Mulheres em lugares de chefia? 79% das empresas não considera que sejam uma mais-valia para o negócio. Como avança um estudo internacional, realizado pelo IBM Institute for Business Value em parceria com a Oxford Economics, a promoção da igualdade de género longe das prioridades de muitos homens e os portugueses não são exceção. "A vulnerabilidade ainda é vista como uma coisa negativa", justifica Ângelo Fernandes.
Na entrevista que deu à revista Saber Viver, que pode (re)ler de seguida, o diretor da associação Quebrar o Silêncio, explica o que é necessário fazer para envolver (mais) os homens na luta contra as diferenças que persistem nos dias que correm, logo a partir da infância. "É essencial que se faça uma educação para a cidadania", defende Ângelo Fernandes. "As famílias têm um papel fundamental nesta caminhada", afirma.
Como é que se mudam as mentalidades desde cedo?
Parece-me ser essencial que se faça uma educação para a cidadania e que ela seja assente nos direitos iguais. Recentemente, estive numa escola a falar sobre igualdade de género. Pedimos a um rapaz e uma rapariga que fizessem exatamente a mesma tarefa e, no final, recompensámos mais o rapaz.
Ficaram todos surpreendidos, não houve ninguém naquela turma que considerasse justa ou normal a distinção feita. Acabámos a falar-lhes das diferenças de vencimento, que as mulheres ganham em média menos 7% do que os homens na mesma função e que não têm as mesmas possibilidades de progressão na carreira.
A legislação ainda pode colmatar algumas lacunas ao nível da desigualdade de género? Há quem defenda que a licença de paternidade seja igual à da maternidade...
A verdade é que, se o homem se ausentasse do trabalho na mesma medida que a mulher, as coisas seriam diferentes...
O que podemos fazer ao nível da família, cujos valores replicamos mais ao longo da vida?
As famílias têm um papel fundamental nesta caminhada e devem falar mais nestes assuntos à mesa. Hoje, os temas chegam às crianças pela internet ou pela escola. Adiar estas conversas ou torná-las tabu só faz com que as crianças fiquem mais confusas. O papel da família não é só transmitir crenças, mas informar também.
Como é que se promove uma paternidade cuidadora junto de pessoas cujas referências sejam de masculinidades hegemónicas?
Quando os homens são pais, muitos mudam os seus hábitos. Deixam de fumar, de beber tanto, começam a fazer desporto e a ter uma alimentação mais saudável. Eles apercebem-se que não seriam o melhor exemplo para os seus filhos. Mas, sim, está na altura de termos esta conversa. Os pais querem estar mais envolvidos na vida dos seus filhos, sem que isso seja visto como uma limitação.
Quando não se inscrevem numa masculinidade tradicional, os homens ainda são alvos de críticas por parte dos seus pares e de mulheres, não são?
Não é só uma questão de crítica, mas também de discriminação e até de violência. Ainda há pouco tempo, numa escola, um rapaz de 17 anos me disse que não podia chorar. Se chorasse, seria alvo de troça pelos colegas e o pai iria bater-lhe. Convém perceber por que é que esta realidade social existe.
Muitos homens só procuram ajuda médica ou psicológica no limite e, frequentemente, não conseguem verbalizar os sintomas...
Os homens devem procurar apoio se sentirem que é necessário, sem que isso possa representar um ataque à sua masculinidade. A vulnerabilidade ainda é vista como uma coisa negativa mas nós não conseguimos ser fortes a toda a hora e não somos menos homens se procurarmos apoio.
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