O assédio sexual pode traduzir-se em comportamentos de carácter sexual, não solicitados e não aceitáveis, favores sexuais ou contactos verbais ou físicos potenciadores de um ambiente ofensivo e hostil. Neste tipo de condutas enquadram-se, a título exemplificativo, as piadas e/ou comentários sobre a aparência ou condição social, o enviar fotos, imagens da internet indesejadas e de teor sexual, os contactos físicos intencionais e não solicitados ou excessivos e as abordagens físicas desnecessárias, os convites e pedidos de favores sexuais associados a promessa de obtenção de emprego ou melhoria de condições de trabalho ou de ascensão na carreira profissional.
O assédio sexual é um grave problema social que, para além de violar direitos fundamentais, é um comportamento que produz elevados danos na vítima, designadamente psíquicos, económicos e sociais.
Trata-se de mais uma das formas de violência de género, porque afeta sobretudo as mulheres, e que reveste em si mesma contornos insidiosos, seja no espaço público seja nos locais de trabalho onde se assiste a uma quase total impunidade para os agressores e falta de proteção para as vítimas.
De acordo com a Organização Internacional do Trabalho, o assédio sexual está intrinsecamente ligado com o poder e, na maioria das vezes, acontece em sociedades patriarcais em que assistimos a um domínio do homem sobre a mulher e, por isso, as vítimas de assédio sentem-se ameaçadas, envergonhadas e naturalmente intimidadas.
A ausência de condenações em Portugal têm demonstrado uma desvalorização da violência sexual e do impacto que esta tem na vida das vítimas.
O mesmo sucede quando, numa tentativa de se justificar o comportamento de assédio, se direciona para qualquer comportamento da vítima que possa conduzir à atenuação da culpa do agressor quanto a atos sexuais não consentidos, perpetuando, assim, a desvalorização dos crimes de natureza sexual e os seus danos morais, físicos, emocionais e psicológicos provocados às vítimas.
O assédio é efetivamente um crime contra a liberdade sexual e, como tal, tutela a esfera mais íntima da personalidade. Contudo, a lei penal não lhe dá destaque, pois, encontra-se integrado no crime de importunação sexual, previsto e punido pelo art. 170º do Código Penal, não lhe sendo dada qualquer visibilidade e notoriedade, razão pela qual as vítimas ficam numa posição enfraquecida. Esta é a razão pela qual as vítimas, ao invés de apresentarem queixa, optam por ficar no silêncio, num problema que é só delas e que a sociedade não as acompanha. As vítimas esbarram no conservadorismo da sociedade que continua a aceitar certas condutas que ainda são consideradas tabu na sociedade portuguesa.
A possível autonomização do crime de assédio sexual seria uma forma de dar seriedade ao assunto, torná-lo com visibilidade e interesse público, e conduziria necessariamente a um aumento do número de queixas, proteção das vítimas e consequente punição dos agressores. Enquanto assim não for, as vítimas resistirão a apresentar queixa embora o possam fazer.
Um artigo de opinião da Advogada Ana Leonor Marciano, especialista em Direitos Humanos, violência de género, violência doméstica, Direitos das crianças.
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