Carlos Pinto, de 48 anos, teve a 27 de fevereiro os “primeiros sintomas”, daquilo que uma consulta e três chamadas para a linha de Saúde 24 indicaram ser “só uma gripe”, sem “indicação para teste [de rastreio ao novo coronavírus]”, pelo que passou “o pior da doença em casa”, duas semanas “sempre com febre, tosse e dores no peito como nunca tinha tido”, até ser internado no hospital de São João, no Porto, a 12 de março.

Em entrevista à Lusa, o diretor comercial de uma empresa de Santa Maria da Feira lembra que teve alta cinco dias depois, quando deixou de precisar de oxigénio e medicação, passou ao isolamento em casa até ao “dia bonito” em que lhe confirmaram a ausência de infeção e foi “dar um passeio de cinco minutos com a filha, sentir o sol e a aragem” da rua.

“A liberdade é uma coisa a que apenas se dá valor quando se fica privado dela. Durante três semanas, nem à varanda ia, por causa da tosse. A dada altura, a minha filha até perguntou à mãe [cuja infeção se manifestou com sintomas ligeiros e passou com medicação inespecífica] se ainda gostava dela, por já não lhe dar beijos”, descreve.

Tirando a extravagância do primeiro dia de “cura”, Carlos apenas sai de casa para ir “às compras ou à farmácia”, sempre de “de máscara, luvas e mantendo o distanciamento social”, pois “não está provado se se fica imune” após ter a doença.

O diretor comercial perdeu bastante peso, não tinha apetite, o palato alterou-se, tudo lhe sabia “ou demasiado salgado ou muito doce” e ainda está a recuperar forças, mas anima-se a relatar que, na quarta-feira, termina a baixa e já pode “sair para trabalhar”.

A empresa até encerrou por ordem da Direção-Geral da Saúde após vários casos de covid-19, já voltou a laborar mas com muitos empregados em teletrabalho e alguns ainda doentes.

Carlos está convencido ter apanhado a doença nas viagens feitas a Espanha a trabalho, na primeira e terceira semana de fevereiro, com passagens por Valencia, Barcelona, Tenerife, Canárias, Saragoça ou Madrid.

A presença no estrangeiro foi referida nos três telefonemas feitos para a linha Saúde 24, referenciada pela DGS para rastrear casos de Covid-19, mas nem os relatos das deslocações nem as dos sintomas determinaram a realização do despiste de Covid-19.

“Mesmo com medicação, não aguentava seis horas sem febre. Não conseguia dormir, só quando o cansaço me vencia. E nunca tive dores tão fortes no peito. Piorava drasticamente, de dia para dia. Mas diziam que era uma gripe e fiquei sempre convencido de que era uma gripe”, recorda.

Isto, até ao dia em que um colega de trabalho testou positivo e uma ambulância foi buscar Carlos e família para o hospital de São João.

“Até já me estava a sentir melhor, embora me dissessem que estava muito pálido mas, mal abriu a porta da ambulância, o médico encaminhou-me para o internamento. A minha mulher e filha foram mandadas para as tendas”, recorda.

Na primeira noite no hospital, Carlos conseguiu dormir. No segundo dia, “já queria vir embora”, mas destaca a capacidade dos profissionais em criar “empatia” com os doentes, mesmo enfiados “naqueles fatos em que não se vê nada, quase não se vê o rosto”.

“O pior já passou. Ainda tive sorte de não contaminar muita gente, porque o primeiro médico que me atendeu, quando começaram as dores fortes no peito, pos-me de baixa e fiquei sempre em casa. Nunca tinha estado de baixa por causa de uma gripe. Mas ele disse que era melhor, para evitar agravamento. Se não fosse assim, podia ter contaminado muita gente”, relata.

 O novo coronavírus, responsável pela pandemia da covid-19, já infetou mais de 750 mil pessoas em todo o mundo, das quais morreram mais de 36 mil.

Depois de surgir na China, em dezembro, o surto espalhou-se por todo o mundo, o que levou a Organização Mundial da Saúde (OMS) a declarar uma situação de pandemia.

Em Portugal, segundo o balanço feito na segunda-feira pela Direção-Geral da Saúde, registaram-se 140 mortes, mais 21 do que na véspera (+17,6%), e 6.408 casos de infeções confirmadas, o que representa um aumento de 446 em relação a domingo (+7,5%).

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