O estudo analisou “Perceções da população residente na cidade de Lisboa sobre a importância dos primeiros anos de vida (0-6 anos) no desenvolvimento da criança” e, em declarações à Lusa, o coordenador apontou como possível explicação aquilo que as pessoas acreditam que são as consequências da pobreza.
“A pobreza em si, tal como a riqueza, não favorece nem desfavorece o desenvolvimento infantil. O problema é que as pessoas que vivem em [situação de] pobreza têm, por isso, piores condições de habitação, menores possibilidades de ter uma alimentação saudável, menor instrução ou menor informação sobre os serviços que existem de apoio”, apontou o professor Fausto Amaro, do ISAVE – Instituto Superior de Saúde, acrescentando que por estas razões, existe “a probabilidade de as pessoas adoecerem mais”.
Fausto Amaro salientou que este conjunto de fatores “não são positivos para o desenvolvimento”, motivo pelo qual acredita que as 300 pessoas inquiridas em Lisboa nomearam a pobreza como o que mais prejudica a infância.
Com uma percentagem próxima (87,7%), surgem as situações de conflito e violência na família ou os problemas de saúde mental dos pais (86%), havendo também quem eleja a exposição a ecrãs durante muito tempo (71%).
Por outro lado, 90% dos inquiridos que participaram no estudo financiado pela Fundação Nossa Senhora Bom Sucesso, uma instituição de solidariedade que trabalha em prol da saúde infantil, reconhecem que o tempo que os pais dedicam aos filhos é benéfico para o desenvolvimento infantil, tal como as crianças brincarem com outras crianças.
O coordenador do estudo salientou que “brincar com outras crianças é um fator importantíssimo no desenvolvimento infantil”, à semelhança do tempo dedicado pelos pais ou outros cuidadores.
Fausto Amaro apontou que esse relacionamento pode ser positivo ou negativo e que, por isso, deve ser feita pedagogia com os pais sobre o tipo de relacionamento que devem ter com os filhos.
“Os dados científicos atuais o que dizem é que é fundamental para as crianças estabelecerem um vínculo com as pessoas que cuidam delas e este fenómeno de vinculação é determinado, sobretudo, a partir dos sete meses de idade”, explicou, acrescentando que não se trata apenas de alimentar a criança, mas cuidar e proteger e que se isto não acontecer “pode haver um mau desenvolvimento da criança”.
O responsável explicou que o cérebro das crianças desenvolve-se muito rapidamente na infância, sobretudo nos primeiros três anos, sendo que aos cinco anos já atingiu um nível de cerca de 90% de desenvolvimento.
“A estimulação sensorial é importante, mas é fundamental o aspeto afetivo”, destacou, apontando que o estudo revela que “as pessoas ignoram o papel do cérebro no desenvolvimento infantil”.
De facto, apenas 35,7% dos inquiridos demonstraram saber em que idade ocorre o maior desenvolvimento do cérebro da criança. No entanto, 91% defenderam que deve ser dada uma maior atenção ao desenvolvimento infantil.
No geral, 88,3% acreditam que um bom ambiente familiar e social é importante para uma infância saudável e feliz, enquanto apenas 5,7% dão importância a frequentar a creche ou o jardim-de-infância.
O inquérito revelou também que, no que diz respeito ao papel e à importância de frequentar a creche ou o jardim-de-infância, 79,7% acreditam que a creche serve sobretudo para tomar conta das crianças enquanto os pais estão a trabalhar, enquanto 83,3% dos inquiridos acham que o jardim-de-infância serve para estimular as crianças.
Para que os pais possam ter mais tempo com os filhos, 60,7% defenderam melhores condições de vida e 55% pediram horários de trabalho mais flexíveis, enquanto 47% defenderam melhores horários e maior apoio económico às famílias (46%) para melhorar a situação das crianças em Portugal.
Para o coordenador do estudo, os resultados demonstram que “a população de Lisboa tem uma ideia do que é importante no desenvolvimento infantil, mas ainda há uma faixa da população que deve ser esclarecida”.
O inquérito foi realizado com entrevistas presenciais a 300 pessoas com mais de 20 anos, com uma amostra aleatória, estratificada por tipo de freguesia, e tem um erro estimado de 6%, num nível de confiança de 95%. Os dados são apresentados hoje, em Lisboa, na Fundação Calouste Gulbenkian.
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