
Como é que surgiu a tua paixão pelo mundo da moda?
A família do lado da minha mãe é espanhola e sempre ligou muito a moda. Eu lembro-me de chegar a casa e ver a minha avó a ler a Elle e a Vogue, e sempre vi a minha avó e a minha mãe a arranjarem-se imenso. Mais ou menos na altura do COVID-19, como não havia muito para fazer, comecei a ler mais sobre isso, a explorar mais as opções que tinha no meu armário e a cruzar com coisas da minha mãe, e [o meu interesse] surgiu a partir daí. Quando a quarentena acabou, comecei a postar mais looks de Instagram e as coisas foram acontecendo.
Mas antes não fazias muito uso dos estampados, das cores e do mix and match que hoje compõem os teus looks?
Não, não fazia tanto, mas eu achava que as pessoas se vestiam todas muito igual e que era tudo muito aborrecido. Não percebia por que é que as pessoas não misturavam cores e não se podia misturar amarelo com azul. Às tantas eu misturava, e gostava de ver. Então comecei a ir um bocado por aí e a fazer um mix and match.
A trend "How to Dress like a portuguese girlie", inicialmente lançada por Vicky Montanari, acabou por se alastrar a um grupo de influenciadoras digitais do qual tu fazes parte. Como é que vocês se conheceram?
Eu e a Vicky conhecemo-nos há dois anos. Começámo-nos a seguir nas redes e, às tantas, combinámos pelo Instagram ir a um brunch no Príncipe Real. Começou como uma amizade virtual e depois começámos a trabalhar juntas, pois ligámo-nos super bem na maneira de trabalhar uma da outra. A partir daí foi sempre a crescer e hoje somos muito amigas.
Eu achava que as pessoas se vestiam todas muito igual e que era tudo muito aborrecido. Não percebia por que é que as pessoas não misturavam cores e não se podia misturar amarelo com azul
Começaste a dedicar-te mais ao Instagram durante o COVID-19, em 2020, mas para ti qual foi momento de viragem na tua carreira como criadora de conteúdos digitais?
Foi com o boom do vídeo das "portuguese girls" no TikTok onde 50% das pessoas diziam que nós parecíamos umas "palhaças" e 50% gostavam. Foi aí que as pessoas também começaram a pesquisar mais sobre nós e foi aí o ponto de viragem. Também tive outro ponto de viragem num vídeo viral que fiz no verão, há dois anos, onde fico muito queimada e onde me chamaram de "Black Queen" e fui acusada de apropriação cultural. Foi uma fase importante na minha vida porque foi a primeira vez que lidei com o "hate". Acho que as pessoas que estão do outro lado do ecrã não têm noção do quanto isso afeta. Afeta-te a ti, mas também as pessoas à tua volta, que veem que ficas triste. Esse foi o primeiro choque onde tive de ter noção de que há pessoas que vão gostar, há pessoas que vão odiar e as pessoas que vão odiar às vezes manifestam-se de uma maneira muito cruel. Esse foi um ponto de viragem porque o "hate" trouxe muitas pessoas, e como [o vídeo] ficou viral, acabou por ser uma coisa boa para mim porque a minha plataforma foi parar aos Estados Unidos. Foi algo que nasceu de uma coisa má, mas também foi bom porque aprendi a lidar com isso. O cyberbullying é uma tema sobre o qual não se fala muito, mas é gravíssimo.

Especialmente com a chegada da Internet e das redes sociais, o bullying tomou uma dimensão gigante...
Sim, porque é super fácil. As pessoas estão do outro lado do ecrã, escrevem o que querem e é estranho não haver punição para isso. É uma coisa muito grave que ainda não vai ser de todo resolvida, mas que precisa de muita atenção porque é como outro bullying qualquer.
Ser "portuguese girl" é poderes brincares e sentires-te bem com aquilo que usas
Para ti, o que é que significa ser uma "portuguese girl"?
Eu acho que é vestires o que tu queres. Para a maior parte das pessoas riscas e bolas não faz match, mas se tu gostas de ver, isso é o importante. Ser "portuguese girl" é poderes brincares e sentires-te bem com aquilo que usas.
