Trata-se de uma doença da região profunda do cérebro que controla o movimento e pode afetar tanto crianças como adultos. É assim importante chamar a atenção que a esmagadora maioria dos doentes com distonia tem uma inteligência normal, mesmo quando a perturbação do movimento é grave.
Quando falamos de distonia é importante termos presente que esta não é uma única doença, mas um conjunto de doenças, que pode ter origens muito diferentes e por isso mesmo diferentes prognósticos. Pode ser genética e hereditária (a minoria) ou secundária a doenças que acontecem por altura do nascimento ou mesmo ao longo da vida.
Quando a causa é uma doença que ocorre por altura do nascimento, dizemos que a distonia é uma manifestação de uma forma de paralisia cerebral e trata-se de uma doença que não progride, ao contrário das causas genéticas que regra geral são doenças evolutivas. Outras causas secundárias são as infeções do cérebro, os AVC, os traumatismos crânio-encefálicos e os tumores.
O diagnóstico precoce desta patologia é fundamental, assim quando existe suspeita de distonia, deve ser sempre procurada a avaliação de um neurologista Existem algumas outras doenças que se podem confundir com a distonia, como a epilepsia, as doenças do músculo, os tiques e ainda situações de sofrimento psicológico que se manifestam desta forma. Assim, esta identificação precoce é crucial para uma resposta adequada às necessidades do doente.
Quando os sintomas são intermitentes, é importante tentar filmar os episódios e anotar se ocorrem, agravam ou aliviam em situações especiais, como durante certos movimentos (escrever por exemplo), com certas emoções (como sustos ou birras), com o exercício físico, o jejum prolongado ou o sono. Pode também acontecer que as posturas anómalas da distonia estejam presentes numas situações e não noutras (como por exemplo distonia do pé ao andar para a frente, mas não ao andar para trás ou ao correr) e isso não deve levar a pensar que o problema é falso ou fingido. É também possível que a pessoa com distonia aprenda que certos gestos aliviam o sintoma ou a dor e tenha tendência a fazer esse gesto com frequência (como tocar na cabeça para aliviar a distonia dos músculos do pescoço). Isso também não nos deve levar a pensar que o sintoma não é real e involuntário.
Em adultos, a distonia mais frequentemente é focal ou segmentar, envolvendo apenas uma parte do corpo. Já nas crianças, a distonia pode começar por um membro e evoluir, envolvendo depois todo o corpo (generalizada).Por outro lado, movimentos involuntários da face em crianças (como cerrar os olhos, franzir a testa ou mover os lábios) são mais frequentemente tiques e não distonia. Já em adultos, estes podem ser uma forma comum de distonia focal.
No que diz respeito ao tratamento, é importante ter presente que a distonia é uma doença que não tem cura e o tratamento é necessário para toda a vida. O tratamento que oferecemos destina-se a aliviar os sintomas, para melhorar a função dos membros e as atividades da vida diária e aliviar a dor. Existem alguns tratamentos dirigidos à causa propriamente dita da distonia, mas na generalidade usam-se medicamentos orais que são eficazes independentemente da causa. Cabe ao neurologista gerir em conjunto com o doente e as famílias, os sintomas que mais perturbam, os efeitos adversos dos medicamentos e os objetivos do tratamento.
Pode ainda recorrer-se, em casos particulares, à injeção de toxina botulínica nos músculos mais afetados – que é um tratamento que necessita ser repetido de tempos a tempos – ou à cirurgia de estimulação cerebral profunda. Além desta abordagem, é muito importante não esquecer a importância da reabilitação motora que se consegue através de fisioterapia, terapia da fala e terapia ocupacional. Existe clara evidência que nesta, como noutras doenças do movimento, a reabilitação permite que o cérebro reaprenda o movimento correto através do treino continuado. Quando a distonia envolve os músculos necessários para engolir, pode ser necessário a ajuda de nutricionistas e especialistas em Gastroenterologia.
A intervenção de especialistas em Saúde Mental (psiquiatras ou pedopsiquiatras) é também importante no tratamento de doentes com distonia que sofrem muitas vezes de ansiedade e depressão reativas à doença. No início do século XX, acreditava-se que a distonia era uma doença psicológica e interpretavam-se os movimentos de forma simbólica – a distonia do pescoço era uma forma de “virar a cara aos problemas” e a distonia dos olhos significava “não querer ver o mundo exterior”. Neste momento, esta interpretação está claramente ultrapassada. No entanto, continuam a existir doentes em que a origem da distonia é uma questão funcional e não estrutural do cérebro e para os quais o tratamento passa pela psicoterapia.
Reforçamos assim que a distonia é uma doença complexa e muito exigente para os doentes, as suas famílias e os profissionais que cuidam deles. Estes doentes devem ser sempre avaliados em centros que permitam ativar todas as especialidades necessárias, uma vez que só o envolvimento de todas elas permite oferecer a melhor qualidade de vida possível a doentes e famílias.
Um artigo da médica Cláudia Marques Matos, Neurologista do Centro Hospitalar Universitário Lisboa Central.
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