Da acusação consta que um casal manteve os filhos em cativeiro entre 2007 e 2015 e colocou grades à volta de casa, presas a cadeado, para impedir que tivessem contacto com o exterior.
As vítimas, já adultas, foram resgatadas pelos bombeiros em junho do ano passado (com 41 e 39 anos), em estado de desorientação em relação ao espaço e ao tempo.
A mãe está acusada dos crimes de sequestro qualificado e de violência doméstica contra os dois filhos, três crimes de ameaça agravada e quatro crimes de ofensa à integridade física qualificada contra vizinhos e um militar da GNR.
O pai das vítimas, arguido também no processo, acusado de dois crimes de sequestro qualificado e outros dois de violência doméstica, não compareceu na audiência, desconhecendo-se o seu paradeiro.
Na primeira audiência de julgamento, hoje realizada no Tribunal de Cascais, constatou-se que os dois relatórios de análise psíquica, elaborados por dois médicos diferentes, não coincidiram nas conclusões, tendo um deles considerado a arguida inimputável e outro não.
Um dos especialistas, que elaborou a sua avaliação a 11 de novembro de 2015, apurou, e reiterou hoje em tribunal, que a arguida sofre de uma psicose paranoide e deve ser considerada inimputável.
"Há uma psicopatologia que vai fazer com que ela tenha determinadas ações. O facto de achar que era perseguida pelos vizinhos explica a necessidade de proteção aos filhos de perigos exteriores, reais ou imaginários. Não me parece que seja uma pessoa que queira fazer mal aos filhos", referiu na sessão.
Já a outra perita, que realizou a sua avaliação a 22 de dezembro de 2015, concluiu que a arguida sofria de um "atraso mental ligeiro que não representa perturbação psiquiátrica major".
"À data dos factos não padecia de nenhuma doença psíquica grave, não é perigosa e não requer inimputabilidade", indicou a juíza presidente.
Durante a manhã, a arguida declarou que "é tudo mentira, uma infâmia e provocação" e assegurou que os filhos eram bem tratados.
Uma das testemunhas hoje ouvidas disse ter avistado o pai das vítimas na sua casa, tendo a juíza ordenado que se proceda a um mandado de detenção para "assegurar que o arguido comparece na próxima sessão" de julgamento.
Além disso, a juíza requereu que fosse marcado no Instituto de Medicina Legal um exame psíquico ao arguido.
Segundo a acusação, depois de dois anos de cativeiro dos dois filhos, em 2009 o mais velho, na altura com 35 anos, foi fechado numa divisão da casa, com três metros quadrados, com uma porta de grades trancada com correntes e cadeado, sem luz natural, iluminação artificial ou isolamento térmico, "idêntica a uma cela".
"Durante esse período, os arguidos obrigaram o ofendido a dormir num colchão de espuma velho, colocado diretamente sobre o chão da divisão, sem lençóis e apenas com uma manta, alimentaram-no nesse espaço e forçaram-no a satisfazer as necessidades fisiológicas num balde, que só trocavam ocasionalmente", lê-se.
Por sua vez, a defesa da arguida considera que esta deve ser considerada "inimputável para os efeitos criminais" e requer que seja realizado um segundo exame pericial às suas faculdades mentais para apurar a gravidade da sua anomalia psíquica.
Aquando da detenção, a arguida ficou em prisão preventiva, tendo sido decretada pelo Ministério Público a substituição da medida de coação pelo internamento preventivo em hospital psiquiátrico.
Os filhos do casal foram institucionalizados, tendo a filha mais nova morrido no mês passado.
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