Também é uma forma de expressares a tua personalidade e celebrares a tua individualidade...
É isso e a moda transmite muito o teu estado de espírito. Se estás contente vestes-te de uma maneira muito mais animada e colorida, mas se estás mais triste, não tens paciência e vestes a primeira coisa que aparecer.
Que dicas dás a alguém que gosta do teu estilo, mas que tem vergonha em usar estampados chamativos e misturar cores?
Olha eu também tinha muita vergonha.
A sério?
Tinha. Muita. Era mesmo muito envergonhada e oiço muito 'Isto em ti vai ficar ótimo, mas em mim vai ficar péssimo'. Não. Aquilo que acho é que as pessoas não experimentam, então a dica que dou é para as pessoas experimentarem [com os seus looks] e, se de facto gostarem, não se importarem tanto com o que as pessoas dizem. Tu és a personagem principal da tua vida, tudo o resto é secundário. No fim do dia és tu que tens de estar feliz com aquilo que vestes. Eu também era muito tímida, mas com este trabalho tive, automaticamente, de me tornar mais extrovertida. Outra coisa que aprendi foi não ter tanto medo da opinião dos outros, que ainda me afeta, mas já não tanto.

Desde que começaste a arriscar mais com os teus looks, tens notado uma evolução no teu estilo pessoal?
Sim. Sinto no sentido de poder trabalhar com marcas para as quais sempre olhei, que sempre admirei e que, de repente, vêm ter comigo. Sinto que, com o passar do tempo, o teu estilo acaba por se aprimorar um bocadinho. Foi uma junção de muitas coisas.
A dica que eu dou é para as pessoas experimentarem [com os seus looks] e, se de facto gostarem, não se importarem tanto com o que as pessoas dizem. Tu és a personagem principal da tua vida, tudo o resto é secundário
Porque é que achas que as pessoas se identificaram tanto com esta trend, que fez com que se tornasse num fenómeno viral e fosse replicada em todo o mundo?
Acho que há muita gente que gostava [de usar coisas diferentes], mas como 90% das pessoas não se veste assim, as outras ficam intimidadas e acabam por não se vestir assim. Foi por causa disso que muita gente se relacionou com a trend e gostou. A moda não tem de ser "boring" e não é "boring". Tu até te podes vestir toda de preto e teres grande look. Tem a ver com a atitude. Isto de misturar padrões e cores é uma coisa que está cada vez mais evidenciada porque toda a gente gosta de cor. Se perguntares às pessoas qual é a sua cor preferida raramente dizem branco, preto ou cinzento. Normalmente é uma cor [que não é neutra], então, why not transformares isso para a tua vida?
Olhando para mundo das influencers nos últimos anos, as "portugueses girls" conseguiram captar a atenção de publicações de moda de renome, como Elle, Vogue e Harper's Bazaar, de marcas de luxo internacionais e pôr Portugal a ser falado no mundo inteiro. O que é vocês vieram acrescentar à história da moda?
Talvez uma mudança, um espírito mais jovem.
Falaste numa coisa muito interessante: a parte de arriscar e de as pessoas não terem vergonha de celebrarem a sua essência através da roupa...
Isso é super importante. Eu também era mesmo envergonhada e quando me comecei a vestir assim, eu também arriscava. Chegava aos sítios e as pessoas comentavam 'Que roupa é essa?' e 'O que é que tens vestido?' E eu respondia: 'Eu gosto e sei que isto resulta'. E o que é facto é que resultou. Também foi gratificante, de repente, imensa gente que tu não conheces, começar a dizer que também gostava do teu look, que se identifica e perguntar de onde é que as são as coisas que usas.

Desde o início que sempre demonstraste ser muito consciente nas marcas que comunicavas, apostando em opções de nicho e que não eram tão mainstream. Esse sempre foi um dos teus objetivos?
Sim, foi. Comecei com as marcas portuguesas, e com orgulho, mas as marcas de nicho também são muito importantes porque normalmente são essas marcas que têm coisas especiais, que tu vais usar para sempre. Às vezes o que faz um outfit é um pequeno detalhe que estão nessas marcas mais pensadas.
