Os pais de crianças hiperativas tendem geralmente a achar que o céu lhes caiu em cima. Não é fácil para eles mas para os filhos não é melhor.

Este distúrbio provoca sofrimento, problemas de integração, socialização e aprendizagem. Mas não aceite, vencido, o rótulo de filho problemático. Com o acompanhamento adequado, os milagres da concentração acontecem. Basta saber acompanhar a criança.

Os números assustam e, diz quem sabe, que a realidade ainda mais. A  hiperatividade, nome pelo qual é conhecida a Perturbação de Hiperatividade e Défice de Atenção (PHDA), afeta entre 5 e 7 % das crianças em idade escolar.

É o segundo distúrbio do desenvolvimento mais frequente, depois da dislexia. Por isso, na escola, não é raro que exista pelo menos uma criança diagnosticada por turma. São, muitas vezes, consideradas crianças problemáticas mas, a verdade, são é desatentas e desconcentradas, o que resulta numa agitação permanente e anormal.

«São como um carro sem travões», descreve Nuno Lobo Antunes. Esta  perturbação é uma dor de cabeça para pais, professores, mas, sobretudo, para as crianças, que sofrem o estigma de quem tem dificuldades de integração e  aceitação. O que pode ter consequências devastadoras na formação e socialização dos próprios, bem como no seio da família. Não é à toa que pais com filhos hiperativos são mais propensos ao divórcio (a possibilidade é de três a cinco vezes maior).

Mas não é caso para resignações. A PHDA é crónica e, muitas vezes, cruel mas, com o acompanhamento certo, o diagnóstico bem elaborado, e doses reforçadas de paciência, amor e tolerância, é possível rescrever o guião de vida destas crianças. Quem o diz é o neuropediatra Nuno Lobo Antunes, que todos os dias trata crianças com este problema no Centro de Apoio ao Desenvolvimento Infantil (CADIn).

O que é a hiperatividade?

Vamos por partes. Antes de mais será o seu filho realmente hiperativo? «Muitos dos alunos etiquetados com esta perturbação não têm qualquer problema», desvenda Nuno Lobo Antunes. «Há crianças que manifestam mais vitalidade do que o normal ou que tentam chamar a atenção dos outros», acrescenta.

Por isso, se o seu filho é irrequieto, desatento ou tem uma energia inesgotável, não é caso para lhe fazer de imediato um diagnóstico doméstico de PHDA. Até porque as características desta perturbação, em especial na infância, são comuns a diferentes perturbações do desenvolvimento. Aos pais, professores, família e pediatra cabe estarem atentos aos sintomas, mas «procurar sempre especialistas que saibam fazer uma análise correta da  situação».

É hereditária?

Há fatores preponderantes. Se um dos pais tiver tido PHDA, a probabilidade de os filhos desenvolverem a perturbação aumenta 50%. E uma coisa é certa, diz o médico: «Quando os pais tomam a decisão de nos trazer as crianças, seja por decisão própria ou recomendação do pediatra ou professor, existe sempre uma razão válida para tal». E se a intervenção for precoce, minimiza e muito os problemas que advêm da PHDA.

Quais os sintomas?

A excitação excessiva é, sem dúvida,
o sintoma mais visível da perturbação. Quem tem filhos que sofram deste problema sabe-o bem.

«Mas, normalmente, estas
crianças têm co-morbilidades associadas», explica o especialista.

«Cerca de 60% têm problemas na leitura e escrita, 40% têm
problemas de oposição e desafio, 20% ansiedade e 10% tiques», justifica este profissional.

À agitação
motora junta-se a dificuldade em concluir em tarefas que exigem esforço
mental e a impulsividade. Mas o que determina o diagnóstico (não há um
teste específico) é o «sofrimento que causa e a incapacidade de
adaptação que provoca», esclarece Nuno Lobo Antunes.

O médico
sublinha também que «a agitação motora é uma consequência normal do
facto das crianças não se conseguirem concentrar». Para além disso,
frisa que mais importante do que a agitação motora é a desatenção.
«Existe défice de atenção sem hiperatividade, sobretudo nas raparigas»,
explica.

Como se trata?

Uma vez feito o diagnóstico, é altura para boas notícias. É difícil
acreditar que elas existem, já que uma criança com PHDA aumenta em 50%
probabilidade de ter um acidente de bicicleta e em 33% a possibilidade
de ir parar às urgências hospitalares. Mas a verdade é que há luz ao
fundo do túnel. A intervenção  farmacológica, ou seja, através de
medicação, é, normalmente, a primeira escolha para tratar o distúrbio.

Com
exceção das crianças abaixo da idade escolar, onde a intervenção é
apenas comportamental. «Pode acontecer mas não é uma primeira escolha», 
sublinha o especialista. E se começa a ficar assustada, tenha calma. «A
medicação não é um sedativo, é um estimulante», tranquiliza Nuno Lobo
Antunes. E os resultados são imediatos? «Sim, muitas vezes são logo ao
primeiro dia», atesta. E prossegue, dizendo que «quando não é, aconselhamos duas a
três semanas antes de desistir do fármaco».

Tem cura?

O
diretor do CADIn lembra que, como qualquer medicação, a dose é
ajustável. Isso quer dizer que os hiperativos estão condenados a
medicação para o resto da vida? «Não, são medicados até pais, médico e
adolescente acharem que é necessário », responde. «Normalmente, o
problema passa com a chegada da idade adulta, quando há uma maturação do
lobo frontal e os sintomas deixam de se manifestar», assegura.

E
conclui que «o tratamento envolve também uma parte psicológica,
porque a medicação resolve o défice de atenção, dirige a  concentração,
diminuindo a agitação, mas não resolve, por si, os problemas das relações interpessoais». Em
alguns casos (um terço), a PHDA transita para a idade adulta. Mas não é
caso para dramatismos. «O CADIn, por exemplo, tem uma consulta
destinada a adultos com défice de atenção », revela em jeito de solução.

Conselhos aos pais

Estas são algumas das recomendações que deve pôr em prática:

- Seja proativo. É preferível que antecipe a situação, evitando que aconteça, do que reagir a ela.

- Hierarquize as situações. Ponha as coisas maisimportantes em primeiro lugar, não reaja a todas da mesma forma.

-
Tente compreender a situação do seu filho.

É importante que se preocupe mais com isso do que em querer ser
compreendido. Se tentar, em primeiro lugar, entender a situação do seu
filho, aumenta a probabilidade de ser correspondida, pois está a atuar
como modelo.

- Utilize o reforço positivo com frequência. Reforce
de forma imediata e sistemática o bom comportamento e as capacidades do
seu filho.

- Não grite nem se exalte. Explique porque é que está
a atuar dessa forma, mantendo a calma ao falar e agir. Não puna a
criança em situação de conflito aberto ou em situação de birra. Nestes casos, retire a criança da situação geradora de conflito e espere que se acalme.

- Ajude o seu filho a organizar-se - Estabeleça rotinas adequadas às suas  capacidades e reforce a sua realização.

-
Mantenha sempre a calma. Pelo menos tente e treine. Manter uma atitude
firme mas tranquila é essencial para lidar com o seu filho.

Texto: Sandra Cardoso com Nuno Lobo Antunes (neuropediatra e diretor clínico do Centro de Apoio ao
Desenvolvimento Infantil -CADIn)