“A Medicina Interna é hoje uma especialidade pouco atrativa, porque tem uma sobrecarga de trabalho assistencial muito grande”, disse Daniel Ferro, na semana em que se iniciou o internato de formação geral ou de formação específica para 210 novos médicos no centro hospitalar que integra os hospitais Santa Maria e Pulido Valente.
Daniel Ferro, que deverá ser substituído este mês pela farmacêutica Ana Paula Martins, explicou que há poucos anos o serviço de urgência era partilhado “entre quatro ou cinco especialidades” e agora a Medicina Interna está “quase sozinha”.
“Naturalmente que a esta sobrecarga se juntam outras sobrecargas (…) porque mais doentes na urgência, significa mais doentes na enfermaria, na consulta, o que significa menos tempo na investigação e na formação”, sustentou.
No concurso de 2022 para internato médico, 71 das 238 vagas para Medicina Interna ficaram por ocupar.
Para Daniel Ferro, esta especialidade tem que “ser repensada”, investindo mais na subespecialização na urgência, como têm feito muitos países europeus.
“A preparação e formação do perfil clínico na urgência têm que ser repartidos e tem que ser criada uma subespecialidade, ou uma especialidade, que tenha como elemento principal o contexto de trabalho na urgência, em vez de ter apenas a medicina interna”, defendeu, adiantando que é necessário também apostar na atratividade de outras especialidades, como a anestesia, com “um plano a médio e longo prazo” para ter melhores condições de formação nas instituições.
Daniel Ferro ocupava o cargo de administrador hospitalar desde 2019, tendo o seu mandato terminado no final de 2021.
Fazendo um balanço destes três anos, o administrador disse que “a principal preocupação” foi melhorar a acessibilidade dos doentes e, sobretudo, reduzir as listas de espera de cirurgia e de consulta, objetivos que disse terem sido alcançados.
A atividade cirúrgica está a um ritmo superior em 25% àquilo que era e o tempo de espera para consultas é de 100 dias quando era de 170, observou.
O gestor iniciou o mandato em maio de 2019, em plena pandemia, um desafio que classificou como o “mais importante da história do hospital”, mas também do percurso dos seus profissionais.
“Nós não tínhamos ideia da dimensão da pandemia e do desafio em que a instituição iria ser colocada”, disse, lembrando que metade do hospital teve que alterar o que fazia nas suas estruturas, nas suas equipas e na tipologia dos doentes, o que por vezes era feito no espaço de uma semana.
Contou que os profissionais a certa altura abdicaram das suas especialidades. “Tínhamos pediatras a ver adultos, o que ilustra a grande flexibilidade que houve e, por isso, o todo ganhou a batalha”.
Ao longo do seu mandato, também teve de enfrentar um aumento da despesa hospitalar na ordem dos 6% a 7% devido à pandemia e à inflação, reconhecendo que tem sido “um esforço financeiro muito grande”.
Questionado sobre se considera que deixa o hospital melhor preparado, disse que na maior parte dos serviços e das especialidades “claramente que sim”.
Quanto aos “pontos fracos”, apontou a necessidade de melhorar o funcionamento da urgência e das equipas da urgência e de saber fazer a sua formação e a sua regeneração, "mas com base em outros paradigmas".
“Precisamos, por exemplo, de reforçar a área médica com mais especialistas que não só permitam alimentar as equipas de urgência, mas também ter mais doentes internados não só na instituição, mas em casa”, defendeu.
Sobre se gostaria de continuar a liderar o CHULN, Daniel Ferro disse que gostaria de concluir alguns dos projetos que dificilmente se conseguem concretizar em três anos, mas sublinhou que “as regras do sistema” são assim.
“A nossa expectativa não pode estar além daquilo que é o próprio mandato e esse mandato terminou há cerca de um ano e, portanto, é normal que possa haver estas alterações”, comentou.
Para Daniel Ferro, o importante é que grande parte dos projetos tenha continuidade e que as instituições “sofram o menos possível com a alteração de uma administração”.
Comentários