Qual a causa?
A causa do cancro da tiroide é desconhecida, mas alguns fatores de risco foram identificados e incluem:
- idade entre os 25-62 anos
- história familiar de bócio (aumento da tiroide, formando nódulo, caroço na região do pescoço)
- exposição a níveis elevados de radioatividade
- tratamentos com radiação da cabeça ou pescoço na infância - alguns síndromes hereditários.
Quais as características deste cancro?
Os carcinomas da tiroide podem ser:
- bem diferenciados (mais de 90% dos tumores malignos da tiroide) – Papilar e Folicular - Medular
- pouco diferenciados
- indiferenciados – Anaplásico
O prognóstico depende do grau de diferenciação sendo que o carcinoma papilar – o mais frequente dos carcinomas da tiroide – tem uma sobrevida de 98% aos 5 anos (segundo o National Cancer Institute), o que quer dizer que ao fim de 5 anos de devidamente tratados, 98% destes doentes estão vivos.
Pode alastrar para mais regiões do corpo?
Não nos podemos deixar enganar pelo curso indolente que, habitualmente, apresentam estes tipos de tumores, uma vez que, quando não tratados, podem metastizar para outros lados como os gânglios do pescoço, pulmão ou ossos.
O tratamento deve ser decidido em reunião multidisciplinar por um grupo de especialistas que engloba endocrinologistas, cirurgiões endócrinos, radiologistas, anatomopatologistas e depende do tipo de tumor e do seu estadio a quando do diagnóstico.
Como é tratado?
Especialistas de todo o mundo reuniram-se e definiram guidelines (linhas de orientação) para o tratamento do cancro da tiroide.
Simplificando, o tratamento do cancro da tiroide é primariamente cirúrgico e compreende uma tiroidectomia total (tirar a tiroide toda) ou uma hemitiroidectomia (tirar o lado onde está o tumor e o meio - istmo), dependendo do tipo de tumor e das suas dimensões, da existência ou não de nódulos suspeitos no lado contrário ao tumor, da existência ou não de invasão loco-regional ou à distância.
Na atualidade, a tendência é ser mais conservador mas pode ser necessário tirar os gânglios do pescoço – os chamados esvaziamentos ganglionares cervicais – se estes estiverem invadidos ou se o tumor for muito grande. É uma cirurgia frequente no caso dos carcinomas papilar e medular.
Posteriormente à cirurgia, nalguns casos de doentes com carcinomas bem diferenciados (papilar ou folicular), pode ser necessário fazer um tratamento complementar com Iodo radioativo (I131). Este tratamento é um tipo de radioterapia oral, que é dirigida especificamente às células tiroideias que são as únicas do corpo humano com capacidade de concentrarem iodo no seu interior. Este tipo de tratamento permite “limpar” totalmente a zona, onde anteriormente estava a tiroide, de alguma quantidade mínima de células tiroideias que tenham ficado após a cirurgia e que não eram visíveis a olho nu, melhorando assim as condições locais de vigilância da doença e reduzindo a probabilidade de retorno e morte pelo tumor.
Após a cirurgia do carcinoma é necessário fazer medicação – hormona tiroideia, em doses um pouco acima das habitualmente necessárias para o peso dos doentes, não por alguns doentes terem ficado sem toda a tiroide, mas, essencialmente, com o objetivo de bloquear o eixo central a nível cerebral (hipófise), de forma a bloquear a produção de TSH que tem uma ação estimuladora sobre a proliferação de células foliculares da tiroide. É a chamada terapêutica hormonal supressiva que assim evita que alguma quantidade mínima de células que ficaram após cirurgia possa vir a crescer, evitando futuras recidivas.
Mitos e verdades
Depois de ser operada, vou ficar sem falar - Mito, mas....
A literatura internacional realça a disfonia (rouquidão) como sendo umas das complicações mais frequentes na cirurgia tiroideia, que pode ir até aos 7% em mãos menos experientes e no caso dos carcinomas ou bócios muito grandes. Neste sentido, assume particular importância a abordagem multidisciplinar desta patologia e o envolvimento dos colegas de otorrinolaringologia para um estudo da voz, pré e pós cirurgia, que permita identificar, por um lado, lesões prévias à cirurgia decorrentes da compressão do tumor sobre o nervo laríngeo recorrente (que dá a tonalidade da nossa voz) e que permitirá ao cirurgião programar a cirurgia recorrendo à utilização de um neuroestimulador para identificação do nervo intraoperatoriamente e, por outro lado, identificar lesões pós cirurgia, o que possibilita ao doente a realização de terapia da fala.
Recordo uma cantora que operámos a um carcinoma papilar da tiroide e que ficou curada mantendo a função e a qualidade de vida.
Tenho um cancro da tiroide. Vou ter que fazer quimioterapia – Mito, mas...
A quimioterapia ou a radioterapia não são habitualmente tratamentos de escolha no carcinoma da tiroide, ficando reservados para casos de não resposta ou para o carcinomas medular (radioterapia) e anaplásico
O cancro da tiroide é uma coisa só das mulheres - Mito
Quando um homem tem um nódulo da tiroide, as hipóteses deste nódulo ser maligno são maiores, apesar da prevalência de nódulos da tiroide ser maior nas mulheres. Lembro-me, em particular, de um senhor que operei em 2018 e que foi surpreendido por um resultado de carcinoma papilar na biópsia que fez à tiróide - que já estava num estado mais avançado pois invadia os gânglios. Uma tiroidectomia total com necessidade de retirar os gânglios do pescoço foi o tratamento necessário. Seguiu-se a realização de terapia com iodo radioativo como tratamento complementar. Agora a única coisa que o relembra de que um dia teve um cancro é o comprimido que toma todas as manhãs e as consultas de rotina.
Há doentes que são operados duas vezes – Verdade
Posso dar o exemplo recente de uma jovem que operei inicialmente a uma lesão suspeita só tirando metade da tiroide. Posteriormente o resultado foi de um carcinoma papilar com características anatomo-patológicas que, segundo os guidelines internacionais, constituía critérios de maior gravidade, pelo que foi necessário realizar a totalização da tiroidectomia (retirar o resto da tiroide), para posterior tratamento com iodo radioativo.
Raio-X e mamografia podem causar cancro da tiroide – Mito
Quando na consulta perguntamos ao doente se esteve exposto a radiação, referimo-nos à exposição a níveis elevados de radioatividade ou à necessidade de ter realizado tratamentos com radiação da cabeça ou pescoço na infância. Estes sim, constituem fatores de risco para desenvolver carcinoma da tiroide.
O iodo-radioativo faz cair o cabelo - Mito
Como efeitos secundários deste tratamento estão descritos: aumento da sensibilidade no pescoço, náuseas e vómitos, inchaço e sensibilidade nas glândulas salivares, boca e olhos secos, alterações do paladar. Não há estudos científicos que associem a queda de cabelo a este tratamento.
Um artigo da médica Ana Alves Rafael, cirurgiã geral na Clínica CUF Miraflores e Hospital CUF Sintra.
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