Num contexto em que a prevenção e a promoção do bem-estar assumem um papel cada vez mais central na prática clínica e na literacia em saúde, persiste uma área ainda marcada pelo silêncio: a saúde masculina. Apesar de os dados epidemiológicos evidenciarem um aumento da incidência de doenças crónicas como a diabetes mellitus, a hipertensão arterial ou o carcinoma da próstata, verifica-se que muitos homens continuam a adiar — ou a evitar completamente — o recurso aos cuidados médicos. Porquê? A resposta reside, frequentemente, em preconceitos e estigmas que associam, de forma errónea, a masculinidade à ausência de vulnerabilidade.

A construção social tradicional da masculinidade continua a sustentar a ideia de que “um verdadeiro homem” não adoece, não se queixa e não necessita de ajuda. Este modelo, profundamente enraizado e muitas vezes interiorizado de forma inconsciente, contribui para o afastamento dos homens dos cuidados de saúde preventivos, nomeadamente consultas de vigilância, rastreios e intervenções precoces. Como consequência, patologias potencialmente tratáveis evoluem para quadros clínicos mais graves, com repercussões físicas, psicológicas e sociais significativas.

Condições como a disfunção erétil, a infertilidade ou o cancro da próstata permanecem frequentemente envoltas em vergonha e silêncio. Persistem mitos, tabus e uma preocupante desinformação que dificultam o diagnóstico atempado e o acesso ao tratamento. A disfunção erétil, por exemplo, é frequentemente encarada apenas como uma perturbação da performance sexual, quando pode constituir um marcador precoce de doença cardiovascular. A infertilidade masculina, por sua vez, é muitas vezes incorretamente associada a uma alegada “falta de virilidade”, desvalorizando o facto de se tratar de uma condição médica prevalente, que afeta milhões de homens em todo o mundo.

O impacto destas patologias transcende o domínio físico. A quebra da autoestima é muitas vezes o primeiro sintoma, podendo evoluir para quadros de ansiedade e depressão, com consequências na esfera relacional, familiar e profissional. A ausência de procura de ajuda clínica tem, nestes casos, um custo elevado — frequentemente invisível.

Ainda assim, existem sinais encorajadores de mudança. A evolução tecnológica e científica tem permitido diagnósticos mais precoces, opções terapêuticas mais eficazes e, sobretudo, uma abordagem cada vez mais personalizada. Isto representa uma oportunidade real para transformar a forma como encaramos a saúde masculina: de um tema silenciado para uma prioridade de saúde pública.

É fundamental quebrar as barreiras culturais e promover uma comunicação aberta e isenta de julgamentos em torno da saúde do homem. Os profissionais de saúde desempenham um papel essencial nesta mudança, mas é necessário que toda a sociedade se envolva ativamente na desconstrução de preconceitos.

A saúde não é uma questão de género, mas sim de responsabilidade. Procurar cuidados médicos não é sinal de fragilidade — é, acima de tudo, um ato de coragem. Está na hora de redefinir o que significa ser homem no século XXI: alguém que se cuida, que se informa e que não hesita em procurar ajuda quando necessário.

Um artigo do médico Ricardo Godinho, Urologista na Affidea Tomar.