O Colégio de Neurocirurgia da Ordem dos Médicos foi demitido pelo bastonário após um diferendo por este ter ignorado uma avaliação contra a inscrição de um médico inscrito naquela entidade, disse um dos demissionários.
Em novembro, o colégio já tinha decidido suspender funções temporariamente pedindo explicações ao bastonário José Manuel Silva sobre o porquê de um médico de nacionalidade estrangeira ter sido inscrito naquele órgão apesar de ter visto a sua candidatura rejeitada por três ocasiões.
Carlos Alegria, um dos médicos demissionários, explicou à Lusa que o colégio não considera ter sido demitido, uma vez que decidiu demitir-se na manhã em que recebeu a carta com essa mesma comunicação, datada de 06 de janeiro deste ano.
“As razões apontadas foram basicamente uma alegada ‘profanação do dever de reserva’, eufemismo utilizado para dizer que as declarações que o presidente do Colégio prestou à comunicação social, em resposta a solicitações de jornalistas, foram consideradas pelo bastonário um ato ‘inaceitável e intolerável’”, esclareceu Carlos Alegria, numa mensagem por e-mail.
Num documento a que a Lusa teve acesso, assinado por dois dos demissionários, a explicação é apresentada como tendo acontecido “o que nunca deveria ter sucedido, ou seja, o bastonário e o Conselho Nacional Executivo passaram por cima de júris legitimados por nomeações e, de uma forma inadmissível, decidiram inscrever um médico como especialista no Colégio de Neurocirurgia criando um gravíssimo precedente de consequências completamente imprevisíveis”.
Segundo o mesmo texto, os serviços da Ordem recusaram-se a enviar as explicações do caso por parte do Colégio de Neurocirurgia aos restantes 46 colégios, o que é classificado como “uma espécie de bloqueio (…) incompreensível num Estado de Direito” e que se reveste “de particular gravidade por se tratar de um ato censório destinado a impedir” que os colegas conheçam as duas partes da situação, tendo recebido as cartas anteriores, em particular a do bastonário.
Os médicos, que reconhecem ter havido dentro do colégio quem discordasse da divulgação do caso, consideram que há nesta situação duas visões: por um lado, o júri que procura cumprir “uma conduta de estrita observação de normas de qualidade devidamente comprovada” e, por outro, “uma visão mais facilitista e acelerada, que privilegia questões, para o caso perfeitamente secundárias, como sejam o país de proveniência ou o tempo de carreira, em desfavor daquilo que é essencial”.
“Infelizmente, e dizemo-lo com enorme mágoa, não é este o entendimento do bastonário que elegemos para representar toda a classe médica. Percebemos que tenha legitimidade para demitir quem se lhe opõe. Registamos as decisões musculadas que neste diferendo tem vindo a tomar. Mas reafirmamos, como já o tínhamos feito em privado, que não são essas atitudes, algumas delas bastante deselegantes e a roçar a prepotência, que nos vão retirar a razão”, insistem.
Em novembro, altura em que já era admitida a possibilidade de demissão, o presidente do Colégio de Neurocirurgia, Ernesto Carvalho, afirmou à Lusa que este é “um assunto interno da Ordem”, que se traduz pela “divergência de opinião entre um órgão técnico e o Conselho Nacional Executivo”, admitindo que “não tenha sido apreciado adequadamente o parecer do júri”.
O presidente do órgão explicou que a candidatura do médico em causa foi submetida - e rejeitada - por três ocasiões: Numa primeira foi dito ao candidato o que tinha que ser feito para o júri voltar a apreciar o processo, num segundo momento voltou a ser julgado “insuficiente”, tendo sido “assinalado pormenor a pormenor, página a página”, e no último caso continuou a não preencher as condições requeridas.
Ernesto Carvalho declarou, então, que “se do ponto de vista técnico” o parecer não é válido, então não faz sentido dar continuidade às funções, lembrando que “já houve colégios que se demitiram de imediato”, mas que a escolha foi por um caminho mais “conciliador”.
Os estatutos da Ordem dos Médicos referem no artigo 92º. que a "inscrição nos colégios das especialidades" é requerida ao Conselho Nacional Executivo, sujeita à aprovação em provas específicas perante um júri da especialidade.
O bastonário da Ordem dos Médicos, José Manuel Silva, contactado pela Lusa, limitou-se a dizer que não presta declarações sobre assuntos internos daquela instituição.
20 de março de 2012
@Lusa
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