A infertilidade afeta populações em todo o mundo. Em Portugal, cerca de 15% dos casais em idade reprodutiva sofre de infertilidade.
Três anos é a média de tempo que as mulheres que pretendem engravidar têm de esperar por uma resposta do banco público do Serviço Nacional de Saúde (SNS). Esta lista de espera é largamente justificada pela ausência de mulheres doadoras de ovócitos em número suficiente.
As mulheres saudáveis, entre os 18 e os 34 anos, podem tornar-se doadoras, mas há ainda um desconhecimento sobre o processo da doação.
Muitas mulheres não sabem que a doação tem uma compensação financeira, pode ser feita mais do que uma vez, não afeta a sua fertilidade, é tendencialmente indolor, e que é um procedimento com vigilância médica pré, pós e durante a preparação da doação. Faltam tantas doadoras como informação e conhecimento sobre todo o processo.
Conversámos com a médica Catarina Godinho, ginecologista e especialista em Medicina da Reprodução do IVI Lisboa, para esclarecer dúvidas e desmistificar questões relacionadas com a doação de ovócitos.
A falta dadoras de ovócitos em Portugal pode estar associada a tabus à volta do processo?
Acredito que a doação de óvulos já não é um processo tabu em Portugal. E acho que o papel dos profissionais de saúde é a chave para divulgar esta possibilidade e quebrar mitos que ainda possam existir. É sobretudo neste campo da divulgação que ainda podemos melhorar. É preciso que as mulheres jovens saibam que é possível doar e conheçam os sítios a que podem recorrer para obter mais informação. A decisão de doar óvulos deve ser tomada de forma informada e por isso é muito importante as candidatas terem acesso fácil a essa informação.
Qual a realidade noutros países europeus?
O acesso a tratamentos procriação medicamente assistida varia segundo as leis vigentes nos países. Onde é possível doar óvulos, é porque as beneficiárias têm acesso a tratamentos de fecundação in vitro em que é preciso recorrer à ovodoação. Observamos realidades diferentes nos vários países onde estamos. Mas há um denominador comum e que nos mostra que é mais fácil tomar a decisão de doar quando há um trabalho prévio de sensibilizar para a causa da infertilidade e se explica que é possível doar para ajudar quem não consegue engravidar de forma espontânea. Focar no outro, no facto de estarem a ajudar e explicar que a doação não tem implicações na própria fertilidade da dadora, são percebidos como argumentos de muito valor.
Como funciona o processo de doação?
Nas nossas clínicas, as dadoras fazem gratuitamente uma avaliação ginecológica, análises de sangue, cariótipo e exames de genética. Esta informação será útil no futuro, se decidirem ser mães. Entre os exames realizados encontram-se:
- Avaliação ginecológica: realizamos uma avaliação ginecológica com ecografia para avaliar o funcionamento dos ovários.
- Consulta de Psicologia: perguntamos sobre os antecedentes pessoais e familiares, sobre as motivações para o processo, abordamos a fase de vida atual e o estilo de vida.
- Serologia: análises de sangue para descartar qualquer infeção sexualmente transmissível.
- Cariótipo: exame de sangue que mostra qual é o mapa dos cromossomas.
- Análises de Genética: consoante necessidade podemos analisar mais de 600 doenças genéticas.
As mulheres são recompensadas pela doação. É um processo simples?
É um processo simples e que não tem qualquer custo para as doadoras. A Lei Portuguesa determina que a doação de óvulos seja um processo voluntário, de carácter benévolo, em que as dadoras são ressarcidas pelas despesas efetuadas ou prejuízos direta e imediatamente resultantes das suas dádivas num valor máximo de 885 euros.
É um procedimento seguro? Não afeta a fertilidade da dadora?
O tratamento da dadora é personalizado e monitorizado com rigor e frequência para minimizar qualquer risco. Geralmente, o processo de doação de óvulos é tolerado pelas mulheres de forma satisfatória. Ainda que possam ocorrer alguns riscos de uma forma excecional como: síndrome de hiperestimulação ovárica (que consiste numa resposta exagerada ao tratamento), infeção, hemoperitoneu ou torção ovárica.
A doação não afeta a possibilidade de engravidar?
É importante explicar, que doar óvulos não tem implicações se a mulher quiser engravidar no futuro. Ao doar não significa que os óvulos se esgotem ou que se acelere a perda de óvulos. Uma mulher nasce com uma carga de 500.000 a 1.000.000 de óvulos. Desde o nascimento, vão-se perdendo óvulos, que morrem à medida que o tempo avança e depois com as menstruações. Em cada ciclo normal começam a crescer vários óvulos, mas no fim somente um alcançará o crescimento suficiente para chegar a ovular. Com o tratamento, conseguimos que vários alcancem o tamanho adequado para amadurecer sem afetar o total de óvulos que a mulher possui. Neste sentido não há qualquer alteração da idade da menopausa.
A dadora pode engravidar na menstruação seguinte ao tratamento de doação de óvulos.
Quantas vezes se pode ser dadora?
A Lei Portuguesa permite quatro doações, com um intervalo de três meses entre si.
A infertilidade é um problema comum em homens e mulheres?
A prevalência da infertilidade conjugal é de 15-20% na população em idade reprodutiva.
Por definição, depois de um ano de relações sexuais regulares sem que estas resultem em gravidez, pode começar-se a suspeitar da existência de alguma alteração. Em idades mais avançadas recomenda-se uma consulta passados seis meses de relações sexuais sem conseguir uma gravidez.
Note-se que a espécie humana não tem um alto poder reprodutivo, fala-se de 25% de possibilidade de gravidez na relação sexual mantida durante a ovulação de uma mulher. Estas percentagens dizem respeito a mulheres menores de 35 anos. A partir dessa idade o potencial reprodutivo diminui e, depois dos 40 anos, a possibilidade de gravidez por mês é inferior a 10%.
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