Não é preciso que assim seja. As novas etapas, os recomeços têm um efeito simbólico que nos pode impulsionar para tomarmos novas decisões e deixarmos velhos hábitos, a questão estará em como aproveitar bem esta energia e vontade de ser e fazer diferente.

Provavelmente, o que mais nos dificulta nas decisões do novo ano é querermos ver os resultados logo na primeira semana e talvez até vejamos alguns, deixamos é de os ver a meio da segunda. Isto acontece sobretudo porque o mais difícil de manter um novo hábito não é o início. No início, seja para deixar de fumar, começar a correr ou aprender a meditar, há um efeito de novidade e as pessoas à nossa volta incentivam-nos e elogiam-nos e tudo parece fluir. Só que mudar não é fácil, se fosse não era preciso esperar pelas decisões de ano novo. Os comportamentos negativos que mantemos, apesar de não gostarmos deles, existem por alguma razão e estão muito enraizados em nós. Por vezes, até são traves que nos sustêm e permitem conseguirmos funcionar nas outras áreas das nossas vidas.

Um exemplo comum pode ser a ingestão de alimentos calóricos em excesso e impulsivamente, em que as pessoas sentem que nunca atingem a saciação mesmo quando fisicamente já estão em desconforto, podendo chegar até ao vómito. Este comportamento é chamado de “Binge eating”.  À primeira vista pode parecer fácil parar, será só não ter estes alimentos em casa e encontrar outros modos de lidar com este impulso. Muitas pessoas, numa primeira sessão de psicoterapia, querem apenas focar-se neste comportamento e pedir estratégias e mais estratégias para o controlar.  No entanto, é preciso ir mais fundo e compreender como é que este comportamento de conforto imediato encaixa na nossa vida e qual o seu papel. Porque se é um comportamento resistente e persistente, então, há alguma necessidade nossa a que ele está a dar resposta. E enquanto não houver uma mudança de fundo não há condições para haver mudanças sustentáveis à superfície.

Daí que quando a psicoterapia se foca apenas nesse aspeto é bastante provável a recaída e o regresso a este comportamento problemático ou a outros equivalentes. Por isso, uma ideia que pode aumentar a eficácia nas nossas decisões é aceitar que há uma sucessão de passos invisíveis até que a mudança se veja. A primeira decisão é perceber qual o primeiro passo na direção certa, que na maior parte dos casos será compreender que papel é que este comportamento está a ter na minha vida e o que é que o faz manter-se. E por isso, paradoxalmente, o trabalho que nos vai possibilitar acabarmos com um comportamento problemático, implica fazer as mudanças necessárias em outras áreas da nossa vida.

É também crucial aceitar que a mudança é uma espiral ascendente e não uma escada sempre a subir. O que significa que há momentos em que se desce enquanto se vai subindo. Aprender com os nossos deslizes e regressos a velhos padrões de comportamento ajuda-nos a compreendermo-nos melhor e a prevenir futuras recaídas. Muito importante aqui também distinguir um erro ou um lapso de uma recaída. Fumar um cigarro numa noite depois de ter deixado de fumar será um lapso, na manhã seguinte ir comprar um novo maço de cigarros é uma recaída e são duas decisões independentes. Outra hipótese possível seria continuar sem fumar e perceber como se pode preparar para numa próxima situação não ceder à vontade de fumar.

E, por último, aceitar que a mudança traz desconforto e alturas em que apetece tudo menos aguentar com o novo plano. Bom trabalho! É também destes momentos mais difíceis que vem o orgulho de sabermos que nos conseguimos superar!

Ana Moniz - Psicóloga clínica