Apesar de estarmos em 2021, continuamos a escrever repetidamente que os números da empregabilidade no autismo são dramáticos. Não sabemos da verdadeira realidade em Portugal, mas os números do Reino Unido dizem-nos que apenas 22% das pessoas autistas adultas estão integradas em algum tipo de emprego.
Apesar de todos os esforços que têm sido feitos por várias empresas e organizações para promover a contração de pessoas autistas, o certo é que os números continuam aquém do desejado. E ainda que desde o início deste ano em Portugal esteja em vigor a Lei 4/2019 que estabelece o sistema de quotas de emprego para pessoas com deficiência, com um grau de incapacidade igual ou superior a 60%.
Sabemos que esse diploma deixa de fora muitas pessoas autistas. Nomeadamente, aqueles que apresentam um diagnóstico de Perturbação do Espectro do Autismo nível 1 e que de acordo com a avaliação realizada não se inscrevem dentro desta percentagem de incapacidade.
Não deixando, contudo, de ter todo um conjunto de dificuldades, sobretudo aquelas colocadas pelo desconhecimento e estigma face a esta condição.
Mas antes de chegar às empresas, as pessoas autistas necessitam de passar por um processo de recrutamento e selecção. E o recrutamento inclusivo ainda tarde em estar implementado de uma forma abrangente junto das empresas de recrutamento e selecção, bem como nos departamentos de Recursos Humanos internos das empresas que fazem o seu próprio processo de recrutamento.
E como tal, todo um conjunto de características presentes numa pessoa autistas no momento da entrevista é na maioria das vezes observado como não adequado à oferta a que se candidata. E para aqueles que se perguntam o que acontece às pessoas autistas que dizem que o são no processo de recrutamento, grande parte das situações ainda continuam a ter um desfecho negativo para estes.
E mais uma vez porque as empresas e as pessoas responsáveis neste processo continuam em muito a desconhecer aquilo que é o autismo. Ou então parecem apenas ficar focados nos aspectos que podem trazer maiores dificuldades e não naqueles que representam as competências das pessoas e que podem ser vistas como potenciais mais-valia.
Também é preciso perceber a importância que o Ensino Superior tem para as pessoas autistas, assim como as oportunidades que este lhes pode providenciar. Há cada vez mais um maior número de pessoas autistas a ingressarem no Ensino Superior, ainda que continuem a não ser devidamente orientados durante o seu processo de formação. Além de que é importante estabelecer pontes entre a Universidade e as Empresas, tal como já se faz para os alunos não autistas.
E quanto às adaptações necessárias de continuar a fazer nas empresas, sublinho que estas não se devem esgotar no facto de permitirem a utilização de fones para a redução do ruido, por exemplo.
Será importante que as necessidades de adaptação a realizar possam acomodar as necessidades das pessoas autistas. Mas que sejam vistas como fazendo parte das necessidades de outros trabalhadores não autistas. E com isso poder melhorar o funcionamento da própria empresa e da qualidade de vida de todos os trabalhadores.
Para as empresas mais receosas na contratação de pessoas autistas. Seja porque pensam que irão ter de investir muito dinheiro no processo e que não irão ter benefícios. Chamo a atenção para os resultados obtidos por todo um conjunto de várias empresas a nível mundial e que têm abraçado este paradigma da neurodiversidade.
Não somente tem havido benefícios no próprio processo produtivo, até porque as pessoas autistas se apresentam como tendo um conjunto de mais valias, sendo necessário a sua óbvia selecção e adaptação. Mas também porque os restantes trabalhadores não autistas sentem fazer parte de uma Organização que respeita os valores humanistas.
Texto: Pedro Rodrigues (Psicólogo clínico) PIN – pedro.rodrigues@pin.com.pt
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