“Um referendo sobre direitos individuais é virar a democracia de pernas para o ar, é virar a democracia contra ela própria”, escreveu João Semedo em resposta à agência Lusa, considerando que referendar direitos individuais “não é democrático”, embora o pareça.

É antes, disse, “admitir que um direito que é de todos possa ser retirado por alguns”: “Alguém admitiria ou acharia democrático fazer um referendo em que o direito de todos à saúde ou ao trabalho, por exemplo, fosse retirado da lei por decisão de alguns?”

“A defesa do referendo pretende evitar a discussão. Evitar a discussão para, em vez de discutirmos a problemática do fim da vida, a forma e as condições em que morremos, passarmos o tempo a discutir se deve ou não haver referendo”, declarou à agência Lusa o antigo deputado e coordenador bloquista, que é um dos mais de 100 subscritores do manifesto que pretende lançar o debate sobre a despenalização ou legalização da morte assistida.

Para Semedo, o debate sobre a morte assistida ainda agora começou, mas fica já claro que “quem quer o referendo, não quer o direito à morte assistida mas não quer assumir com transparência o que pensa”.

Referendos para "perder tempo"

“Nós [o movimento que deu origem ao manifesto] queremos discutir os problemas da morte, não queremos perder tempo a discutir politiquices. Não é a primeira vez que o referendo é usado pelo PSD como forma de adiar um problema”, referiu o médico num comentário escrito à Lusa, recordando o caso da adoção e coadoção por casais do mesmo sexo, situação em que o referendo “inventado pelo PSD só serviu para o país perder tempo”.

O antigo coordenador do Bloco não tem dúvidas de que “é ao parlamento que cabe aprovar o direito à morte assistida”: “os deputados foram eleitos para resolver os problemas do país e das pessoas, não foram eleitos para devolverem os problemas sem os resolver. Estamos na União Europeia sem qualquer referendo, estamos no Euro e também não houve referendo, não ouvi até hoje essas vozes incomodadas porque os portugueses não foram ouvidos sobre o Euro e a UE”.

Sobre o argumento de que as eleições foram há pouco tempo e a eutanásia não constava dos programas eleitorais, Semedo lembra que o direito à morte assistida é um antigo compromisso eleitoral do Bloco de Esquerda.

“A Bélgica, o Luxemburgo e a Holanda deixaram de ser países democráticos porque legalizaram a morte assistida sem referendo? A resposta é óbvia, claro que não”, rematou o médico e político João Semedo.