Na apresentação do diploma na Assembleia da República, o deputado e líder da Juventude Socialista Miguel Costa Matos defendeu ser uma questão “de decência” que quem tenha vencido uma doença como o cancro “não seja depois discriminado” na sua vida, como no momento de comprar casa, em que “o banco ou não empresta, ou pede taxas incomportáveis”.
“Quem se encontra livre de cancro, ou outras doenças, não deve ser avaliado pelo risco do seu passado”, defendeu, salientando que este ‘direito ao esquecimento’ já está consagrado há vários anos em França e, mais recentemente, no Luxemburgo, Bélgica e Países Baixos.
O projeto do PS propõe que, nestes casos, o acesso ao crédito e a seguros seja alvo de um acordo entre o Estado, as organizações profissionais representativas de instituições de crédito, sociedades financeiras, sociedades mútuas, instituições de previdência e empresas de seguros e resseguros, bem como organizações nacionais que representam pessoas com risco agravado de saúde, pessoas com deficiência e utentes do sistema de saúde.
“Na ausência de acordo prossegue-se por decreto-lei”, explicou Miguel Costa Matos.
Segundo o deputado socialista, “caberá à ciência dizer quando é que, para cada doença, é justo dizer que o risco está ultrapassado”, sem nunca poder ser ultrapassar um período de dez anos ou, no caso de a doença ter ocorrido até aos 21 anos, cinco.
Pelo PAN, a deputada Bebiana Cunha defendeu que uma das maiores necessidades dos sobreviventes de cancro “é verem reconhecido o chamado direito ao esquecimento”, desafiando o parlamento a fazer com que Portugal seja o quinto país da União Europeia a consagrá-lo na legislação.
O PAN quer que as pessoas que superem doenças “de risco agravado”, como cancro, não vejam agravadas as condições de acesso a créditos ou seguros e que a sua informação médica não possa ser recolhida por estas empresas.
O diploma “proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde”, para assegurar “um conjunto de direitos das pessoas que tenham superado doença oncológica ou Hepatite C perante as seguradoras e as instituições financeiras”.
As restantes bancadas manifestaram concordância generalizada com os objetivos dos diplomas, mas deixaram algumas sugestões para o futuro debate na especialidade.
Pelo BE, a deputada Mariana Mortágua manifestou o “apoio sem reservas” do partido aos projetos, mas defendeu ser necessário definir quem é incluído e excluído nesta nova legislação, considerando que também os doentes crónicos deveriam ser abrangidos.
“Se houver abertura para, na especialidade, alargar o âmbito será benéfico para todos”, disse.
O deputado e líder da JSD Alexandre Poço manifestou também a intenção da bancada social-democrata acompanhar os projetos.
“Uma sociedade decente não pode ter da parte do Estado qualquer tipo de discriminação no acesso a crédito e seguros”, disse, considerando que é necessário que sejam mais bem definidos os conceitos de superação da doença.
Por outro lado, o deputado do PSD considerou que os termos que está formulado o acordo entre Estado e instituições financeiros “é tão vago” que pode dificultar a sua aplicação, preocupação secundada por Cecília Meireles, do CDS-PP.
“Estes projetos têm um objetivo que nos aparece benéfico: assegurar que quem está curado não se vê confrontado com uma discriminação que se traduz em prémios proibitivos”, defendeu a deputada, apontando algumas dúvidas na concretização, como a forma como se processará o acordo e a determinação da situação de cura.
Pelo PCP, Paula Santos saudou igualmente o mérito das propostas, considerando que “não é justo que, depois de superar uma doença grave, continuem a existir obstáculos e dificuldades na vida destas pessoas”.
Assegurando o voto favorável da sua bancada, o PCP manifestou preocupação, na fase da especialidade, com a proteção dos dados pessoais e com o acordo previsto entre Estado e seguradoras, defendendo que o parlamento tem “competência e legitimidade” para fixar ele próprio essas regras.
No encerramento, o deputado socialista Fernando Anastácio registou o “amplo consenso” parlamentar e demonstrou abertura para incluir sugestões das restantes bancadas na especialidade.
“Temos uma solução testada noutros países, eficaz, e que permite, sem imposição, dar num primeiro momento às partes a possibilidade de encontrarem uma plataforma de entendimento, mas com parâmetros bem definidos”, disse.
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