transilvânia.
Em 1444, quando Vlad era criança, o pai, ao ser ameaçado de um ataque por parte do sultão otomano, foi obrigado a garantir obediência aos turcos e a entregar dois dos filhos, entre os quais Vlad, à guarda dos otomanos. A experiência, que durou quatro anos, ao longo dos quais foi espancado e açoitado devido à sua insolência e caráter impetuoso, levou-o a odiar os turcos.
A Valáquia (também na atual Roménia) não era uma monarquia hereditária tradicional e, embora Vlad tivesse direito a reclamar o trono, o exílio do pai deixou-o numa situação difícil. O irmão mais velho, Mircea II, reinou por pouco tempo em 1442 e acabou por ser obrigado a esconder-se no ano seguinte, mas foi capturado pelos inimigos em 1447 e estes queimaram-lhe os olhos e enterraram-no vivo. A política da Valáquia era traiçoeira e brutal: mais tarde, o irmão mais novo de Vlad, Radu, o Belo, pediu ajuda ao sultão otomano Mehmed II para o destronar.
Em 1447, no mesmo ano em que Mircea foi morto, os boiardos (famílias da nobreza local), leais a João Corvino, o Cavaleiro Branco, da Hungria, também capturaram e mataram o pai de Vlad, alegando que era muito dependente dos otomanos. Estes invadiram a região pouco depois para consolidar o seu controlo e, em 1448, instalaram Vlad no trono, então apenas com dezassete anos, para ser um príncipe fantoche, só para que Corvino voltasse a intervir e o obrigasse a fugir para a Moldávia. No entanto, Vlad tomou a decisão corajosa de viajar para a Hungria, com a qual a Valáquia já travara repetidas guerras. Impressionou João Corvino com as suas credenciais antiotomanas e acabou por se tornar o candidato preferido da Hungria ao trono valáquio.
Em 1456, quando os húngaros atacaram os otomanos na Sérvia, Vlad aproveitou a oportunidade para invadir e controlar a Valáquia depois de matar o seu rival Vladislav II, que pertencia ao clã Danesti, e de recuperar o trono para os Draculs. No domingo de Páscoa, convidou os chefes boiardos para um banquete: matou os mais velhos e escravizou aqueles que ainda eram suficientemente novos para trabalhar. Muitos morreram nas obras das novas fortificações dos castelos de Vlad em condições tão severas que as suas roupas finas se esfarrapavam e os deixavam nus.
Ao estabelecer a sua capital em Targoviste, Vlad estava determinado a fazer da Valáquia um grande reino, com uma população próspera e saudável. Contudo, para ele isso significava erradicar a nobreza e também todos aqueles que pudessem escoar os recursos do país. Entre os seus alvos contaram-se os mais pobres e vulneráveis – vagabundos, deficientes e doentes mentais; convidou milhares deles para festins em Targoviste só para os fechar na sala e os queimar vivos depois de comerem. (Era perigoso aceitar um convite de Vlad, mas ainda era mais perigoso recusá-lo.) Vlad também perseguiu as mulheres acusadas de atos imorais como o adultério: mandava cortar-lhes o peito, depois eram esfoladas ou queimadas vivas com água a ferver e os corpos expostos ao público. Os mercadores alemães que viviam na Transilvânia, que ele considerava parasitas estrangeiros, também foram alvo da sua ira. No dia de São Bartolomeu de 1459 ordenou a execução de 30 000 mercadores e boiardos da cidade de Brasov; no ano seguinte foram mais 10 000 em Sibiu.
De um modo geral, as vítimas eram empaladas. A morte era excruciante e podia demorar horas, à medida que a estaca abria caminho pelos intestinos até sair pela boca. Executava milhares ao mesmo tempo, dispondo as estacas em círculos concêntricos à volta dos seus castelos, e proibia que as vítimas fossem retiradas, chegando muitas vezes a jantar na presença da carne em putrefação. Quanto mais elevada fosse a categoria de uma pessoa, mais comprida era a estaca que lhe estava reservada. Outros métodos de execução incluíam esfolar ou queimar as vítimas com água a ferver, tendo uma vez cravado pregos nas cabeças de embaixadores estrangeiros que se recusaram a tirar os chapéus na sua corte. A sua sede de sangue era tal que também correu o rumor de que bebia o sangue e se banqueteava com a carne das vítimas.
Durante o inverno de 1461-62, atravessou o Danúbio, saqueou a área controlada pelos otomanos entre a Sérvia e o mar Negro e matou 20 000 pessoas. Quando o sultão Mehmed II reuniu milhares de homens para uma missão de vingança, estes chegaram às margens do Danúbio e viram 20 000 prisioneiros turcos que os exércitos de Vlad tinham empalado e criado uma floresta de corpos em estacas.
Apesar da tentativa ousada de se infiltrar disfarçado no campo inimigo para matar o sultão, Vlad acabou por ser esmagado pela dimensão da ofensiva otomana. Quando os turcos lhe cercaram o castelo em 1462, a mulher atirou-se da janela, Vlad fugiu e os otomanos instalaram no trono o seu irmão mais novo, Radu. Foi capturado pelos húngaros e passou dez anos preso, a sonhar em recuperar o trono enquanto empalava ratos e pássaros em pequenas estacas. Surpreendentemente, conseguiu voltar a contar com o apoio dos húngaros, casou com uma húngara da família real que o ajudou a invadir a Valáquia em 1476 e depôs durante algum tempo o novo governante, Bassarabe III, o Velho, do clã Danesti. No entanto, uma vez mais, nada pôde fazer contra a invasão dos otomanos e foi morto perto de Bucareste, talvez até pelos seus próprios homens. Cortaram-lhe a cabeça e enviaram-na para Constantinopla, onde foi exibida cravada num pau.
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