A Noruega é o maior produtor europeu de salmão. 69% do que é ingerido em todo o mundo é proveniente das águas frias e cristalinas do mar norueguês e é quase todo ele de aquacultura. Apesar de ser um dos peixes mais importados pelos portugueses, ainda que o consumo tenha decrescido ligeiramente nos últimos anos, continuam a ser muitos os que temem que os que são criados em cativeiro sejam alimentados com recurso a químicos, a fármacos e a antibióticos.

Para provar que (já) não é assim, o Conselho Norueguês dos Produtos do Mar convidou um grupo de jornalistas portugueses a ir lá. Estivemos nos viveiros, visitámos fábricas e ouvimos produtores, industriais e especialistas. Todos são unânimes. Ao contrário do que acontecia há 50 anos, o salmão norueguês pode ser, hoje, ingerido com total confiança. "A utilização de antibióticos é, atualmente, inexistente", garante Viggo Randal, funcionário de um dos viveiros.

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Filho de um dos primeiros empresários do setor, assistiu à profunda transformação que o negócio sofreu nas últimas décadas. "Em 1970, quando o meu pai começou, isto era um biscate de pescadores que procuravam uma forma de levar mais dinheiro para casa", recorda. À medida que o negócio familiar foi crescendo e a concorrência aumentando, a necessidade de uma maior profissionalização levou-o a vender as duas empresas que criou. Nessa altura, as regras eram (muito) diferente das de hoje. "A remoção dos piolhos-do-mar, nos viveiros, era feita com químicos", admite, sem pudores, Viggo Randal.

"Hoje, fazêmo-lo com um pouco de água morna. Cada peixe é lavado individualmente. A forma que agora usamos é melhor mas, como o processo é muito manual, temos de ter cuidado para não deixar marcas dos dedos no peixe. Muitas pessoas falam na utilização de antibióticos na aquacultura mas nós, nesta empresa, já não os usamos desde 1995. Essa não é uma opção válida para nós. A vacinação e os tratamentos que fazemos não são nocivos", garante Viggo Randal.

"Na década de 1990, houve problemas, chegaram mesmo a morrer pessoas mas, hoje em dia, a atividade está muito mais profissionalizada. Os peixes produzidos são vacinados antes de serem introduzidos nos viveiros. Temos boas vacinas, que são verdadeiramente eficientes", acrescenta ainda. "Os únicos que utilizaram antibióticos nos últimos anos foram apenas os viveiros que fazem investigação. Os de produção comercial não os usam", assegura mesmo Viggo Randal.

À semelhança de outros produtores e dos industriais do setor, o Conselho Norueguês dos Produtos do Mar também o garante. "A produção norueguesa de salmão-do-atlântico reduziu drasticamente o uso de antibióticos. Desde 1987, esta redução atingiu uns impressionantes 99%. Cada tonelada [1.000 quilos] contém apenas 0,14 gramas", esclarece este organismo oficial. "Esta é uma área de negócio muito regulada na Noruega", refere Geir Hovlandsdal.

"As licenças são muito restritivas. Foram dadas cerca de 900 e, neste momento, não estão a atribuir mais", informa o coordenador de qualidade da Firda Seafood, uma das empresas que exportam salmão e bacalhau para Portugal. "Nos últimos sete anos, a produção estabilizou. As autoridades deixaram de emitir licenças e estão a privilegiar as empresas que estão a usar novas tecnologias e métodos de produção mais sustentáveis", assegura o especialista norueguês.

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Antes de serem vacinados e transferidos para os viveiros marinhos, os salmões que nasceram dos ovos que as empresas produtoras compram são mantidos em aquários protegidos. Esse processo demora entre seis a doze meses e, durante esse período, há um trabalho de monitorização que é desenvolvido. "Se necessário, vamos ajustando os parâmetros da água, como é o caso da temperatura. No mar, não podemos fazer isso", sublinha Lina Braanaas.

Bióloga marinha especializada em aquacultura, é a diretora de qualidade da Firda Seafood. "O material genético do nosso salmão é proveniente do do salmão selvagem. Selecionámos uma série de características que pretendíamos ter e uma delas é a resistência a doenças e parasitas", esclarece a especialista. A seleção foi feita através de um processo de avaliação. Não houve manipulação genética, outro dos receios de muitos dos consumidores que apreciam este peixe.

