O estudo, que recolheu dados de mais de 700 mil crianças e jovens com idades compreendidas entre 1 e 19 anos em tratamento da infeção com o vírus da imunodeficiência humana (VIH) naquele país, apresenta, porém, baixas taxas de iniciação do tratamento antirretroviral entre os jovens daquela faixa etária (15-19 anos) e destaca a necessidade urgente de melhorar os serviços de prestação destes cuidados de saúde para os adolescentes portadores do vírus.
Apesar do aumento do número de jovens em tratamento, menos de 50 por cento dos adolescentes que se apresentam para tratamento iniciam com sucesso a terapia antirretroviral (TARV), reporta o The Lancet HIV, por razões que se prendem com a persistência de “barreiras que impedem muitos adolescentes de iniciar o tratamento”, segundo a autora principal do estudo.
Essas barreiras “podem incluir preocupações sobre o estigma, uma perceção de falta de confidencialidade nas clínicas, a necessidade de visitas frequentes às clínicas para iniciar e manter o tratamento e o aumento das responsabilidades em casa, particularmente entre os órfãos do VIH”, diz Mhairi Maskew, investigadora da Universidade de Witwatersrand, África do Sul.
“Atendendo ao rápido crescimento dos adolescentes que procuram cuidados de saúde relacionados com o VIH, os sistemas de saúde devem determinar qual a melhor forma de satisfazer as necessidades desta população crítica, porque o aumento dos testes e tratamentos pode tornar-se crítico para controlar a epidemia”, alerta a autora.
A África do Sul tem o maior número de pessoas infetadas com o VIH em todo o mundo, com aproximadamente 7,2 milhões de pessoas infetadas. Muitas crianças nascem com o vírus, mas sobrevivem na adolescência sem tratamento, e os adolescentes são também infetados pela transmissão sexual. As raparigas adolescentes têm a maior incidência de VIH de qualquer grupo demográfico no país, atribuída à desigualdade de género e à violência sexual.
O crescimento do número de adolescentes em tratamento deve-se, em parte, ao sucesso histórico do programa de tratamento antirretroviral (TARV) da África do Sul. As crianças infetadas com o VIH quando bebés, antes da disponibilidade generalizada da prevenção da transmissão vertical (PTV), estão agora a sobreviver na idade adulta com a TARV. Por outro lado, os adolescentes estão a iniciar a TARV em maior número.
Os autores deste estudo analisaram dados de 730.882 pacientes de 1 a 19 anos que entraram no programa nacional de VIH da África do Sul entre 2005 e 2016. Entre os pacientes que iniciaram o tratamento antes dos 15 anos de idade, 54% eram do sexo feminino (209.205 pacientes), com um número aproximadamente igual de meninos e meninas infetados em fase perinatal durante o parto ou amamentação.
Entre os pacientes que iniciaram o tratamento com idades entre os 15 e os 19 anos (301.242 pacientes), 88% eram do sexo feminino, uma taxa consistente com os níveis altos de infeção pelo VIH transmitido sexualmente, assim como com as taxas mais elevadas de procura de cuidados entre as mulheres jovens por comparação com os homens jovens.
Entre os pacientes que entraram no programa de VIH durante o período de estudo, 57% (415.882 de 730.882) começaram a receber terapia antirretroviral e o número total de pacientes em tratamento aumentou para cada faixa etária.
O número de crianças de entre 1 e 4 anos que iniciou o tratamento aumentou em 25%, de 25.803 entre 2005 e 2008 para 32.456 durante 2013 a 2016. No mesmo período, o número de jovens de entre 15 e 19 anos que iniciaram o tratamento cresceu de 7.949 pacientes em 2005 a 2008 para 80.918 durante 2013 a 2016, um aumento de dez vezes no número de adolescentes em terapia antirretroviral.
Não obstante estes números, os pacientes infetados que entraram em tratamento como adolescentes tiveram taxas muito mais baixas de início da terapia antirretroviral do que as crianças. Apenas 45% das adolescentes de 15 a 19 anos e 42% dos rapazes nessa faixa etária iniciaram o tratamento, taxa que compara com 68% de meninas e 69% de meninos com entre um e quatro anos.
Num comentário a este estudo, Audrey Pettifor, da Universidade da Carolina do Norte, nos Estados Unidos, sublinhou em declarações à The Lancet HIV que Maskew e os seus colegas mostram que “a batalha contra o VIH está longe de ter terminado e que o Governo sul-africano, doadores, programas e investigadores devem atuar com urgência para desenvolver, testar e implementar intervenções baseadas em evidências [resultantes de investigações como esta] para prevenir novas infeções e melhorar a ligação dos adolescentes aos programas de cuidado de saúde e sua retenção nos mesmos”.
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