“A comissão atual da DGS para avaliar a mortalidade materna ainda não reuniu e não foram apresentados os casos”, disse Diogo Ayres de Campos aos deputados da comissão parlamentar de saúde, onde foi ouvido hoje de manhã por causa da mortalidade materna.
Questionado pelos deputados sobre as causas da mortalidade materna registada em Portugal em 2020, cuja taxa subiu para 20,1 óbitos por 110 mil nascimentos, o nível mais alto dos últimos 38 anos, Diogo Ayres de Campos admitiu que a idade da grávida condiciona o risco, mas lembrou que não houve um “aumento enorme” desta idade nos últimos anos, pelo que tal não justifica a subida dos números.
“Uma das causas, provavelmente, tem que ver com a informação às populações para saberem quando devem ir aos cuidados de saúde”, disse o responsável, admitindo que o facto de os registos serem eletrónicos pode ter condicionado um maior número de casos, insistindo para que se investigue e se tenha a certeza se todos os casos são mesmo considerados mortalidade materna.
“É preciso avaliar caso a caso, por peritos na área. Este indicador é crucial pois traduz o acesso aos cuidados de saúde obstétricos”, afirmou o responsável, insistindo que as causas “só serão claras quando houver uma avaliação de todos os casos que ocorriam”.
Sobre os sistemas de informação, apontou dados do Consórcio Português de dados Obstétricos, que inclui informação de mais de um terço dos hospitais do Serviço Nacional de Saúde (35% dos nascimentos), defendendo a importância de “investir para um sistema de informação disponível em todos os hospitais” da rede pública.
Diogo Ayres de Campos admitiu a falta de estratégia nesta área e a degradação dos cuidados obstétricos e, quando questionado pelos deputados sobre a resposta dos hospitais privados, respondeu: “Os hospitais particulares têm dado algumas respostas boas, mas há indicadores de qualidade dos cuidados obstétricos, como a taxa de cesarianas [nos privados], que a nível europeu nos envergonha”.
“São 66% de taxa de cesarianas nos particulares (...) e não há tendência para decrescer. Se pensarmos em alargar [a resposta] aos hospitais particulares tem de haver controlo sobre estas práticas, que não são consideradas boas práticas ao nível da OMS e de sociedades científicas internacionais”, defendeu.
Diogo Ayres de Campos, que foi recentemente nomeado para presidir à comissão de acompanhamento de resposta em urgência de ginecologia, obstetrícia e bloco de partos, considerou ainda que os hospitais particulares “não têm tido atenção” a esta questão e acrescentou que “aparentemente das instituições do Estado não há vontade, ou capacidade, de ter algum controlo sobre estas práticas”.
Questionado sobre se estas mortes maternas terão ocorrido no privado ou no público, respondeu que “quando há complicações graves no particular, muitos recorrem ao SNS (…). Se calhar quase todas foram no SNS, mas não há dados claros” sobre o assunto.
O responsável, igualmente questionado sobre o respeito pelas mulheres e o excesso de intervencionismo no parto, apontou casos de ausência de consentimento informado divulgados na internet e afirmou que “é grave e contra a lei. Há casos reportados na net, mas a questão é a magnitude do problema”.
“Não temos a noção da verdadeira magnitude do problema do excesso de intervencionismo”, disse, lembrando que, em algumas áreas, tem havido um esforço para o reduzir, apontando dados que indicam uma redução para 20% das episiotomias.
Sobre a opção pelos partos nos privados, disse que estes têm uma boa oferta hoteleira, e disse que o SNS não tem conseguido responder ao mesmo nível, lamentando o facto de não ser possível neste momento, nos hospitais púbicos, as visitas de familiares às mães depois de terem o bebé.
Quanto às respostas públicas em cuidados obstétricos considerou que o sistema “tem funcionado em rede sempre que necessário”, acrescentando que “vai contra expectativa das mulheres grávidas que querem ter parto num determinado hospital (…) pois podem escolher de acordo com a lei, mas na prática estão sujeitas às transferências”.
A propósito dos dados divulgados hoje pelo jornal Expresso que indicam que 80 grávidas foram transferidas de hospital no mês de junho, afirmou que “haverá sempre transferências baseadas na incapacidade de determinado hospital dar resposta, nomeadamente, nos cuidados intensivos”.
“Na Europa as transferências são inferiores a 1%. Temos tido quase 2% de transferências em hospitais e não é algo que queiramos ter. Vai contra tudo o que a grávida deve querer e não é que desejamos. O que queremos é que não haja transferências”, concluiu.
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