27 de março de 2013 - 12h28
O presidente da Associação de Médicos de Saúde Pública incitou hoje a população a revoltar-se contra os cortes financeiros na saúde, lembrando que as doenças mentais e os suicídios estão a aumentar com o agravamento da austeridade.
Reconhecendo que “a doença e a morte acompanham sempre a escala socioeconómica”, Mário Durval sublinhou a preocupação com a falta de esperança das pessoas.
“O agravamento das condições de vida e, sobretudo, [a diminuição] da esperança das populações, vai aumentar não só a mortalidade como a morbilidade”, afirmou em declarações à agência Lusa.
Segundo adiantou, “os primeiros impactos vão naturalmente sentir-se em situações de maior vulnerabilidade”, como as crianças e os idosos, mas vai também verificar-se “um aumento significativo da doença mental e, com isso, do suicídio”.
Para este médico, as populações “devem revoltar-se e tentar que as condições sejam criadas”, embora reconheça que esta não é a prioridade.
“Haver dinheiro para os serviços de saúde tem menos importância do que haver dinheiro para comer. A saúde é um resultado e os serviços de saúde contribuem com 10% ou 20%, mas os restantes 80% ou 90% têm a ver com a qualidade de vida, com alimentação, habitação, trabalho, controlo sobre a própria vida”, explicou.
Estudo britânico culpa autoridades nacionais e europeias
A posição do presidente da Associação Nacional de Médicos de Saúde Pública surgiu na sequência de acusações feitas pela revista científica Lancet aos governos e à Comissão Europeia.
Na apresentação da primeira série da Lancet dedicada ao estado da Saúde na Europa, na terça-feira à noite, o diretor científico do Observatório Europeu dos Sistemas e Políticas de Saúde, Martin McKee, acusou "os governos da Europa e a Comissão Europeia de, explicitamente, fecharam os olhos aos efeitos [da recessão] na saúde", apesar de ser claro o aumento dos suicídios e outras doenças.
Mckee sublinhou que, "depois de todo o esforço" que a comunidade científica fez para chamar a atenção dos governos, a única conclusão possível é que "há um claro problema de negação dos efeitos da crise, embora estes sejam muito aparentes".
O investigador, que é também professor de saúde pública na Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, comparou ainda as autoridades europeias à indústria tabaqueira, quando, durante anos, negou os efeitos do tabaco, argumentando que as provas não eram concludentes.
Além desses impactos, que os cientistas consideravam previsíveis, há outros que os investigadores não esperavam, como o surgimento de surtos de VIH ou de doenças como o dengue e a malária na Europa.
"Já estamos a ver os efeitos, particularmente nos países mais afetados pela recessão, mas não em todos os lados", sublinhou McKee.
Em países como a Grécia, a Espanha e Portugal, onde os governos adotaram medidas de austeridade, tornaram-se mais comuns os suicídios e surtos de doenças infeciosas, exemplificam os autores do artigo.
Mário Durval admitiu à Lusa que o crescimento das doenças infeciosas é uma realidade e deu como exemplo a sida.
“O VIH é uma doença de transmissão sexual e se olharmos para o contexto de agravamento financeiro das famílias e das pessoas em geral, é muito natural que aumente a prostituição para obter rendimentos e é natural que essa prostituição se faça com menos utilização dos meios de defesa, nomeadamente os preservativos”, lembrou o presidente dos Médicos de Saúde Pública.
Lusa