Uma vez que ainda não há cura para a artrite reumatoide, alcançar o estado de remissão da doença, isto é, a ausência completa de atividade inflamatória, é fundamental para os doentes e para os médicos. Para definir esse estado de remissão, um dos indicadores usados na clínica é a Avaliação Global pelo Doente (PtGA), reportada pelo paciente sobre o seu estado. No entanto, é um indicador que depende da interpretação do doente, podendo afetar o tratamento.

Segundo as normas internacionais estabelecidas para o tratamento da artrite reumatoide, apoiadas pelas associações europeia e americana de reumatologia, a remissão da doença exige que não exista mais do que uma articulação dolorosa ou inflamada e que e avaliação global pelo doente seja, no máximo, de 1, numa escala analógica de zero a 10.

Os investigadores quiseram analisar qual o impacto da avaliação global pelo paciente na obtenção do estado de remissão em doentes com artrite reumatoide. Para tal, foi realizada um meta-análise a oito estudos nacionais e internacionais, refletindo ensaios clínicos e contextos de prática clínica corrente, com dados de 23297 doentes.

Os resultados obtidos neste estudo permitem concluir que a avaliação global pelo doente "é a principal causa isolada de não atingimento do estado remissão. Com efeito, apreciando os resultados destes estudos, incluindo dois da nossa autoria, concluímos que 12% dos 23297 pacientes atingiam remissão completa, enquanto 19% a falhavam apenas pela avaliação global reportada pelo doente", relata José António Pereira da Silva.

José António Pereira da Silva, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e diretor do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC).
José António Pereira da Silva, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e diretor do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC). José António Pereira da Silva, professor da Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra (FMUC) e diretor do Serviço de Reumatologia do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (CHUC) créditos: UC

Considerando que, em estudos anteriores, já tinha sido demonstrado que "a avaliação global pelo doente não traduz, nestas circunstâncias, a presença de inflamação persistente, antes estando relacionada com doenças concomitantes, dores de outra origem e estados depressivos, estes resultados indicam que uma parte muito significativa dos doentes com artrite reumatoide estará a receber tratamento em excesso, se forem seguidas as recomendações internacionais, visto que a circunstância que impede o atingimento do alvo terapêutico não é passível de melhoria por tratamento dirigido à artrite reumatoide", explica o catedrático da FMUC.

Ou seja, reforça, "esta avaliação global da doença pelo paciente impede, inadequadamente, que uma percentagem elevada de doentes atinja o alvo terapêutico de remissão, colocando-os assim em risco de tratamento excessivo". Segundo as diretrizes internacionais estabelecidas, "caso a remissão não seja atingida, o tratamento deve ser reforçado. Isto justifica-se porque a remissão corresponde ao melhor resultado sintomático e também à melhor garantia de preservação a longo prazo da integridade estrutural das articulações e da capacidade funcional do doente".

Este estudo, distinguido no Congresso Europeu de Reumatologia 2020, que decorreu recentemente em formato online devido à atual crise pandémica, insere-se «num movimento com forte impacto internacional, liderado pelo Serviço de Reumatologia do CHUC, no sentido de rever as definições internacionais de remissão e alvo terapêutico nesta importante condição clínica», refere ainda José António Pereira da Silva.