Neste editorial tiveste a oportunidade de usar cinco looks da coleção ready-to-wear primavera/verão 2025 da Dior. O que mais te fascina nesta maison que é conhecida por ter um ADN mais clássico e diferente do que costumas usar no teu dia a dia?
É a elegância da marca, que consegue ser cool e elegante ao mesmo tempo. É uma marca para qual tu olhas e percebes que é Dior porque tem peças muito emblemáticas. Acho que, automaticamente, quando se junta alguma peça ou algum acessório Dior, o look fica muito mais enaltecido e faz muito mais sentido. Lembro-me da primeira vez quando me ligaram do PR office para trabalhar com a Dior. Estávamos a ir para a fashion week de Copenhaga, estava no avião quando me disseram que precisavam de falar comigo sobre a Dior. Na altura achei que era a Dior Beauty e quando me disseram era Dior Ready-to-Wear eu disse 'Estás a falar a sério?' Quando começas, nunca pensas que vais chegar àquelas marcas que tu queres mesmo chegar. Não percebes que essas marcas te estão a ver, não tens como saber que pessoas te estão a seguir e, de repente, quando percebes que elas te seguem e que querem trabalhar contigo é muito gratificante. Eu achei que era uma marca impossível por ser a Dior e por ser uma marca super reconhecida.
Eu também era muito tímida mas com este trabalho tive, automaticamente, de me tornar mais extrovertida. Outra coisa que aprendi foi não ter tanto medo da opinião dos outros
Atualmente a estética das "portuguese girls" vai muito mais além da moda e da roupa, promovendo todo um estilo de vida e um modo de estar que, desde que tens a tua própria casa, é muito notório através da parte da decorativa. Como tem sido esta aventura pela parte do design e da decoração?
Como este estilo é muito mix and match, há quem adore e quem odeie e quando souberam que ia mudar de casa, a primeira pergunta foi 'Como é que será que ela vai decorar a casa? Será que vai ficar uma grande confusão?' [risos] E foi uma grande preocupação, principalmente para o meu pai, que é super clean, arquiteto e disse 'Eu ajudo-te'. Mas eu disse que não. Tenho noção que a casa é um sítio onde tu estás todos os dias, por isso também não pode ser uma coisa muito cansativa, como um outfit que tu pões e tiras, mas consegui fazer um bom mix entre o que é mais clean, mas com detalhes onde vês que, de facto, que aquilo é a minha casa . Tenho as cadeiras da sala que são verdes, que o meu pai odeia, mas que eu amo, e um sofá encarnado onde, para mim, tudo faz match. Nesse sentido também consigo transparecer um bocado esta essência da "portuguese girl".
Qual é a principal mensagem que tu queres transmitir a todas as pessoas que te acompanham nas redes sociais?
Eu acho que nós, e contra mim falo, passamos a ideia de que está sempre tudo bem, mas claro que não é assim. Também temos dias maus e as coisas também correm mal. As pessoas têm um bocado a ideia de que as nossas vidas são perfeitas, mas nem tudo o que parece é. Nós também somos pessoas, às vezes também estamos frustrados com alguma coisa e esta ideia do mundo de influencer ser perfeito, está longe disso. Dá muito mais trabalho do que as pessoas acham e, quem está de fora, já começa a ter mais consciência disso. No início quando me perguntavam o que é que eu fazia dizia meio baixinho: 'Sou influencer'. Por exemplo, para a geração do meu pai é algo que ainda é meio estranho.

Chegava aos sítios e as pessoas comentavam 'Que roupa é essa?' e 'O que é que tens vestido?'
E qual foi a reação da tua família e os teus amigos quando decidiste que te ias dedicar a 100% à profissão de influencer?
