Em declarações à Lusa, o secretário-geral da Frente Revolucionária do Timor-Leste Independente (Fretilin), considerou que a forma como as primeiras 24 mil doses estão a ser aplicadas “desvirtua” o plano inicial de dar prioridade à linha da frente.

Em particular, criticou o facto de estarem a ser dadas vacinas a funcionários de vários ministérios e até a familiares de membros do Governo ou de outros responsáveis públicos.

“Sempre defendi, e a ministra da Saúde sabe disso, que se deviam definir bem as prioridades. Concordo que líderes no ativo tomem a iniciativa de ser os primeiros, como o fez o primeiro-ministro ou o presidente do Parlamento, para criar confiança nas populações”, afirmou.

“Mas aquele batalhão todo a ser vacinado, ou ver que cada um leva a família ou os funcionários todos, não concordo. Isso desvirtua todo o processo”, considerou.

Alkatiri explicou que foi por considerar que havia outras pessoas mais prioritárias que ele próprio se recusou a participar na campanha de lançamento das vacinas, esta semana, durante a qual foram vacinadas dezenas de pessoas do Governo e de outras instituições.

O responsável do maior partido do Governo insistiu que as 24 mil doses devem servir “para dar mais confiança a pessoas que estão na linha da frente do combate, para poderem contribuir de forma ainda mais positiva e segura neste combate” contra a covid-19.

“Fundamentalmente, a prioridade é para o pessoal de saúde, policias, militares, proteção civil, jornalistas. Esses é que são verdadeiros ‘linha da frente’ e que têm de ser prioritários”, afirmou.

Prioritários, disse, deveriam ser também todos os serviços que lidam diariamente com muitas pessoas, dando como exemplo os funcionários do Instituto Nacional de Segurança Social (INSS), que diariamente atendem centenas de pessoas.

Além disso, e dada a calamidade das cheias, Alkatiri considera urgente fazer um recenseamento das populações deslocadas “e incluir essas pessoas na lista de prioridades”.

“Recomendo que o Governo controle rapidamente esta situação e volte ao programa inicial, use a linha da frente geograficamente e em temos de profissionais”, afirmou.

Carmelita Moniz, deputada do Congresso Nacional da Reconstrução Timorense (CNRT), na oposição, concorda e considera que esta distribuição “mostra uma vez mais a inconsistência do Governo” que “diz uma coisa, mas depois faz outra”.

“Esta vacina tem de ser para a linha da frente. Temos de dar prioridade a médicos, enfermeiros, profissionais de saúde, forças de segurança, pessoal de limpeza e jornalistas”, considerou.

Criticou igualmente o facto de estarem alocadas ao Parlamento Nacional mais de 480 vacinas, explicando que a bancada do seu partido não vai aceitar ser vacinada.

“Acha que o Parlamento é linha da frente? Por favor. Os deputados da bancada do CNRT não pensam que são pessoas da linha da frente e por isso não vamos receber essa vacina. Temos de dar prioridade a quem tem mais direito para a ter”, considerou.

Nos últimos dias têm-se multiplicado fotos nas redes sociais de vários funcionários públicos a mostrarem o certificado da vacina, incluindo o secretário de Estado da Comunicação Social, Mericio Akara, que publicou hoje na sua página oficial ter sido vacinado com a sua mulher e os funcionários do departamento.

Entre os vacinados nos últimos dias há vários assessores e até alguns funcionários que trabalham para as Nações Unidas.

Questionado sobre este aspeto, Roy Trivedy, coordenador residente da ONU em Díli, disse que a quantidade para os funcionários das Nações Unidas é muito reduzida, foi decidida com base nos critérios do Governo e visa apenas “pessoas que estão a trabalhar com comunidades e na linha da frente do setor da saúde”.

“O resto dos funcionários terão de esperar pelos 80% adicionais”, disse.

A Lusa tentou contactar a ministra da Saúde e o responsável da Organização Mundial de Saúde (OMS) em Díli, sem sucesso.

Desde o início da pandemia Timor-Leste contabiliza 947 casos de infeção com o vírus, tendo esta semana registado a primeira morte.

A pandemia de covid-19 provocou, pelo menos, 2.890.054 mortos no mundo, resultantes de mais de 133 milhões de casos de infeção, segundo um balanço feito pela agência francesa AFP.

A doença é transmitida por um novo coronavírus detetado no final de 2019, em Wuhan, uma cidade do centro da China.