Há utilizadores que criticam tudo, os que só colocam fotografias dos filhos, os viciados em selfies…  A redes sociais entranharam-se nas nossas vidas, na forma de pensar, de sentir. São «modos de interação, um reflexo da realidade e da maneira como hoje nos relacionamos com o mundo», descreve Alcina Rosa, psicóloga. Mas há uma forma inteligente de lá estar, descreve o psicólogo Vítor Rodrigues. «Pensar no Facebook como uma imensa casa virtual comum que podemos poluir ou limpar, embelezar ou encher de desarmonia e fealdade», refere.

«Pensar no que gostamos que os outros coloquem lá e, em reflexo, no que agradaria aos outros que colocássemos ali», acrescenta.« O Facebook pode ser um lugar de encontro da Humanidade ou apenas um antro de coscuvilhice e infantilidade», considera mesmo. Onde quer estar? Muitos dos 1,44 mil milhões de utilizadores que, no primeiro trimestre de 2015, tinham conta ativa nem sequer pensam nisso. Mas a crescente democratização deste tipo de presença virtual e de interações eletrónicas pede uma reflexão.

Os que fazem do Facebook um diário

Há pessoas que não dão um passo sem o divulgar no Facebook. «Gostam muito de falar de si e dos seus. Cansam-nos, mas nem se apercebem disso. Transmitem a sensação que são muito centrados neles e correm o risco dos outros se afastarem deles porque fazem sentir que não há espaço ali para mais nada», descreve a psicóloga Alcina Rosa, que aconselha a quem quer melhorar. «Pense que comunicar é uma interação com dois sentidos, ou seja, falar e ouvir. Aconselho que desenvolva indicadores de perceção para perceber o efeito que a conversa está a ter no outro, se está a ser cansativo», diz.

Os que partilham apenas vídeos insólitos

É outro dos grupos que mais se distinguem. «Também existem na vida real. Há sempre o amigo das histórias engraçadas, das anedotas. São muito divertidos, boa companhia e têm um papel importante num grupo. Se exagerarem, pode dizer-se que se escondem atrás do humor, usando-o como defesa por poderem ter problemas de autoconfiança ou de autoestima. Também pode ser uma forma de chamar a atenção. Nas redes sociais, acabam por ser cansativos porque inundam com informação sempre da mesma tipologia», refere Alcina Rosa.

Se o objetivo é melhorar, nada como fazer uma auto-avaliação. «Questione-se se tem necessidade de só comunicar dessa maneira ou se não tem outros valores que possa partilhar», recomenda a especialista. «Reflita sobre o efeito que essa comunicação pode ter no outro: sem querer, pode correr o risco de se estar a tornar cansativo», esclarece ainda a psicóloga.

Os solidários

Se há coisa que o Facebook veio democratizar foram os apelos sociais. «O verdadeiro solidário não anuncia, faz e faz discretamente», considera, contudo, Alcina Rosa. «A solidariedade nas redes sociais, muitas vezes, limita-se à passagem de informação. Estas pessoas podem ser solidárias ou falsamente solidárias. Aqui, a solidariedade pode funcionar como um descargo de consciência ou como uma forma de promoção da imagem», refere a especialista.

Alcina Rosa diz que para melhorar há que «perceber se está a ser efectivamente solidário ou se se está a enganar até a si mesmo e se há algo que precisa de compensar. Pense se só quer comunicar com o mundo desta maneira. Terá um perfil muito pobre e as outras pessoas podem começar a ignorá-lo», sugere.

Veja na página seguinte: Os religiosos  e os que escrevem publicações muito longas

Os religiosos

Se calhar, nunca reparou, mas eles está lá e não perdem uma oportunidade de apregoar a sua fé. «Refletem a sua relação com Deus e com a religião. Pode ter que ver com a imagem que as pessoas querem dar aos outros e dar de si a si próprias (que são boa gente), mas também podem ser pessoas com espírito missionário e que encontrem neste meio uma forma de espalhar a fé. Na base, está uma obsessão», considera a psicóloga. «Se se sente bem, continue mas analise se está a comunicar de forma adequada com os outros, sem querer mudar ou catequizar à força, lembrando-se que comunicar é uma relação com dois sentidos», alerta Alcina Rosa.

Os que escrevem posts muito longos

O ideal são publicações curtas para não desvirtuar a mensagem mas há posts que são verdadeiros testamentos. «[Essa situação] implica alguma autocentração e a crença de que se tem coisas muito relevantes a dizer. Pode ser uma evidência de que a pessoa se julga muito importante e digna de ser lida», explica o psicólogo Vítor Rodrigues, revelando que pode haver a exceção «de quem despertou para temas que considera fundamentais e que procura transmitir, podendo exagerar». Para melhorar «procure variar a extensão dos seus posts e torná-los o mais sintéticos possível. Interesse-se pelos comentários dos outros e por posts alheios», sugere.

Os viciados em selfies

Os autorretratos vieram para ficar e até as celebridades não lhes resistem. «Que imagem transmito de mim se estou sempre a mostrar-me e a impingir aos outros a minha imagem, a minha vida, os meus gostos, os meus lugares favoritos? Algum egocentrismo ou a tentativa de auto valorização sistemática. É como se dissessem permanentemente que são giros e que fazem coisas interessantes», ilustra o psicólogo. Se quer melhorar, é simples. «Interesse-se pelos outros. Perceba que a sua privacidade nem sempre é interessante. Procure utilizar o Facebook para saber mais acerca do mundo e não só acerca da cor da roupa interior do vizinho ou para partilhar a sua», sugere o especialista.

