A iniciativa partiu de produtores e distribuidores que, perante as dificuldades de esquadras da PSP e unidades de saúde no acesso a desinfetante, lançaram um apelo informal à comunidade cervejeira com vista a reunir o máximo volume possível de ácido peracético.

“Nós temos sempre esse produto disponível porque é o que usamos para matar as bactérias todas. É bactericida, fungicida e viruscida. Então decidimos reunir a maior quantidade que pudéssemos, juntámos todos os borrifadores que conseguimos arranjar e, desde segunda-feira, já fizemos 80.000 litros de solução desinfetante”, explicou hoje à Lusa Sofia Oliveira, uma das dinamizadoras da iniciativa enquanto proprietária da marca Lindinha Lucas, do Porto. 

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Esse produto sanitário resulta da diluição do ácido numa determinada proporção de água, mediante procedimentos por técnicos “com a formação necessária para o fazer em segurança”, e vem sendo distribuído pelas instituições que apelaram à ajuda dos cervejeiros, entre as quais “esquadras da PSP, centros de saúdes, lares de idosos, câmaras municipais, quartéis de bombeiros, etc.”.

Hugo Santos, proprietário e ‘brewer’ da Cerveja Chica, de Lisboa, deixou na quarta-feira nos Bombeiros de Queluz, por exemplo, nove litros de ácido peracético puro, com os quais a corporação irá agora produzir “3.000 a 4.0000 litros” de solução desinfetante.

“Fazemos isto de forma oficiosa e alertamos bem que o produto final não é o ideal para limpeza das mãos, porque na pele pode ser corrosivo. É uma solução adequada, isso sim, para limpeza de superfícies como portas, maçanetas, corrimões, chão, carros, viaturas de bombeiros, hospitais e até ruas”, realça o empresário.

Dono de uma cervejeira e de um bar, Hugo Santos antecipa que a produção e distribuição do antissético o vai ocupar pelo menos enquanto vigorar o estado de emergência em Portugal: “Tenho bicho-carpinteiro e vou ter que continuar a fazer alguma coisa, porque nesta altura não há vendas. O bar está fechado e a cervejeira está parada porque não tem bares para onde vender a cerveja”.

Mesmo nesse contexto económico, todo o desinfetante criado pelo setor está a ser “oferecido”.

Sofia Oliveira insiste que “não era correto os micro-cervejeiros retirarem proveito desta situação” e defende que o objetivo comum é “ajudar o país a ultrapassar este problema o quanto antes, para benefício de toda a sociedade”.

Nem todas as entidades ligadas a essa indústria artesanal, contudo, pensarão assim. O facto de cada bidão de 25 litros de ácido peracético custar “uns 80 a 100 euros” poderá explicar determinados comportamentos: a associação que representa estes empresários “nem sequer respondeu ao apelo” na origem da iniciativa, outras marcas também não reagiram ao pedido de envolvimento lançado pelo grupo e houve fornecedores que, “de, uma semana para a outra, começaram a cobrar o dobro” pelo produto, o que obrigou as marcas a trocarem de abastecimento. 

Recomendações da Direção-Geral da Saúde (DGS)

  • Caso apresente sintomas de doença respiratória, as autoridades aconselham a que contacte a Saúde 24 (808 24 24 24). Caso se dirija a uma unidade de saúde deve informar de imediato o segurança ou o administrativo.
  • Evitar o contacto próximo com pessoas que sofram de infeções respiratórias agudas; evitar o contacto próximo com quem tem febre ou tosse;
  • Lavar frequentemente as mãos, especialmente após contacto direto com pessoas doentes, com detergente, sabão ou soluções à base de álcool;
  • Lavar as mãos sempre que se assoar, espirrar ou tossir;
  • Evitar o contacto direito com animais vivos em mercados de áreas afetadas por surtos;
  • Adotar medidas de etiqueta respiratória: tapar o nariz e boca quando espirrar ou tossir (com lenço de papel ou com o braço, nunca com as mãos; deitar o lenço de papel no lixo);
  • Seguir as recomendações das autoridades de saúde do país onde se encontra.

Os borrifadores também vêm implicando uma logística própria. “Demos todos os que tínhamos disponíveis e pedimos às pessoas para nos arranjarem os que pudessem”, revela Sofia.

Um dos cidadãos que acedeu a esse apelo foi André Ribeiro, que, enquanto distribuidor de equipamento médico para fisioterapia, está particularmente sensível à carência atual de material de limpeza e proteção, e, entre várias outras aquisições, comprou de uma só vez “uns 300 borrifadores” para oferecer ao novo grupo de higienistas.

“Nem era bem o modelo que queríamos, mas limpámos tudo o que havia no armazém”, explica. Quanto à despesa, diz que só aí foram “200 e tal euros” a expensas próprias, mas nota que o comerciante até “fez um desconto, o que demonstra que há gente com bom senso, que sabe o que está em causa nesta altura”.

André tem igualmente ajudado nas entregas do desinfetante e só na quarta-feira distribuiu “350 litros pelos bombeiros de Leixões, Matosinhos e São Mamede Infesta, pela polícia, pela Santa Casa da Misericórdia”, etc. Diz que as reações são efusivas: “A dificuldade em arranjar estas coisas é tanta que as pessoas ficam realmente muito contentes e agradecem imenso”.

Chica, Trevo, Lindinha Lucas, Epicura, Temple Craft, Gayata, Rima, Piratas Cervejeiros, Velhaca, Post-Scriptum, Fidélis, Tough Love, Biltre, Sovina, Barona, Praxis, Xô Carago, Alvoreada, Ermida, Lince, Açor, Christeyns, Quimiserve, Lupum, Colossus e Maldita são as marcas de cerveja e distribuição envolvidas neste projeto solidário.

O novo coronavírus, responsável pela pandemia da Covid-19, foi detetado em dezembro de 2019 e entretanto infetou já mais de 220.000 pessoas em todo o mundo. Dessas, mais de 9.000 morreram e mais de 85.500 recuperaram.

Em Portugal, a Direção-Geral da Saúde (DGS) elevou hoje o número de casos confirmados de infeção para 785, mais 143 do que na quarta-feira. O número de mortos no país subiu para três.

Portugal encontra-se em estado de emergência desde as 00:00 de hoje.

O Conselho de Ministros aprova hoje as medidas que concretizam o estado de emergência proposto pelo Presidente.

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