A partir de que momento é que alguém se pode autodenominar ex-fumador?
A partir do momento em que alguém deixa totalmente de fumar com a firme intenção de se manter abstinente, podemos dizer que é um ex-fumador. Contudo as recaídas são frequentes. Quem deixou de fumar há menos de um ano é considerado um ex-fumador recente. Nesse período, a cessação tabágica ainda não está consolidada e a probabilidade de recaída é elevada, em particular nos primeiros dias ou semanas após o primeiro dia sem tabaco. Decorrido o primeiro ano em cessação tabágica, a probabilidade de recaída é menor, diminuindo progressivamente com o passar do tempo. A pessoa será ex-fumadora se conseguir manter a total abstinência de tabaco e de produtos com nicotina a longo termo.
Que tipo de terapêuticas/métodos existem para quem quer largar o vício do tabaco? Quais os mais aconselhados?
O método com reconhecida comprovação científica, recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e por outras entidades internacionais de reconhecida idoneidade na área da saúde, assenta no apoio comportamental prestado pelo médico ou outro profissional de saúde, com o intuito de apoiar o descondicionamento comportamental e a gestão do stress associado à abstinência tabágica, complementado por terapêutica farmacológica para diminuição da síndrome de privação.
Existem outros métodos que poderão apresentar alguma utilidade, em particular quando o grau de dependência não é muito elevado, como as aplicações para telemóvel, as linhas de apoio telefónico, os materiais informativos de autoajuda ou a oferta de vouchers e outros incentivos financeiros. Já a acupuntura, a hipnose, a auriculoterapia ou a estimulação por laser não têm comprovação científica reconhecida. Algumas pessoas, poderão conseguir deixar de fumar com recurso a estes métodos, devido ao designado efeito placebo, mas as recaídas habitualmente são elevadas.
Qual a importância do acompanhamento médico na escolha dessa terapêutica/método? É seguro o paciente fazê-lo sem qualquer tipo de ajuda?
O acompanhamento por parte do médico, ou por parte de outro profissional de saúde, aumenta o sucesso da cessação tabágica. A terapêutica de substituição de nicotina (adesivos de nicotina, gomas ou pastilhas) pode ser obtida sem prescrição médica. Em todo o caso é importante que a pessoa saiba usá-la e em que doses, porque pode ser ineficaz ou provocar efeitos indesejados se mal utilizada.
Os restantes fármacos de primeira linha para a cessação tabágica requerem prescrição médica obrigatória e só devem ser tomados com acompanhamento médico. É importante relembrar que muitas pessoas fumadoras sofrem de diversas doenças crónicas ou problemas de saúde mental que devem ser tidos em conta aquando da escolha do tipo de medicação a utilizar. Nestas situações é mandatório obter aconselhamento médico.
Existem riscos associados a quem pretende deixar de fumar sem qualquer tipo de medicação e ajuda médica?
Não. Deixar de fumar não tem riscos. Deixar de fumar tem benefícios para a saúde e reduz o risco de doença e de morte prematura. O único problema é que nos casos em se faz sem apoio a probabilidade de recaída é muito elevada, atrasando-se assim a possibilidade da abstinência definitiva.
Quais os principais sintomas de privação da nicotina experienciados por quem entra no processo de deixar de fumar?
Irritabilidade, ansiedade, nervosismo, momentos de vontade imperiosa de voltar a fumar, alterações do apetite, por vezes insónias, obstipação, dores de cabeça ou enxaquecas.
Qual a taxa de prevalência das recaídas em ex-fumadores? Quais os principais fatores que podem estar na sua origem?
As recaídas no primeiro ano após deixar de fumar são muito elevadas, em particular nos primeiros dois a três meses. O tabaco e a nicotina induzem uma dependência física, psicológica e comportamental que aumentam a necessidade de voltar a fumar. O grau de dependência e a síndrome de privação não se manifestam da mesma forma em todas as pessoas. Muitas conseguem deixar de fumar sem apoio. Contudo, decorrido um ano, menos de 5% das pessoas que tentaram parar sem apoio ainda se encontram sem fumar.
O tabaco eletrónico e tabaco aquecido são métodos alternativos para quem quer deixar de fumar?
Não. Os cigarros eletrónicos e o tabaco aquecido não são métodos cientificamente comprovados para deixar de fumar. Embora algumas pessoas possam conseguir quando mudam para os cigarros eletrónicos - que não contêm folha de tabaco na sua composição mas que é um produto que habitualmente contém nicotina - , muitas mantêm indefinidamente o seu consumo, não cessando a dependência da nicotina, e outras mantêm um consumo dual de ambos os tipos de produtos.
Quanto ao tabaco aquecido não existe comprovação científica de que seja eficaz na cessação tabágica.
De que forma é que este tipo de cigarros eletrónicos e tabaco tem minado os programas mundiais contra o tabagismo?
Este tipo de produtos tem sido promovidos como uma alternativa ao tabaco convencional menos nociva para a saúde, ou como produtos “limpos” e sem fumo. Este tipo de mensagens modifica a perceção do risco individual, podendo desincentivar muitos fumadores de deixarem de fumar e, em vez disso, induzi-los a mudar para estes novos produtos, mantendo-se assim a dependência da nicotina e a exposição a emissões tóxicas e cancerígenas, cujos efeitos na saúde a longo prazo ainda se desconhecem.
Por outro lado, o formato tecnológico e inovador dos cigarros eletrónicos, por exemplo sob a forma de pen drives ou canetas USB em cores atrativas, e a junção de aditivos e aromas de frutos ou doces, pode aumentar a sua atratividade junto dos mais jovens. Segundo a OMS, os jovens que experimentam cigarros eletrónicos duplicam o risco de virem também a fumar tabaco.
Quanto ao tabaco aquecido, está igualmente a ser promovido através de lojas e pontos de venda com um cunho moderno e tecnológico, em sites de venda online, em festivais e outros eventos juvenis, e nas redes sociais, o que contribuirá para a criação de novas gerações dependentes de tabaco e de nicotina.
Por que motivo é tão difícil deixar de fumar?
Porque a nicotina apresenta uma capacidade muito elevada de induzir dependência, comparável à da cocaína ou da heroína.
Para além da dependência química, o ato de fumar ou de usar produtos com nicotina está associado a crenças e expectativas pessoais, a sensações e emoções, bem como a diversos estímulos ambientais de incentivo ao consumo, que provocam condicionamentos comportamentais e sociais difíceis de alterar.
Dada a dificuldade em abandonar a dependência da nicotina, o melhor é nunca começar.
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