O que partilham frases de autoajuda

Por alguma razão, os livros de autoajuda vendem que nem pãezinhos quentes. «Dependendo das publicações, normalmente evidencia preocupações sociais e tentativa de contribuir para que a mentalidade mude. Nota-se, por vezes, a presença de algum nível de centração em si mesmo. Muitas vezes, são pessoas solidárias e interessadas no que os outros têm a dizer ou no que fazem», refere Vítor Rodrigues. Para melhorar, «seja muito seletivo nas frases que partilha e procure não ter a preocupação de partilhar sempre algo. Contribua com moderação. Interesse-se pelo feedback dos outros», aconselha o especialista.

Os que criticam tudo

Atrás de um ecrã de computador, todos têm a frontalidade que nem sempre exibem cara a cara. «Podemos estar no território do bullying. Se critico, geralmente, sinto-me superior a quem critico e sinto-me valorizado/energizado por isso. Transmite a imagem de alguém carrancudo, agressivo, revoltado, infeliz por não conseguir apreciar», considera Vítor Rodrigues. Se o intuito é melhorar, o psicólogo deixa um conselho. «Faça o oposto. Aprenda a valorizar, a salientar notícias positivas, a elogiar ou apreciar. Criticar sempre é muito diferente de criticar umas vezes, elogiar outras, pedir opinião», explica.

Os que só falam de trabalho

São outro dos grupos que proliferam no Facebook. Fazê-lo «dá a imagem do indivíduo estratega alpinista ou o crítico de serviço na empresa. Podem abusar do autoelogio mas também da crítica destrutiva. É alguém que pode ter pouco cuidado com a discrição e ética que as questões laborais devem merecer», descreve a psicóloga Cristina Nunes de Azevedo. «Reflita sobre os riscos das situações, para si e para os outros, antes de as publicar», recomenda, no entanto, a especialista.

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Os que escrevem indiretas

É mais uma situação de cobardia. «Criam uma imagem de fragilidade, não só porque expõem o que os magoa, como também pela legião de fãs que vão criando, que se identificam com os acontecimentos negativos descritos. Apresentam facilmente o lado negro da vida e utilizam o Facebook como um diário emocional», refere a psicóloga Cristina Nunes de Azevedo.

Se quer melhorar, abandonando esta postura, «tente assumir mais frequentemente o discurso direto, delimitando a audiência da mensagem. Mas, sobretudo, lembre-se que existe um lado positivo da vida, mesmo perante as adversidades, e que há limites da exposição da intimidade», refere ainda a especialista.

Os silenciosos

São outro dos grupos maioritários desta rede social. Por raramente fazerem posts, «são vistos como os observadores não participantes. Transmitem uma falsa imagem de inatividade mas são quem mais se dispõe a perder tempo a pesquisar os perfis de outros. Transmite uma imagem opaca e difusa de si e usa o Facebook para analisar informações», afirma a psicóloga Cristina Nunes de Azevedo. «Dê mais vitalidade às interacções virtuais e aproveite para investir em relacionamentos de longo prazo, utilizando outras ferramentas de ligação entre os indivíduos para além dos likes, como o chat», aconselha.

Os que têm um perfil de casal

São menos comuns mas também existem. «Os seus utilizadores atribuem uma elevada preponderância à dimensão afetiva, sobretudo se há ausência de perfis individuais. Este tipo de página pode ser útil para assinalar acontecimentos relevantes da vida afectiva do casal mas a ausência de páginas separadas pode significar fusão relacional entre os membros do casal. Adicionalmente pode não ser adequada para relacionamentos de natureza profissional», diz Cristina Nunes de Azevedo. Neste âmbito, a psicóloga alerta para a importância de ter páginas individuais, nas quais haja interações de cada um com amigos, família e contactos profissionais.

Vale a pena estar no Facebook?

Esta é uma questão que muitas pessoas, por vezes, se colocam. A resposta é… Sim! Estas são as razões mais apontadas pelos especialistas:

- Permite observar linhas de tendência da sociedade

- Permite contactar gente com interesses comuns

- Permite  aceder a informação que os mass media não transmitem

- Permite partilhar e receber qualquer tipo de informação de boa qualidade (arte, cultura e cinema, por exemplo).

Veja na página seguinte: O lado negativo de estar no Facebook

O lado negativo de estar no Facebook:

- Transforma-se facilmente num vício

- Cria a ilusão de convívio saudável com os outros

- Expõe-nos a observações, críticas ou intenções predatórias alheias

- Alimenta a ilusão de preenchimento de necessidades afetivas

Não tem Facebook?

Apesar dos cerca de 4.800 milhões de utilizadores portugueses, ainda há quem resista a esta rede social por diversas razões. Se estivermos a falar de utilizadores habituais de internet, muitos podem optar por não ter Facebook por ter a impressão de que «é somente o palco de egocentrismos, mostras de gatos, cães e outros animais, críticas por vezes mal fundamentadas ou outras perspectivas tendenciosas», diz o psicólogo Vítor Rodrigues que, no entanto, considera que o número de razões para não pertencer a esta rede social «pode ser tão numeroso quanto as pessoas», refere.

Texto: Catarina Caldeira Baguinho e Luis Batista Gonçalves (edição internet) com Alcina Rosa (psicóloga clínica), Cristina Nunes de Azevedo (psicóloga clínica) e Vítor Rodrigues (psicólogo e psicoterapeuta)