O bastonário da Ordem dos Médicos, Miguel Guimarães, foi hoje ouvido na comissão parlamentar de Saúde como antigo coordenador do grupo técnico independente criado pelo Ministério da Saúde para avaliar os sistemas de gestão das listas de espera, tendo este grupo concluído que a Administração do Sistema de Saúde “limpou” doentes das listas de espera para consultas, numa altura em que era presidida pela atual ministra, e que foram usados indevidamente mecanismos para alterar datas de inscrição de utentes para cirurgia.

“Só agora [em meados de abril] foi tornado público. É muito tempo. É demasiado tempo. Eu, como coordenador, nunca fui convocado para dar alguma explicação sobre o relatório, nomeadamente pelo Ministério da Saúde. Seria interessante discutir estas questões com o Ministério. Mas isso nunca aconteceu desde que entregámos o relatório em julho ou agosto de 2018”, afirmou Miguel Guimarães.

O bastonário respondia a uma questão levantada pelo deputado do PSD Ricardo Batista Leite, que lamentou que o parlamento só tivesse tido acesso ao relatório do grupo técnico “10 meses depois da sua elaboração”.

Miguel Guimarães reiterou que o grupo independente detetou limpeza de doentes de listas de espera para consultas, tal como já tinha indicado o Tribunal de Contas, mas recusou fazer uma “avaliação das intenções” e disse ser incapaz de indicar se houve dolo nessas limpezas ou expurgos.

O grupo técnico independente (GTI) foi criado pelo Governo em outubro de 2017 para avaliar os sistemas de gestão das listas de espera para consultas e cirurgias, após um relatório do Tribunal de Contas que apontava para a “eliminação administrativa” de utentes, “falseando os indicadores” que são divulgados.

Foram analisados os sistemas das listas de espera para consultas e cirurgias no triénio 2014-2016, concretamente a atuação da Administração Central do Sistema de Saúde (ACSS), que em 2016 era presidida pela atual ministra Marta Temido.

Segundo o relatório, que foi tornado público em meados de abril deste ano, foram tomadas medidas de limpeza ou expurgo de listas de espera de consultas, sem que tenha sido, contudo, possível perceber o real impacto que “o expurgo” teve sobre a redução efetiva do tempo médio de espera.

A dificuldade de ter o impacto real dessa limpeza de listas acontece, segundo o documento, porque a ACSS não forneceu elementos que permitissem avaliar algumas questões fundamentais, como por exemplo quantos doentes em concreto foram “simplesmente eliminados das listas de espera”.

Hoje, na comissão parlamentar de Saúde, o coordenador do grupo apontou para deficiências na fiabilidade dos dados dos sistemas de saúde e considerou factual que houve limpeza de doentes das listas de espera.

Miguel Guimarães entende que o Ministério da Saúde “já devia há muito ter começado a trabalhar” nas conclusões e recomendações que foram feitas pelo Tribunal de Contas e pelo grupo técnico, sugestões essas que apontam para a necessidade de melhorar os sistemas.

Em declarações à agência Lusa no final da comissão, o bastonário referiu que "não é aceitável que se façam relatórios com recomendações e que nada depois aconteça"

"Não basta apenas passar uma esponja sobre isto", afirmou.