"Neste momento, os centros de investigação estão a procurar formas de substituir os processos químicos industriais por processos com base em bioquímica, onde são as enzimas a fazerem as reações que atualmente fazemos com recurso a derivados de petróleo e que tem repercussões muito caras", afirmou Pedro Leão, investigador do CIIMAR.
Em declarações à Lusa, o investigador explicou que a descoberta, publicada na revista Nature Communications, não foi inicialmente "uma hipótese" colocada pela equipa do centro sediado no Terminal de Leixões, em Matosinhos.
"A descoberta em si não foi uma hipótese que nós tivéssemos colocado logo à partida. Começamos a investigar aquelas cianobactérias [bactérias marinhas] e observamos uma resposta que não era esperada e, por isso, decidimos aprofundar", referiu.
Durante a investigação, que começou em 2018 ao abrigo de um financiamento do European Research Council, a equipa verificou o "desaparecimento misterioso" de uma série de compostos produzidos pelas cianobactérias, intitulados de bartolosidas.
"Percebemos rapidamente o que estava a acontecer, os ácidos gordos das cianobactérias ligavam-se às bartolosidas. Esta ligação, designada de esterificação, parecia decorrer de um mecanismo novo", explicou o investigador, adiantando que, a partir desse momento começaram a procurar a "enzima responsável" pelo novo mecanismo.
Depois de "purificarem" a enzima em laboratório, os investigadores concluíram que ela era responsável pela reação de esterificação, algo "sem precedentes para a química biológica".
"Há uns 30 ou 40 anos que se sabe que há outra forma de formar éster [ o composto que resulta da esterificação], mas só se conheciam estes processos na química industrial, ou seja, usando reagentes muito agressivos e temperaturas altas. Nunca se tinha visto nada semelhante na natureza", sublinhou.
Segundo o investigador, estas bactérias marinhas ao fazerem a reação naturalmente tem um "grande potencial" de serem utilizadas no futuro e auxiliarem os centros de investigação a "passarem da indústria com base em processos químicos para a indústria com base em processos bioquímicos".
"Cada vez que encontramos uma enzima nova, estamos a dar mais ferramentas para, no futuro, quem quiser, por exemplo, criar fármacos, o faça com recurso a reações naturais", exemplificou Pedro Leão.
E acrescentou, "hoje em dia já se usam enzimas na indústria para realizar estas reações de esterificação, mas este estudo descreve um mecanismo inovador que pode abrir portas a novas aplicações".
O investigador adiantou que o objetivo passa agora por "tentar obter mais financiamento" para continuar com a investigação, sendo que, neste momento, estão já em contacto com colegas dos Estados Unidos da América.
"Temos interesse que a reação seja o mais eficiente possível, para conseguirmos poupar mais. Se conhecermos a estrutura e o mecanismo da reação, depois podemos fazer pequenas alterações à enzima, por forma a garantir uma reação mais eficiente", concluiu.
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