Praticamente desconhecida das minorias que nunca tiveram excesso de peso, a cirurgia bariátrica (também chamada cirurgia da redução do estômago) é a última solução para quem sofre de obesidade mórbida.
De acordo com dados da Direção-Geral da Saúde (DGS), seis em cada dez portugueses têm excesso de peso, sendo cerca de 15 por cento da população obesa.
Segundo a Adexo - Associação de Obesos e Ex-Obesos de Portugal, três por cento é mesmo superobesa. À semelhança do que acontece na Europa, o recurso a este tipo de cirurgia tem vindo a aumentar no país, mas o acesso à operação no setor público está longe de ser fácil. A Organização Mundial de Saúde determina que ninguém deve ser submetido a cirurgia bariátrica sem antes ter tentando perder peso através de planos alimentares, atividade física, psicoterapia, mudança de hábitos e medicação, durante pelo menos dois anos.
Só na falência das terapêuticas conservadoras, sublinha Jorge Limão, cirurgião especializado neste tipo de intervenção, «é que o doente deve ser proposto para a cirurgia». A taxa de sucesso dos tratamentos conservadores em doentes com obesidade mórbida é de 5 por cento, enquanto que a da cirurgia é de 90 por cento, refere o especialista.
Casos prioritários
A condição essencial para se ser candidato a este tipo de operação é, segundo o cirurgião, «ter um IMC superior a 40 ou acima de 35 e a existência de doenças associadas que são passíveis de ser corrigidas se tratarmos a obesidade, como acontece com a hipertensão, a diabetes, a deslipidemia (colesterol e triglicéridos altos), a apneia e doenças osteoarticulares». Como 20 por cento dos obesos mórbidos sofrem de diabetes, estes doentes são dos primeiros a ser indicados para tratamento.
Programa multidisciplinar
A cirurgia bariátrica é apenas uma parte do tratamento que envolve uma equipa multidisciplinar. Jorge Limão lembra que, «para a operação ser eficaz, é necessário haver acompanhamento de uma equipa clínica, dietética e psicológica. Deverá ser quantificado o excesso de calorias diário, quais são os hábitos alimentares e o que será preciso mudar», refere o especialista.
«Estabelecem-se planos alimentares pré e pós-operatórios para o doente viver com o tipo de cirurgia a que submeteu», acrescenta ainda o cirurgião especializado. O lado psicológico também é determinante para o êxito. «Através de consultas e testes avaliamos o controlo dos impulsos que levam o paciente a comer demais», afirma ainda.
Hospitais públicos
Mais de 20 hospitais públicos estão a realizar este tipo de cirurgia, que custa ao Estado mais de 7.600 euros. Os super-obesos com doenças associadas têm prioridade, sendo que as listas de espera podem demorar anos. «O mais complicado não é a cirurgia mas reunir uma equipa. São muito poucos os centros, públicos ou privados, que têm uma estrutura completa a funcionar. Por exemplo, após a perda de peso, é necessário a intervenção da cirurgia plástica ou o doente não fica tratado», diz o especialista.
Bloco operatório
Terminada a avaliação do paciente, se os resultados são positivos, surge a indicação operatória. O tipo de cirurgia bariátrica a aplicar será determinado em função do perfil clínico do paciente. «Se o doente não souber usar a ferramenta de emagrecimento que lhe estamos a entregar, corre mal. Daí a necessidade de selecionar muito bem os doentes e as cirurgias», comenta Jorge Limão.
Acompanhamento prolongado
Após a cirurgia, «o doente tem de estar apto a fazer boas escolhas alimentares e gasto calórico regular diário para que funcione. Necessita de acompanhamento ao longo de todo o processo, principalmente, durante os primeiros dois anos, extensível ao quinto ano em alguns casos», realça o especialista neste tipo de cirurgias. «A obesidade mórbida pertence à lista de doenças crónicas, ou seja, é uma patologia para a vida, que pode ser controlada, mas que nunca fica curada e que exige sempre acompanhamento», conclui.
Os tipos de cirurgias a que pode recorrer
O perfil do paciente e do seu problema de peso ajudam o cirurgião a determinar a técnica a utilizar. Jorge Limão apresenta as várias opções:
- Banda gástrica
Nesta intervenção, é colocada uma prótese em torno do estômago. A banda é ajustável e após a cirurgia terá de existir um plano de aperto. Em termos de vantagens, esta é a cirurgia menos agressiva e menos dispendiosa. Demora apenas 40 minutos a ser realizada por laparoscopia e só implica 48 horas de internamento. Uma semana depois, o doente volta à sua atividade profissional.
No que se refere a desvantagens, os resultados são mais difíceis de atingir relativamente a outras abordagens. Promove a restrição alimentar, mas não atua ao nível da absorção dos alimentos nem do apetite. Em termos de resultados, é garantida uma perda até 50 por cento do peso em excesso, uma melhoria geral da saúde e uma melhoria da autoestima e da qualidade de vida. Este procedimento cirúrgico tem um custo de 9 mil euros.
- Sleeve gástrico
É feito um corte vertical no estômago, transformando-o num tubo fino e retirando-se o excedente. Tem duas grandes vantagens. É realizado por laparoscopia e promove a restrição alimentar e o controlo do apetite. Tem também desvantagens. A cirurgia dura cerca de uma hora, implica 72 horas de internamento e duas semanas de convalescença.
Tenha também em conta que, quanto maior o sucesso da cirurgia, que tem um custo médio de 11 mil euros, maior a necessidade de realizar cirurgia plástica para redefinir o contorno corporal. Em termos de resultados, é garantida uma perda de 50 a 65 por cento de peso em excesso, uma melhoria substancial da qualidade de vida e da saúde, uma vez que as doenças associadas desaparecem. A lista de benefícios inclui ainda uma melhoria da autoestima.
- Bypass gástrico
Recorta-se e separa-se um pedaço do estômago para criar uma bolsa que se liga diretamente ao intestino delgado. É realizado por laparoscopia, promove a restrição alimentar, diminui a produção da hormona do apetite (grelina) e reduz, em cerca de 30 por cento, a absorção dos alimentos ingeridos. Nem tudo são, contudo, aspetos positivos.
A operação demora cerca de uma hora e meia, exige 72 horas de internamento após a cirurgia e duas semanas de convalescença. Quanto maior o sucesso da cirurgia, maior a necessidade de realizar cirurgia plástica para redefinir o contorno corporal.
Esta intervenção, que tem um custo de 14 mil euros, assegura uma perda de 65 por cento de peso em excesso. Nove meses após a cirurgia, os problemas de hipertensão, colesterol elevado, entre outros, desaparecem ou são atenuados, além de que a paciente nota uma melhoria da autoestima e da qualidade de vida.
- Alternativa endoscopia bariátrica
É o tratamento não cirúrgico indicado para casos menos graves. É um método endoscópico que envolve a colocação de um balão gástrico de silicone no estômago. Não requer internamento e, ao fim de seis meses, o balão é retirado pela mesma via. A perda de peso consegue-se pela pressão exercida sobre as paredes do estômago que desencadeia estímulos de saciedade. Pode ser usada para melhorar a condição do paciente, antes da cirurgia, para diminuir o risco operatório.
Texto: Fátima Lopes Cardoso com Jorge Limão (cirurgião bariátrico e diretor médico da Baroclínica)
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