“Os outros 44% morrem no hospital. E depois, dos que conseguem chegar à rede, cerca de 30% voltam a ser internados. Ou seja, os doentes acabam por piorar na própria rede”, referiu João Araújo Correia, citando os dados de um estudo realizado no Centro Hopspitalar do Porto, que será apresentada no encontro.

Em média, segundo disse à Lusa, “depois de cumpridos os critérios e de aceites, os doentes esperam 47 dias para entrar numa unidade da Rede Nacional de Cuidados Continuados. São necessárias mais camas para que haja uma resposta mais célere”.

Segundo Araújo Correia, que é diretor do Serviço de Medicina do Centro Hospitalar do Porto, “dos 56% que foram para as unidades, 37% foram reinternados. E, segundo as regras dos cuidados continuados, se permanecerem no hospital mais de sete dias, têm de recomeçar todo o processo, porque perdem a vaga. O que é uma coisa dramática”.

Citando a experiência do seu serviço, Araújo Correia disse que “em 2016 teve 117 doentes que acabaram por ir para lares ou rede de cuidados continuados”.

“Contabilizado o tempo que estiveram internados sem razão clínica, ou seja, à espera, chegou-se aos 2.961 dias, são quase três mil dias de internamento. Calculando quanto custa cada dia de internamento significa que só estes 117 doentes custaram ao hospital 571 mil euros”.

“O meu serviço tem três unidades de internamento e tenho sempre cerca de 25 doentes internados sem razão clínica. Estão à espera de ir para o lar ou para a rede de cuidados continuados. E eu tenho a urgência cheia de doentes à espera de vaga para serem internados. E eu sei que isto é uma coisa generalizada pelo país”, lamentou.

10 doenças perigosas que não apresentam sintomas

O especialista defendeu que “é fundamental haver mais camas na rede, para que haja uma resposta mais célere” e que “a rede seja dotada de meios mínimos”.

“Quem lá está são profissionais de saúde mais jovens, o que justifica que 30% dos doentes, que são muito complexos, voltem ao hospital. E, segundo as regras, se o doente estiver mais de sete dias internado na sequência dessa agudização, perde a vaga e tem que ser reiniciado todo o processo”, frisou.

A relação entre a Medicina Interna (MI) e a Medicina Geral e Familiar (MGF), ou “a falta de ligação entre estas duas grandes especialidades” é outro dos temas em destaque no congresso, que decorrerá até domingo na Alfândega do Porto.

Segundo João Araújo Correia, essa é “uma das grandes fragilidades do Serviço Nacional de Saúde. É exatamente por isso que 95% dos internamentos nos serviços de medicina se fazem a partir do serviço de urgência, o que é, digamos, o espelho de que realmente não há ligação entre as duas especialidades”.

“Os médicos de medicina geral e familiar convenceram-se que tratam fundamentalmente doentes crónicos (hipertensos, diabéticos e outros) e que também fazem rastreios, tudo com tempo, com consultas daí a uns meses”, disse.

Defendeu a necessidade de “criar incentivos para o tratamento da doença aguda nos centros de saúde”, referindo que uma das coisas que se pretende é que este congresso "promova de facto uma mudança de paradigma”.

Entre os convidados do congresso estarão o investigador Alexandre Quintanilha e o presidente do Conselho Económico e Social, Correia de Campos, que, “enquanto ministro da Saúde, foi grande responsável para que a medicina interna se assumisse como o grande alicerce do tratamento do doente no hospital. De facto, a partir do seu ministério o número de especialistas que começaram a entrar em medicina interna praticamente duplicou. Neste momento a medicina interna é a maior especialidade hospitalar, com 940 internos em formação”.