
A Organização Mundial de Médicos de Família (WONCA), assinala a 19 de maio o Dia Mundial do Médico de Família. Esta efeméride não tem fronteiras sendo celebrada à escala global com iniciativas promovidas por membros da WONCA, individuais e coletivos, para sublinhar a importância da Medicina Geral e Familiar na melhoria da saúde das comunidades, como fator de coesão social.
Este ano o lema proposto pela WONCA - “Construir Resiliência Mental num Mundo em Transformação” - remete para um dos maiores desafios nos cuidados de saúde do século XXI. Os médicos de família, integrados em equipas robustas de Cuidados de Saúde Primários, são um elemento essencial na coordenação de sistemas complexos garantindo o bem-estar mental da população. A OMS considera que esta função de coordenação constitui mesmo o eixo dos sistemas de saúde, no qual cuidados integrados em proximidade e continuidade centrados nas pessoas são apontados per se como força motriz de uma engrenagem maior.
O papel dos médicos de família nesta tipologia de cuidados tem ainda maior relevo em tempos de incerteza e de ansiedade global como os que se vivem atualmente. A Medicina Geral e Familiar tem como principal recurso a relação estabelecida entre médicos e pacientes, que em maior escala se traduz numa aliança das equipas de cuidados de saúde primários com a população. Este vínculo é terapêutico e fortalece uma ligação empática promotora de bem-estar emocional criando comunidades mais saudáveis e resilientes.
A Medicina Geral e Familiar é defensora intransigente destes princípios com a certeza de que só assim pode ser salvaguardada a dignidade humana na plena autonomia de cada pessoa que procura cuidados de saúde. Neste mundo em transformação o sofrimento alivia-se através da compaixão aliada ao rigor técnico-científico da prática clínica.
Construir resiliência mental não deve ter foco exclusivo nos pacientes. A incerteza e a ansiedade do mundo têm também impacto nos profissionais de saúde. A promoção do bem-estar emocional nas unidades prestadoras de cuidados é uma prioridade inadiável. Cuidar de quem cuida é um fator crítico para a segurança dos pacientes e qualidade da prática clínica. A WONCA sublinha também na efeméride deste ano a importância da saúde mental dos médicos de família, determinante para a sua realização profissional e sentido de vida ao serviço da população.
No Dia Mundial do Médico de Família subscrevemos as mensagens da WONCA, identificando-nos com a visão otimista que contraria os sinais do mundo em transformação. O nosso papel vai além da tecnologia e da inovação digital e perscrutamos a pessoa na sua dimensão psicossocial através da empatia e da abordagem do individuo inserido na sua família e comunidade. Temos o dever de reconhecer o sofrimento e dar esperança realista.
Estes pressupostos não são capital exclusivo da Medicina Geral e Familiar. Devem ser princípios e valores nos quais está assente a prática da Medicina. A relação com os nossos pacientes é um privilégio milenar que deve ser protegido com responsabilidade e transmitido às futuras gerações de médicos, tendo os médicos de família um papel fundamental na formação médica. As faculdades de medicina proporcionam o contacto dos estudantes com os Cuidados de Saúde Primários onde a aprendizagem de competências na comunicação e relação com os pacientes ganha maior profundidade e gera experiências pedagógicas marcantes.
Os futuros médicos são um reduto de esperança num futuro que dê sempre prioridade ao primado da relação médico-doente. Neles reconhecemos um potencial extraordinário para honrar os princípios da Medicina Hipocrática com profissionalismo e robustez ética. Serão eles a maior garantia de conciliação dos avanços tecnológicos com a dimensão humana, pedra basilar da nossa profissão e determinante principal para a saúde mental à escala global.
João Sequeira Carlos
Médico de Família e Coordenador da Rotação de Medicina Geral e Familiar da Católica Medical School
Imagem de abertura do artigo cedida por Freepik
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