“É obviamente uma síndrome respiratória, mas torna-se claro que numa percentagem das pessoas doentes provoca uma resposta inflamatória mais alargada, seja no sistema vascular seja em outras partes do corpo”, declarou hoje o diretor executivo do programa de emergências sanitárias da organização, o irlandês Michael Ryan.
Questionado sobre um estudo da universidade de Zurique que aponta para que a COVID-19 provoque uma inflamação sistémica dos vasos sanguíneos do corpo, Michael Ryan afirmou que também estão a verificar-se casos de “encefalite [inflamação do cérebro] e outros efeitos” em pessoas contaminadas com o novo coronavírus.
“É por isso que é tão importante recolher informação clínica por todo o mundo”, porque “os efeitos vasculares estão aí, são reais e precisam de ser mais estudados”, defendeu, acrescentando que as doenças emergentes que têm surgido “tendem a provocar uma reação muito mais disseminada que pode afetar vários órgãos”.
Por vezes é preciso passarem “dezenas ou até centenas de anos” para uma doença se tornar “endémica com um órgão a ser mais afetado do que outros”, exemplificando com o sarampo, que é normalmente entendida como uma febre com reação cutânea mas que “numa criança que não foi vacinada, que está mal nutrida”, pode afetar olhos, fígado ou o cérebro e provocar reações “bastante assustadoras”.
Contudo, ressalvou, a COVID-19 “ainda está a provocar principalmente uma síndrome respiratória, tragicamente repetida todos os dias em unidades de cuidados intensivos em todo o mundo”, com “danos comprovados nos tecidos pulmonares”.
Respondendo a outra questão sobre análises às águas residuais para aferir as taxas de anticorpos na população, Michael Ryan afirmou que se está a correr o risco de “procurar respostas para perguntas que não vão resolver o problema” da pandemia.
“Parece que estamos a querer evitar a desconfortável verdade de que precisamos é de regressar ao básico: vigilância baseada nos princípios de saúde pública”, declarou.
“Devemos voltar a onde devíamos ter estado há meses: encontrar casos, rastrear contactos, testar casos, isolar casos, pôr pessoas infetadas de quarentena”, considerou o epidemiologista.
Michael Ryan afirmou que a experiência tem mostrado que os países que conseguiram controlar a pandemia sem precisar de restrições em massa às movimentações da população o conseguiram com “vigilância agressiva seguindo quer os direitos humanos quer os princípios da saúde pública”.
É precisa uma “estratégia completa” para informar as pessoas dos riscos que correm e permitir-lhes reduzi-los e “sistemas de saúde fortalecidos” com capacidade para tratar dos casos que apareçam, defendeu, além de uma vacina, atualmente ainda em investigação.
Nos países que conseguiram controlar com sucesso a transmissão comunitária do vírus, reiterou que é preciso uma transição “lenta e controlada” para sair das restrições aplicadas à população, sob pena de voltarem a acontecer surtos, como no caso de Singapura, onde, referiu, levantadas as restrições, o vírus voltou a atacar, sobretudo em dormitórios onde vivem estrangeiros.
Numa altura em que se aproxima o verão, tradicionalmente altura de concertos e outros encontros de massas, é preciso aceitar que as restrições a grandes concentrações de pessoas terão que manter-se, salientou.
Nesses contextos, “é muito mais difícil garantir a segurança”. Embora não haja nunca “risco zero”, é preciso tomar medidas que “reduzam o risco ao mínimo absoluto e, depois de o aceitar, mitigar o risco que ainda persiste”, advogou.
No caso do desporto de massas, por exemplo, “talvez os jogos possam voltar a acontecer, mas os espetadores tenham que ficar em casa mais tempo”.
A nível global, segundo um balanço da agência de notícias AFP, a pandemia de COVID-19 já provocou cerca de 269 mil mortos e infetou mais de 3,8 milhões de pessoas em 195 países e territórios. Mais de 1,2 milhões de doentes foram considerados curados.
Em Portugal, morreram 1.114 pessoas das 27.268 confirmadas como infetadas, e há 2.422 casos recuperados, de acordo com a Direção-Geral da Saúde.
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