"A manipulação genética não é permitida na Noruega. Aqui, não é permitido manipular comida. Também não podemos utilizar soja que tenha sido manipulada. A ideia de que existe é um mito. É tudo muito controlado", insiste Viggo Randal. "Este setor é muito regulamentado no nosso país. Todos os anos, as autoridades governamentais fazem mais de 12.000 análises e verificações mensais para confirmar a existência de antibióticos", confirma Agnethe Lodoen.

A comercial é diretora de vendas europeia da Seaborn, outra das empresas que, à semelhança da Firda Seafood, produzem e exportam salmão-do-atlântico fresco para Portugal. "Nos últimos 14 anos, nunca detetaram qualquer presença de antibióticos no peixe", sublinha Knut Marius Skjerve, o funcionário do Conselho Norueguês dos Produtos do Mar, que acompanhou os jornalistas portugueses durante a visita, confirmando as garantias dadas pelos produtores.

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Para além do uso de antibióticos, outro dos mitos prende-se com a quantidade de peixes que muitos creem que se amontoa nas unidades de produção circulares usadas na aquacultura. "Todos os viveiros marinhos da Noruega são sustentáveis e dispõem de muito espaço para os peixes se movimentarem. Apenas 2,5% do volume dos tanques é constituído por peixe, os restantes 97,5% são água", atesta um documento do Conselho Norueguês dos Produtos do Mar.

"Nunca há mais de 10 quilos de peixe por cada 1.000 litros de água", garante Viggo Randal. "Aqui neste viveiro, há 200.000 salmões, cada um com cerca de 2,5 quilos em média. São cerca de 500 toneladas de salmão. Mas, como estamos a falar de estruturas muito largas com 30 metros de profundidade, há muito espaço para os peixes poderem circular livremente. Não os veem aí a saltar de um lado para o outro? A mim, parecem-me felizes", desabafa o especialista.

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"Nos nossos, são 10 quilos de peixe por metro quadrado de água", avança Tore Samuelsen, diretor de qualidade da Seaborn. "As pessoas pensam que eles têm pouco espaço mas isso é um mito. É mais do que suficiente", refere Agnethe Lodoen. "Eles gostam de estar em grupo. Muitas vezes, estão todos juntos num sítio e o resto do tanque está vazio. Muitas das fotografias são tiradas quando eles estão a ser alimentados e dá a impressão que estão todos amontoados mas, na realidade, não é isso que acontece", garante Tore Samuelsen, que também põe as mãos no fogo pela qualidade da alimentação dos peixes.

"São alimentados através de um sistema de ar pressurizado. 70% do que ingerem é de origem vegetal, como é o caso das favas e dos feijões que lhes damos. Os restantes 30% são restos de peixe. 22% são pedaços que não seriam de consumo humano e 8% são sobras das postas e dos filetes que cortamos para comercializar. Há uns anos, 80% do alimento do salmão era peixe. Hoje, não vai além dos 30%. A legislação é muito rigorosa. Isto é tudo muito controlado", diz.

"Todos os ingredientes que ingerem são certificados e sabemos que são sustentáveis. Parece comida para cão mas cobre todas as necessidades do salmão-do-atlântico. É muito rica em vitaminas e minerais", afirma Tore Samuelsen. "400 toneladas de alimento dão para pouco mais de uma semana", esclarece Viggo Randal. "Alimentamos o nosso salmão apenas com granulado limpo e de elevada qualidade", garante o Conselho Norueguês dos Produtos do Mar.

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A frescura é garantida. Depois de apanhado e transferido para a unidade fabril, o peixe é morto com uma descarga elétrica e, rapidamente, amanhado manualmente. Depois de limpo, é pesado e avaliado. Se reunir todas as condições de qualidade, é embalado em caixas com gelo e começa de imediato a ser distribuído. "Em menos de 12 horas, pode estar na mesa. Em muitos dos países para onde exportamos chega ao destino em menos de 24 horas", refere Geir Hovlandsdal.

A Noruega exportou, no primeiro semestre de 2019, 506.000 toneladas de salmão-do-atlântico. Só nesse período, o país faturou 34,6 mil milhões de coroas, o que equivale a cerca de 3,4 mil milhões de euros. A Polónia, a França e a Dinamarca foram os maiores importadores de salmão norueguês nesse intervalo. Portugal também figura na lista dos principais mercados. Em 2018, o país importou de lá 56.656 toneladas de salmão. De bacalhau, vieram para cá apenas 11.556.