Os meus amigos reagiram bem, porque também estão no meio, mas para os meus pais supostamente ia ser psicóloga. Quando comecei a entrar neste mundo, a minha mãe percebeu. O meu pai foi mais difícil porque como é uma profissão que também é mais recente, ele não levava isso tanto a sério. Achava que era uma fase. Com ele senti que foi mais difícil, apesar de agora ter muito orgulho. As gerações mais velhas ainda não levam esta profissão muito a sério. Só quem está perto de mim e convive comigo é que sabe que isto é um trabalho como outro. No fim do dia tens coisas para entregar, prazos para cumprir, reuniões para fazer...
E em termos criativos é super exaustivo...
Sim, em termos criativos é muito exaustivo porque tens de estar sempre a entregar coisas novas. Se fazes cinco coisas iguais já é boring, ou seja, tens de estar sempre a arranjar estratégias. Às vezes pensas 'Onde é que agora vou encontrar uma coisa diferente, que também cative as pessoas e que não fuja muito do meu estilo?'
No teu dia a dia tens por hábito frequentar sempre sítios "cool" e alternativos que servem de cenário aos teus posts e stories. Com tanta coisa que está sempre a acontecer na capital, como é que estás atenta aos novos lugares que, todas as semanas, abrem em Lisboa?
Como fotografo todas as semanas, tenho de estar sempre à procura de sítios novos porque queres sempre inovar. Como já fotografo há três anos, sinto que já conheço quase tudo em Lisboa, mas ainda me falta muita coisa. Acabamos por estar sempre a explorar cafés novos e sinto que quando os cafés abrem eles também nos escrevem para os irmos visitar, então é mais fácil começar a perceber as novidades da cidade. Também é muito um trabalho de passeio, onde vais olhando e vendo que há coisas super cool que ainda não são muito conhecidas. Também sinto que, de segunda à sexta, as pessoas não têm muito tempo [para explorar a cidade] mas o que é facto é que em Lisboa há exposições super giras, há restaurantes ótimos e tem sítios muito cool.

As pessoas têm um bocado a ideia de que as nossas vidas são perfeitas mas nem tudo o que parece é
No último ano já desenvolveste várias coleções cápsulas com marcas como a Scalpers, Sienna ou ÈME. Como é que tem sido esta experiência criativa no mundo da moda e da beleza?
Estas colaborações são importantes para tu veres se as pessoas gostam só do teu estilo ou se gostam do teu estilo e compravam aquilo que tu usas. E com as coleções que desenvolvi, vi que as pessoas gostam e compravam, então foi mais um incentivo para eu ter a minha marca. O facto de as marcas te darem a oportunidade de desenvolveres uma coleção com elas é muito giro, porque é uma criação onde tens sempre de ir puxar a essência da marca, mas também puxar a essência da Caetana. Dá trabalho, mas é um trabalho muito criativo que, se for bem desenvolvido, consegues os resultados que querias. Na coleção que fiz com a Sienna ver as pessoas a usar a tua roupa e a dizer que gostavam das peças deixou-me super orgulhosa.
Achas que o teu futuro passa mesmo pelas redes sociais?
Sim, passa pelas redes sociais e por alguma coisa relacionada com moda, marcas mais de luxo e de nicho.
No futuro gostavas de ter a tua própria marca?
Sim, gostava muito de ter a minha marca de roupa. Ainda não me lancei nesse desafio porque quero fazê-lo quando sentir que estou bem economicamente e que seja numa uma fase onde faça sentido. Se tiver uma marca, quero que as pessoas olhem para a marca e digam 'Isto são as peças da Caetana' e sinto que isso é muito complicado. Ou seja, ainda não é a altura, mas gostava.

Tendo em conta o teu rápido crescimento nas redes sociais, que dicas dás a quem se está a lançar neste universo altamente competivivo?
A primeira é não te deixares levar muito por trends e manteres-te fiel a ti mesma, e a segunda, é consistência. Neste trabalho tens de ser muito consistente, apresentar coisas novas todos os dias e ter uma abertura especial para também começares a expor a tua vida. Isso era algo que antes não gostava muito de fazer porque sempre fui muito tímida. Então acho que é isso: que sejam consistentes, que se mantenham fiéis a si próprios, mas que também estejam abertos para que as pessoas saibam mais sobre a vossa vida privada, que às vezes não queremos mas faz parte.
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